A VIÚVA E O SACRISTÃO. (CRÓNICA)
Ana Zélia
A viúva aguardava ansiosa pelo dia dos namorados, véspera de santo Antonio, sabia ela que em algum lugar haveria tantas fogueiras, claro que seria longe, na cidade o asfalto já não deixa queimar a lenha.
Fazia tempos que ela não recebia um carinho sequer, quando desejava ser abraçada, quando aquele desejo louco vinha, ela ia a algum lugar onde houvesse gente, onde um amigo lhe desse um abraço, lhe dissesse algo.
Devota de santo Antonio mandou fixar na porta um quadro de azulejo importado da Espanha. O chamava Santo Antonio da porta, depois veio o da escada, bordou duas telas em meio ponto do Santo, uma deu ao filho e a outra ao homem amado. Acredita que Ele deve proteger a estas pessoas tão queridas.
Chegou o dia dos namorados, ninguém ligou, passou, olhou o céu a lua começava a ficar linda, era lua cheia. Ligou ao homem amado, só chamou, ele não estava. As lágrimas começaram a cair, ela se perguntava: Por quê?
Por quê? Onde ficara parte de si, se fez poeta e escreveu:
Ah! Esta paixão que embriaga, fascina, enlouquece, sombras de mim mesma, no céu a lua reflete o desejo obscuro de tantas fases. Busco o espelho, este fiel escudeiro que não se deixa enganar. Traduz sempre a verdade, nua e crua, fria.
O tempo passou, correu, como correram, os sonhos de adolescente feneceram todos, virei um teorema de difícil solução, quem sabe seja esta a causa de alguns temerem ou fugir da matemática, só uns poucos a decifram com tanta maestria.
Como um raio, uma faísca, o amor eclodiu, deixou estragos tão profundos, cicatrizes, só lhe restava juntar os caquinhos, viver de novo.
Armada com cola - mil tentou unir parte de si, dar vida à vida. O mundo é um mistério, o amor mais ainda. Em qual esquina deixei ficar minha vida, alma esquecida, a enamorada, os sonhos vividos, sentidos.
O fiel escudeiro responde: A Juventude se foi, a Velhice é uma luta constante de guerreiros, armas diferentes, falta o brilho no olhar, os hormónios, falta a coragem para enfrentar os bichos sentidos, vividos dentro de cada ser.
__Ah! Já fui bom nisso! Esqueçam! A vida é um caminhar tranquilo, é se estar sempre preparada para o príncipe encantado que pode estar sentado nas esquinas onde deixaste ficar tua alma, pecados.
Não desistamos da luta, estamos vivos e já ganhamos tempo. Compartilha um pedaço da atenção, distribua um sorriso amigo, isto é amor, vida.
Não reclame, Santo Antonio já fez milagres antes, você já teve o seu, porque outro pedido, desespero, você continua linda, bonita, palavras de espelho, prova que a viúva ainda se enfeita.
Ao Santo Antonio da porta deu um prato de pipocas que tinha, pirulitos recheados, refrigerantes, velas azuis, muito amor ao Santo casamenteiro.
É a vida pobre viúva, enquanto você sonha com o amor, o País mostra a inexistência total dele.
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Nota da autora- Como radialista, usei a crónica para abordar temas tão sofridos quanto o desamor, a fome, em quase todos os programas ela estava lá dando seu recado. Passa tempo, tempo passa, passam as horas, os momentos, passamos nós.
Manaus, 07 de novembro de 2009. Ana Zélia
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