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Cronicas-->Mente assassina -- 09/02/2010 - 16:59 (AROLDO A MEDEIROS) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Mente assassina

Aroldo Arão de Medeiros

Ele nasceu e lhe deram um nome que condizia com sua aparência e suas atitudes. Lindomar Tranquili era um rapaz de olhos verdes, não um verde aguado: duas esmeraldas brilhavam na sua face e pareciam querer dizer a todos que os amava. A pele morena era da cor de um jambo bem maduro. Possuía um jeito sereno de conversar, colocando as opiniões de modo claro e convincente.
Na infància, jamais brigou com qualquer garoto. Sempre tirava boas notas, sempre entre os três melhores alunos da classe. As roupas sempre limpas: dava gosto vê-las, ou melhor, admirá-las. Paquerava as meninas, que se derretiam todas e brigavam entre si na disputa por olhares mais "calientes".
O tempo foi passando e o belo menino foi se tornando homem. Os olhos perderam o brilho, tornaram-se tristes. A tez adquiriu uma cor mais escura, sombria.
Explicações para tais mudanças aparecem aos borbotões. Tentaremos colocar a que mais se aproxima da realidade. Os olhos passaram a ser tristes desde o dia que perdeu sua mãe e seu pai foi tangido a ficar acamado, vitimado por um càncer que o prostrou por dois longos anos. Eram as pessoas que mais amava, eram ancoradouros que suportavam quaisquer problemas que lhe aparecessem.
A coloração de sua pele deve-se ao trabalho, executado ao ar livre, suportando raios solares que lhe queimavam a epiderme antes aveludada e linda.
Com as mudanças no corpo vieram também alterações de comportamentos visíveis a olhos verdes, castanhos, pretos e nus.
O defeito, pelo menos para as pessoas que se consideravam normais, era a sua predisposição para falar em morte. Em uma viagem de oitocentos quilómetros, pelo menos vinte vezes repetia essa palavra ou variante da mesma.
Parecia que não eram somente palavras colocadas a esmo, mas sim uma vontade íntima de que acontecesse um acidente com alguém, desde que não fosse ele.
Certa vez, reunido à beira da rodovia com alguns funcionários da empresa onde trabalhava, percebeu um pedaço de pneu de caminhão sobre o asfalto. Não contou tempo e começou um monólogo pessimista e merecedor de registro.
- Aquele pneu pode causar um acidente. Um carro pode passar e a velocidade não permitir que ele desvie.
Vendo que os peões continuavam sentados sem a menor intenção de se levantar para retirar a borracha, continuou.
- É, pode ser que passe um caminhão cheio de cimento, tombe, e toda a carga se espalhe na estrada e o motorista fique preso entre as ferragens.
Não foi dessa vez que convenceu os homens cansados e suados da labuta. Ainda bem que não percebeu os sorrisos contidos de sarcasmo e incredulidade diante do que ouviam.
- Já pensaram se passa um ónibus? E se esse monstro de lata virar? Para piorar, se for um ónibus escolar e esteja apinhado de crianças na maior algazarra. Depois não venham me dizer que não avisei que poderemos presenciar anjos espalhados pelo chão. Alguns chorando, outros com os corpos rebentados e muitos anjinhos inertes sobre o asfalto quente.
Ao sentir que não convenceu seus subalternos, dirigiu-se até a pista, com o máximo cuidado e retirou o material feito do látex assassino, jogando-o no mato.
Como nem tudo é trabalho, Lindomar, que também é filho de Deus, tinha direito às férias. Nesses dias pegava sua mulher e suas tralhas e dirigia-se à casa de praia. Os apetrechos que carregava eram badulaques para consertar uma cerca, limpar o piso, ou outros afazeres que aparecessem. O último lugar que metia seus pés eram nas águas do mar. Comprou essa casa a pedido da patroa, como gostava de chamar aquela que fora escolhida para lhe acompanhar por toda a vida. O que mais ajudou na escolha do local, foi que alguns amigos tinham casas na mesma rua e ele preocupava-se menos com segurança. Como nem tudo são flores, mesmo numa freguesia pacata em que todos se conhecem, o inesperado aconteceu.
A casa de seu melhor amigo foi assaltada. A residência vazia foi um prato cheio para os bandidos fazerem o que quisessem. Além de levar televisão, talheres e aparelho de som, os malfeitores sujaram os aposentos e beberam a metade de seu melhor uísque e um vinho que ele guardava para abrir na passagem de ano.
Lindomar tomou uma atitude, e não um vinho. Comprou uma garrafa da mesma marca, colocou na mesa de centro da sala. Não sem antes inserir, com uma seringa de injeção, estricnina. A sua teoria era de que o bandido iria voltar, escolher sua casa e dar com os burros n`água. Ficou com aquela garrafa mais de um mês exposta. Depois da decepção, abriu-a e escorreu todo o líquido mortífero sobre a grama até então verdejante.
Quando não estava na praia, ou viajando a serviço, ficava no seu apartamento, no segundo andar de um prédio situado numa avenida movimentada. Esse era o motivo das pessoas que ali moravam, em épocas de calor, deixarem as janelas abertas para refrescarem-se sem gastar energia extra com ventilador e condicionador de ar. Azar deles. Um maléfico fez um trabalho digno de homem-aranha. Subiu até o terceiro andar, roubou alguns dólares e jóias de uma coroa. Só que o cara não se contentou e, ao passar pelo andar do Lindomar, levou uma blusa de seu filho. A mente maligna de Lindomar fez com que ele pegasse um fio, colocasse na tomada e o desencapasse sobre a mureta da varanda. A explicação era de que se o jaguara não morresse eletrocutado, morreria ao cair no chão. Ou como ele dizia, poderia ter sorte e o bandido morrer duas vezes.
Sua esposa ficou uma semana sem dormir com medo de ter um bandido morto ou seu próprio filho que, mesmo avisado, por descuido poderia colocar a mão no fio.
Com tanta mudança de comportamento na vida de Lindomar Tranquili seu nome poderia sofrer alteração para Benvindo Boamorte. O escrivão, se soubesse da trajetória que estava reservada ao Tranquili, certamente mudaria na hora o seu nome, sem titubear.

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