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cronicas-->CíCERO, O PORTA-TRECOS -- 04/07/2009 - 07:54 (Walter da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
CíCERO, O PORTA-TRECOS
"A vida feliz consiste na tranquilidade da mente"
Marcus Túlio CíCERO (106-43 a.C)

Cícero, cujo sobrenome desconheço, acorda às duas e meia da madrugada. De estatura média, pele queimada pela luta diária, é cortês e polido, em sua voz meio grave de tom cordial. Nos conhecemos numa dessas minhas caminhadas matinais. Ele puxa um arremedo de carroça, de pneus carecas e quase desconjuntada. A bordo, carrega trecos diversificados: latas, papelão, peças de metal. Tudo isso, claro, para garantir uma sobrevivência familiar, regra extrema dos excluídos, sem emprego formal, mas capacitados pela honestidade cotidiana. Já ouvira falar de Cícero, através de um funcionário doméstico, de cuja amizade ele priva. No meio do trajeto, a passos largos e determinados, lá vou eu, um idoso na forma da lei, tentando ganhar alguns anos de vida. Ergo a cabeça e avisto uma imagem composta de um homem de meia idade, meio gordo, camisa aberta, com um pequeno veículo parado num posto de serviços, do outro lado da rua. Mas não me dou conta de que se trata do homem a quem procuro, faz alguns dias.
Instantes depois, observo que está à minha frente, esse homem, puxando seu instrumento de trabalho. Com a mente mergulhada em meus problemas, torno a me conscientizar que se trata de Cícero, a alguns passos de mim, lento mas ritmado na tração animal.
Como um garoto de rua, começo a gritar, hei, hei, hei. O homem, irresolutamente resolve parar e lentamente me olha firme e receptivo, girando o corpo em minha direção. Não eram ainda 6 da manhã.
_ Bom dia, você se chama Cícero?
_ Sim... sou eu mesmo. Responde ele de forma objetiva e destemida.
Nosso diálogo é curto. Mas ele prometera passar em minha casa, dois dias depois, para apanhar umas latas de cerveja e garrafas de vidro, de há muito consumidas pela família. Na segunda, conforme o prometido, ele não veio. Indaguei ao meu funcionário, o que teria acontecido? Teria sido hostil com o Cícero? Minha voz teria sido autoritária involuntariamente?
Insisti com Fernando, meu funcionário e ele adiantou que o Cícero, nosso porta-trecos é assim mesmo. Vai ver quereria ter certeza dessa nova encomenda. Alguns dias depois, encontramo-nos novamente. Ele foi ainda gentil. Demonstrava ter recebido uma educação, que, mesmo fundamental, rivaliza com a desses pseudo-intelectuais com quem me deparo em minhas andanças mundo afora.
No dia aprazado, pela manhã, lá estava Cícero, calmo, em frente à minha casa, sendo atendido. Fui cumprimentá-lo e agradeci sua vinda.
Ele explicou que não trabalha com garrafas vazias, mas iria abrir uma exceção, pois me havia prometido passar por ali, naquele horário.
E me falou claramente, num ar de cidadão e ser humano exemplar: "não queria fazer uma desdita com o senhor".
Nos meus mais de sessenta anos de vida confortável, convenci-me de que, qualquer que seja nossa origem, nosso destino, nossa profissão, seremos pobres, paupérrimos, se e somente se formos inferiores à nossa ignorància.
Ajeitou um a um os sacos no interior da carroça, olhou-me serenamente e saiu vagaroso sem me dizer mais nada.

WALTER DA SILVA
Camaragibe, 04 de julho de 2009
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