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Humor-->Porcada -- 15/12/2006 - 15:58 (Jader Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Porcada

Uma vez por mês, nas frias madrugadas, ouviam-se estranhos gritos vindos da escuridão do quintal. Eu já sabia que era o Juca, meu pai, com suas mãos inábeis dando cabo de mais um porco gordo que apartara na véspera. Era o Juca, sempre o Juca, fazendo uma de suas famosas "cagadas", fabricando lingüiça e fantasmas, aumentando a população de duendes da Vila de Água Doce. Nessas ocasiões, eu acordava preocupado. Já sabia que, se por qualquer razão o porco não morresse, a culpa seria só minha, porque eu não passava de "um frouxo e tinha dó do bicho". Quando isso acontecia, e não era raro, o Juca me entregava uma marreta e mandava que eu "terminasse o serviço". Ou seja, eu devia liquidar definitivamente o porco moribundo. Era um castigo que ele me dava para que eu aprendesse a ser "homem". De posse do pesado instrumento eu esmagava a cabeça do suíno. Foi assim que aprendi a ser um "homem de verdade", matando porcos com marretadas.
Bem cedinho, quando havia movimento na casa, eu já sabia que haveria morte no quintal. O Juca vivia acompanhado por alguns de seus muitos compadres, esses colaboradores voluntários e misteriosos, solidários na vida e na morte. Eu achava que algum mistério forte unia aqueles compadres. Não eram parentes, não eram sequer vizinhos, mas como se defendiam e se ajudavam!
Numa dessas madrugadas, aconteceu uma cena agitada e cômica. Eu tinha oito anos, pouco mais pouco menos, e ainda me lembro do fogaréu em movimento. Naquela madrugada caipora, nada deu certo para o Juca. Foi uma cagada só. O porco fora derrubado meio sem jeito e a faca acabou sendo introduzida pelo lado errado. Para variar, o Juca errara de novo o coração do porco! O órgão vital ficava do outro lado... O experiente compadre que estava ali perto, resmungou: “Compadre, esse bicho não morreu!...”
O Juca fingiu que nem era com ele. Teimoso, pois sabia de tudo, desconversou. O enorme depósito vivo de carne e toucinho permanecia deitado. Desconfiado, o porco fingia-se de morto e apenas ganhava tempo. Escondido por uma montanha de folhas secas e combustíveis de bananeira, parecia que dobrara de tamanho. O esperto suíno gostou do calorzinho das folhas, um inesperado carinho, e acabou dormindo, cochilando em gostosa lipotímia...
O aviso do compadre, que tinha lá a sua lógica, fora solenemente ignorado, pois a experiência do Juca lhe assegurava que o porco estava morto, definitivamente morto. E continuou o serviço. Um litro de álcool foi despejado, um fósforo imediatamente riscado e veio a explosão. Clareou-se a noite e o quintal. O porco, meio morto meio vivo, despertou e fugiu com destino incerto. Em velocidade nunca vista antes, carregava a um tempo o calor na pele e fugia do fogaréu. Seguiu no rumo do rio.
Antes de tombar morto, porém, o valente suíno ainda teve tempo de incendiar velhas bananeiras e tudo o mais que houvesse de inflamável ao longo do caminho. O nosso quintal agora estava em chamas. Spielberg dirigia a cena. Um avião de guerra sobrevoara o pequeno feudo do meu pai despejando barris de napalm. Só faltava o som da Nona Sinfonia de Bethovem. Finalmente, em meio à fumaceira e diante da obviedade do desastre, o Juca se rendeu ao real e concordou com o seu compadre. O maldito porco realmente não morrera. Olhou para o vazio como sempre fazia nessas horas e, fingindo uma tranqüilidade que em verdade não tinha, filosofou: “É compadre, a regra é essa!... a regra é essa!...”

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