Os Flatos do Velho Senhor
O Doutor Athos Procópio, mui querido e respeitado médico da cidade de Catanduva, SP, clinicou, operou e fez partos na roça e na cidade por mais de cinqüenta anos. Atendia a todos, ricos ou pobres, com a mesma atenção e carinho. Ao longo desses muitos anos de trabalho o Dr. Athos foi observando e anotando na sua genda os fatos curiosos e engraçados acontecidos no seu consultório.
Certo dia, atendeu a um paciente inusitado. A família inteira do paciente entrou na sua sala de consultas. Os familiares que o acompanhavam, a mulher e várias filhas, estavam trazendo para ser consultado um velho senhor de aproximadamente oitenta anos.
O velhinho, caladíssimo, lembrava o cego de Betsaida, aquele que, a contra-gosto, fora levado à presença de Jesus para ser curado de uma cegueira antiga. Resultado, o cego continuou sem ver nada. Mas isto é outra história.
A consulta seguiu conforme o roteiro habitual. Após algumas perguntas iniciais, o doutor Athos procedeu à tomada da pressão; o estetoscópio foi aplicado sobre o tórax para ouvir os esperados ruídos cardíacos agudos e os graves pulmonares; deus algumas apalpadelas no abdome para sentir o fígado e o baço; o martelo, em leves toques, foi aplicado aos joelhos para avaliar a estabilidade dos reflexos neurológicos. O velhinho se submetia passivamente a tudo e não dizia absolutamente nada. Com o semblante furioso, permanecia calado todo o tempo.
Terminados os exames, o doutor Athos concluiu que o paciente estava muito bem para sua idade. Afora alguns problemas degenerativos, próprios da vida longa, o velho apresentava uma saúde de ferro. Anotou os dados na ficha e prescreveu apenas um Vanadiol, proverbial fortificante da época.
Para encerrar, passou mais algumas recomendações extras e finais. Nesse momento uma das filhas se adiantou e solicitou ao doutor que aproveitasse a receita e passasse também um medicamento que fosse bom para gases, uma vez que, segundo ela, o paciente sofria de uma flatulência horrível. O mais provável é que o velho vivesse peidando e poluindo a casa o tempo todo. O doutor Athos entendeu o drama da família e, atendendo ao pedido de todos, prescreveu Luftal.
Nesse momento, o velhinho que se mantivera calado todo o tempo se manifestou: “Doutor, esse último remédio aí eu não vou tomar!...”
“Mas por que não quer tomá-lo, meu querido amigo?” —quis saber o doutor Athos. “Digo-lhe sim, doutor, com todo respeito, mas jamais permitirei que me tirem a minha última e grande alegria da vida que é peidar...”
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