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Contos-->MASSAPÊ -- 07/08/2021 - 09:33 (Roosevelt Vieira Leite) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

MASSAPÊ

POR ROOSEVELT VIEIRA LEITE

 

A rádio de Campos noticiava que no final de semana a chuva seria muito forte. Em Campos no mês de dezembro tem trovoada. A chuva é forte e demora bastante tempo. A rádio dizia que as pessoas deveriam ficar em casa porque podia haver um temporal. Os raios estalavam no céu, e o trovão assustava as pessoas. A rádio local passava o programa ‘viola de ouro’ e Campos adormecida relaxava no final de tarde. Aquele final de semana era para ser mais um final de semana como de costume mas algo diferente, estranho, e porque não assustador aconteceu. A chuva molhou o massapé de Campos, as rochas sedimentares do rio Jabiberi também. Na altura da ponte, na margem esquerda do rio, um monte de massapé lentamente ganha a forma de um homem. A proporção que o barro ganhava forma humana os pássaros cantavam excitados. As garças se aproximaram para ver e o gado mugia. O homem sai da lama nu como Deus o fez e sobe o barranco em direção a pista. Os carros procuravam se desviar do homem nu e esquisito que andava tropegamente. Um senhor que dirigia uma perua parou bem atrás do homem, buzinou, pôs a cabeça pra fora e disse: “oh, louco sai do meio!” O homem nem olhou para trás. Acertou os passos, levantou a cabeça, e foi seguindo viagem a pé do jeitinho que Deus o fez. O motorista da perua desceu do carro e foi até o homem; segurou seu braço e lhe disse: “Seu indecente!” O homem parou, olhou para a cidade e disse de volta: “Maior nudez é a de Campos!” O motorista foi tocado pela voz do homem e o levou para sua casa. Deu-lhe roupa, comida, e morada.

O homem ficou conhecido como o Mestre, o mestre de Campos. Ele sabia dizer sobre sua vida. Dizem que sua vida era um livro aberto para o mestre de Campos. Uma mulher magra cadavérica foi falar com ele e um milagre aconteceu. A mulher engordou depois do encontro e arrumou um namorado. Isto circulou logo em Campos e em pouco tempo a casa do motorista Filó passou a ser a casa do mestre profeta. As pessoas marcavam a consulta e iam falar com ele. Em pouquíssimo tempo o mestre ficou muito conhecido em Campos.

Um senhor da Barroca teve suas hemorroidas curadas, uma senhora da Tapera estava com bicheira nos pés e teve a ferida curada. Um ceguinho passou a enxergar melhor; o homem passou a ver as placas dos carros, mas, via um pouco turvo. Uma baixinha cresceu dois centímetros e ficou muito emocionada. Os fenômenos aconteciam e logo se espalhavam pela cidade. Era notório que o mestre profeta era paranormal. Ele se tornou em uma pessoa bem quista em Campos. Todos o saudavam. Ele vivia cercado de pessoas. Até as autoridades andavam com o mestre.

Certo dia o mestre foi convidado a falar para Campos inteira na Praça do Cruzeiro. Armaram um palco e colocaram o profeta para falar a Campos. O mestre disse que o amor não é firme. O amor de Campos é dos beiços. Campos precisava amar como o mestre Jesus – sem interesse. A multidão aplaudiu o mestre e ficou muito tocada com suas palavras. Um senhora magra e pequena de curtis escura uma verdadeira afrodescendente gritou para ele: “O que devemos fazer mestre?” A pergunta realmente o tocou que passou a refletir em como dar uma verdadeira experiência de amor a Campos.

O mestre ensinou que devemos amar ao próximo por meio de atitudes. Também disse que o norte das relações sociais é a caridade. Campos amava muito ao mestre. Pensavam até em dar seu nome para uma de suas ruas. Um artista plástico de Campos fez uma estátua tamanho natural do mestre. A obra de arte foi colocada na Praça da Bandeira. Algumas pessoas começaram a acender velas lá e com o tempo o costume aumentou depois que o filho de Norma foi curado do sangue. Virou costume em Campos adorar ao mestre. Onde ele passava as pessoas paravam e faziam um sinal de adoração. Segundo o povo os pedidos eram atendidos na bucha. “É pediu e recebeu”. Dizia o povo campense. A polícia passou a dar proteção ao místico vinte e quatro horas. As pessoas queriam vê-lo a todo custo e isso podia causar acidentes.

A fila para falar com o mestre dobrava o quarteirão. Algumas pessoas dormiam no pé do portão para no outro dia falarem com o mestre profeta. Com isso as outras religiões começaram a sentir ciúmes e de todas as formas queriam que a população abrisse os olhos. “Vocês estão sendo enganados. Esse homem entrou nu em Campos. Ninguém sabe quem é!” Por mais que falassem contra as curas e rezas do mestre mais o povo ia à sua procura e mais o ciúme aumentava. Não muito comum, as diversas religiões de Campos se reuniram em conselho para decidir o que fazer com o mestre pois suas igrejas estavam ficando vazias: “Agora todo mundo fala com Deus. É só ir falar com o mestre”. “Os dízimos caíram mais de quarenta por cento. Fica difícil pagar as contas”. Na verdade, o mestre estava provocando uma independência religiosa. As pessoas acreditavam que Deus estava nelas e elas como parte de Deus podiam viver uma vida feliz. Os ensinamentos do mestre previa o fim dos templos, pois, o perfeito templo somos nós mesmos. Isso era um motivo de ira por parte dos clérigos. O povo em vez de contribuir com a igreja agia de forma direta, dava logo o dinheiro para os pobres. Como o mestre diz: “O norte das relações sociais é a caridade”. Mas nada podia ser feito contra o mestre. Eles não tinham o que falar, exceto, da falta de chuvas. Depois de um certo tempo passou a chover muito pouco em Campos. Os anos passaram e levaram com eles as chuvas. O inverno foi muito fraco comentava o povo.

Um dia os clérigos tentaram ao mestre. Mandaram alguém lhe oferecer dinheiro por uma cura. O mestre disse que Jesus ensinou que de graça recebestes e de graça então deve ser dado. Outra vez colocaram uma mocinha para seduzir o mestre. O mestre rezou o Pai Nosso pela moça e a despediu em paz. Uma outra vez mandaram convidá-lo para ser vereador. O mestre disse que se deve dar a Deus o que é de Deus e aos homens o que é dos homens. O mestre não se deixou levar por nada. O cabra era duro que nem pedra. Depois da adoração na praça, o povo passou a fazer vigílias em frente à casa do homem. Todas as noites um grupo de pessoas passam a noite em oração defronte à casa do profeta de Campos. O coro canta em voz alta “Maria de Nazaré”. Depois rezam um Pai Nosso com umas três Ave Marias. Assim seguiu a vida do homem que veio do massapê. O homem gerado no massapê virou um santo em Campos. Alguns estudiosos da cidade que admiravam ao mestre chegaram à conclusão que ele era a reencarnação do Cristo por isso ele era a plenitude de Deus. O homem não falhava em nada.

Os clérigos não desistiam. Pois diziam que ele precisava ser morto porque estava recebendo adoração como se fosse ele mesmo Deus. Então contrataram um pistoleiro em Rio Real para dar fim a vida do mestre. O pistoleiro chegou a Campos na madrugada de sexta para sábado. O mestre ia fazer uma apresentação pública no domingo na Praça João Valeriano. Era uma palestra sobre educação. O mestre dizia que a verdadeira educação é a que o Cristo deu. Depois da reunião o povo ia comemorar os vinte anos de existência do profeta de Campos, o mestre. O pistoleiro não esperou muito. Atirou, ali, mesmo enquanto ele estava dando a palestra. O mestre caiu e logo se levantou com a mão no peito. A bala atingiu seu peito furando um dos pulmões, mas, mesmo assim ele estava vivo. A multidão que havia corrido com o tiro grita milagre. A tragédia vira festa na praça João Valeriano. O povo cantava, batia palmas e nem percebeu a fuga do pistoleiro. Com esse milagre, os clérigos se convenceram a deidade do mestre e passaram a segui-lo e adora-lo. Somente os protestantes se recusaram a seguir ao mestre. Por isso a briga continuou. Os crentes de Lutero pregavam diuturnamente que o mestre era o anticristo e que ele estava enganando as pessoas. Uma igreja neopentecostal lançou o desafio que eles tirariam os demônios do mestre se ele fosse a igreja. O mestre foi. Em um dia de domingo pela manhã o mestre e sua equipe visitam a igreja neopentecostal. Sete pastores formam um círculo em torno do mestre que estava sentado em uma cadeira. A audiência, em silêncio, acompanhava tudo. Os pastores começam os conjuros: “Sai, em nome de Jesus, espírito enganador!” Outro grita com toda a força dos pulmões: “Sai, Satanás!” E assim continuaram os conjuros até se cansarem. As pessoas da audiência se revoltam e os pastores se ajoelham aos pés do mestre. Agora toda as religiões de Campos aderiram aos ensinamentos do mestre Messias.

Campos passou a viver em função da religião. As pessoas andavam nas ruas com a foto do mestre estampada nas camisas. Havia outdoors com a foto do mestre e os dizeres: “Jesus já voltou”. O comercio não aguentava mais os feriados e os dias de oração que eram quase todos os dias. Tobias, a antiga vila de Campos nunca mais viu uma chuva. O povo começou a falar da nova vida: “Não chove mais. Vocês já notaram que não chove mais?” O povo de Campos pediu ao mestre para chover em Campos. O mestre prontamente orou e prometeu que em sete dias ele ia receber a chuva na praça do cruzeiro. O primeiro dia passou. As pessoas olhavam para o céu e nada de nuvens. Uns falavam que só vinha chuva no último dia. O segundo dia foi do mesmo jeito. Céu claro com nuvens aqui e ali. No terceiro dia deu um chuvisco fino. As pessoas comemoraram o chuvisco e deram glórias ao mestre. Na quarta-feira o céu fechou, ficou totalmente nublado. Muitas foram as pessoas que foram para as ruas esperar a chuva. Mas, ela não veio. O céu escuro cobriu a vila de Campos. Os pássaros não voavam mais. A quinta, a sexta, e o sábado foi de céu escuro e silêncio nos ares. Somente uma gigantesca nuvem sobre Campos. As pessoas começaram a dizer que seria domingo. No domingo o mestre vai a Praça do Cruzeiro. Era meio dia quando ele fez a oração e começou a chover. As pessoas na praça tomavam banho de chuva e comemoravam a chegada do inverno. O mestre deixou se levar pela festa e foi também se molhar. O profeta se molhou na chuva que caiu dos céus. Ficou encharcado, e com isso o barro ficou mole, e começou a se desfazer. O mestre se desmanchou bem, ali, no meio do povo, na Praça do Cruzeiro...

 

 

 

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