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Contos-->A SINA DE UBALDO -- 11/02/2022 - 10:54 (Roosevelt Vieira Leite) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

UBALDO E SUA SINA

POR ROOSEVELT VIEIRA LEITE

 

- Eu não sei o que ele fazia correndo daquele jeito.

- Mulher, o rapaz estava alucinado. Ele não conhecia ninguém. Nem mesmo o povo dele ele reconheceu.

- É, mas, não pode ser assim. A polícia estava certa em leva-lo preso.

- E ele está preso é?

- Sim. Vai ficar lá até as coisas serem esclarecidas.

- Coitado de Ubaldo. Um jovem tão bom!

A cidade de Tobias Barreto é a capital sergipana dos bordados. Tobias é um oásis de prosperidade na fronteira com a Bahia. A cidade cresceu com a feira da Coruja e isso trouxe moradores de todos os cantos do estado e até de outros estados do Brasil. A cidade com 60 mil habitantes é um orgulho para o povo sergipano. Tobias embora grande e cosmopolita tem tradições históricas que são zeladas pelo seu povo. Uma delas é o São João. As festas juninas de Tobias encantam seu povo e quem passa por aqui. Foi no São João de 2016 que Ubaldo surtou. De uma hora para a outra o rapaz começou a ver uma mulher lobisomem. A mulher barbada com dentes em forma de presas e unhas grandes aparecia para o rapaz e pelo que parece aparecia somente para ele pois mais ninguém no município inteiro afirma ter visto tal criatura. Ubaldo diz ver a mulher nas noites de lua cheia, mas, desta vez ele a viu ontem, quinta-feira pela tarde. Ele estava indo para o trabalho na 31 de março quando inesperadamente diante de seus olhos a mulher salta com a boca aberta e garras afiadas. De súbito ele deu um pulo para trás e começou a gritar. Em seguida, em pânico, ele corre pelo comercio gritando por socorro. Ninguém conseguiu parar o homem. Somente a polícia com sua perícia conseguiu acalma-lo e leva-lo para a delegacia onde se encontra agora:

- Ubaldo, está melhor? Já se acalmou? Perguntou o delegado Plínio.

- Já estou melhor sim. Mas vocês deveriam ter visto o que eu vi e aí vocês me entenderiam.

- E o que foi que você viu afinal que causou toda essa agitação. Perguntou Plínio novamente.

- Doutor, eu vi um lobisomem fêmea. A mulher tinha a minha altura e aparência devastadora. E ela disse o meu nome. Depois correu para me pegar.

- Ubaldo, sei que você fala a sua verdade. Mas nós perguntamos as pessoas do comercio e ninguém viu nada exceto você gritado e derrubando barracas.

- Mas eu vi doutor. Eu juro que eu vi.

- Por que você não procura ajuda especializada?

- O senhor diz...um médico? O senhor acha que eu estou louco?

- Não, não é isso, mas, conversar, sempre, ajuda.

Ubaldo saiu da delegacia três da tarde e foi direto para a casa onde estava seu pai e sua mãe. Os dois estavam aflitos com o filho e queriam saber o que ocorrera. Ubaldo lhes contou tudo e os dois ficaram olhando um para o outro como que não soubessem o que falar.

Depois deste ocorrido passou um tempo até longo para tornar a acontecer uma aparição. Ubaldo estava em casa a ver televisão. Era oito horas da noite. Seus pais já haviam se retirado e o moço Ubaldo estava na sala de televisão deitado no sofá. De repente ele escuta a janela da sala que dá para o oitão da casa ranger. Ele se levantou para ver e se depara cara a cara com a criatura. O medo foi tão grande que ele não conseguiu gritar caiu estático no sofá e a criatura pula sobre ele e rosna diante de sua face pálida e assustada. Ubaldo fecha os olhos e cerra a boca. A estranha criatura lobisomem se retira sem fazer nada. Ubaldo permanece em choque por alguns minutos, depois recupera as forças se senta no sofá, e começa a meditar sobre o assunto: “Mas, o que é que ela quer comigo?” “Mas, será isso um delírio, uma alucinação?”

Ubaldo decide se consultar com o Dr. Anacleto. Este era o psiquiatra da prefeitura, um homem bom, cheio de caridade:

 - Bom dia Ubaldo! Eu soube, ... você sabe que aqui se fica sabendo de tudo, ... soube que você está vendo coisas.

- É doutor, eu vejo um lobisomem mulher. Ela me apareceu novamente ontem. Ela veio até mim e eu a vi cara a cara. Senti até sua respiração seu cheiro de cachorro sujo. O Dr. Anacleto coçou a garganta e tomou a conversa:

- Mas, você sabe que estas coisas são mitos populares. Elas de fato não existem, exceto, no imaginário das pessoas. O que mais você sente? Ubaldo viu que ninguém ia acreditar nele, então para encerrar a conversa diz que está com dificuldade para dormir. O médico passou uma medicação chamada olanzapina e o despediu. A caminho de casa ele reflete e diz: “Quem sabe tudo isso seja imaginação de minha mente. Vou tomar o remédio e descansar”. Ubaldo pediu licença de trinta dias do emprego e ficou em casa com seus pais, seu Francisco e dona Maria do Amparo: “É meu filho descanse uns dias e você vai melhorar”.

Os dias eram longos para Ubaldo. O rapaz era acostumado a trabalhar por isso a ideia de ficar em casa pareceu um tanto estressante. O remédio em dez dias começou a fazer efeito e o rapaz ficou bem calmo e sonolento. Pela primeira vez na vida Ubaldo não fez questão de estar andando na rua. Seus pais agradeceram a Deus por ver o filho em casa, mas, logo estranharam o fato dele não estar muito comunicativo: “Ubaldo, venha para cá. Venha ver televisão com a gente!” “Não mãe, vou aproveitar hoje para ler um livro”. Ubaldo se recolheu. Quando a noite chegou, antes do jantar, o rapaz estava lendo em sua cama quando ouve um barulho na suíte de seu quarto. Ele se levanta para ver o que é, e devagar se aproxima do banheiro. A zoada era no vaso sanitário que estava com a tampa baixa. Com um certo temor o rapaz levanta a tampa e ver a cabeça da mulher lobisomem saindo do vaso se espremendo pela abertura do mesmo. A mulher consegue sair enquanto o rapaz em choque se encontrava deitado no piso do banheiro. A criatura horrenda deitou-se sobre seu corpo trêmulo, abre a boca e cospe na boca dele como que quisesse passar alguma coisa. O rapaz engole a saliva da criatura e perde os sentidos. Ao acordar ele percebe que estava arranhado nos braços e que sua boca estava dormente. Ubaldo toma um banho para tirar o cheiro de cachorro sujo. Seu corpo estava marcado, agora, ele tinha uma prova de que o que ele via era real: “Mas o que é isso?” “Quem é esta mulher lobisomem?”

A noite era de lua cheia. O remédio fez Ubaldo pegar no sono. Por volta das dez horas a lua nasce com toda a pujança que a natureza lhe confere. Ubaldo acorda com um calor insuportável. Vai a cozinha tomar água e termina ingerindo toda a água gelado que havia, sem, contudo, a sede cessar. O rapaz bebe a água do filtro que ficava no quintal, mas, a sede não passa: “Meu Deus, eu estou fervendo de febre”. O rapaz volta ao quarto e toma banho novamente, mas, a febre e o calor não param: “Meu Deus o que é isso”. Ubaldo sai de casa sem destino. Sentia uma dor aguda no estômago e caminha sem direção. Apôs trinta minutos de caminhada, percebe que está na Lagoa da Porta. Ubaldo atravessa a lagoa a nado até uma pequena mata que ficava do outro lado da lagoa. Ele cai de dor, se contorce todo, suas unhas crescem, o pelo brota de sua pele, e as presas de lobo aparecem eu sua boca. Ubaldo era então um lobisomem. Ubaldo com seu novo corpo se sente forte e livre. Uiva com a lua cheia e corre pelos pastos de Tobias Barreto. Nas proximidades da barragem da fazenda Concórdia ele para um instante, e reflete sobre sua nova realidade: “Agora eu sou um licantropo”. “Qual é a sina de um lobisomem?” Ubaldo não sabia o que fazer. Voltou para casa depois que se transformou em homem e trancou a porta de seu quarto.

Seus pais logo perceberam que havia algo errado com o filho. Ubaldo não saia do quarto pois tinha medo de virar fera na frente dos pais. Seus pais chamaram o padre da paróquia para rezar o rapaz Ubaldo. Era uma sexta feira de Lua cheia. O padre veio com sua equipe: Dona Flores da Carismática, Seu Donato da Sagrada Família, Reginaldo da farmácia, e o cantor gospel Martins do grupo Elshaday. A reza seria no quarto de Ubaldo e o rapaz deveria vestir uma roupa branca. Estas foram as exigências da equipe evangélica.

O vigário iniciou a prece com um Pai Nosso. Depois uma Salve Rainha. E depois um Creio em Deus Pai. Ubaldo estava deitado na cama de olhos fechados e mãos juntas em atitude de prece. O padre fez o sinal da cruz com o crucifixo que tinha na mão e aspergiu água benta em Ubaldo. A água benta irritou a pele de Ubaldo que iniciou um processo de combustão. Todos se apavoraram com a cena de Ubaldo em combustão, em seguida o rapaz inicia a metamorfose, em alguns minutos o rapaz vira lobisomem. O padre, um pouco medroso asperge mais água benta no moço lobisomem que faz uso da palavra em seu favor:

- Chega de teatro! Gritou o lobisomem.

- Como assim, teatro? Respeite a obra de Cristo criatura horrenda!

- Se eu quiser eu devoro todos vocês! Parem com isso! Eu sou apenas um licantropo procurando meu espaço no mundo!

- Criatura das trevas! Cristo de repreende! Ubaldo de um salto sai da cama e marcha rumo ao vigário que se urina nas calças:

- Onde está sua fé homem de Deus? Rosna a fera pelos cantos da boca. O padre e todos os acompanhantes se retiram do quarto e vão para sala e para lá vai Ubaldo:

- Nunca mais venham me perturbar. Diz Ubaldo na forma de fera.

- Você, Satanás! Você está derrotado pelo Cristo ressurreto! Gritou o padre com todas as forças de sua fé.

- Deixem me em paz! É tudo que eu quero! Disse o lobisomem Ubaldo despedindo os religiosos de sua casa.

Ubaldo transformado em lobisomem se aproxima de seus pais para um dedo de prosa:

- Agora, vocês sabem qual é o meu problema. Sou um lobisomem, mas, um lobisomem do bem. Não vou atacar ninguém eu prometo. Eu quero ter uma vida tranquila sem ninguém me perseguir. Quero até se possível frequentar a igreja, mas, eu prefiro uma igreja evangélica. Os pais de Ubaldo deram graças a Deus que o filho não era um monstro embora parecesse.

As pessoas de Tobias Barreto agora sabiam que tinha um lobisomem na cidade. O padre falou na igreja que Ubaldo infelizmente estava possesso por um lobisomem e que era preciso exorciza-lo. Tobias ficou alvoroçada. Não se falava noutra coisa – o lobisomem de Campos, pois, Tobias é chamada de Campos pelos mais velhos. Alguns caçadores juraram a fera dizendo que se a vissem pelos pastos mandariam fogo. Ubaldo não saia de casa. Deixou o emprego e se dedicou a cuidar dos pais velhos. Quando virava lobisomem ele corria para o pasto de Neto próximo ao Rio Real.

Tudo estava tranquilo. Ubaldo virava lobisomem andava pelos pastos e depois voltava sossegado para casa. E assim os dias passavam até que Ubaldo fez a pergunta que devia ter feito há muito tempo: “E a moça lobisomem que o transformou quem é? Onde está?” Ubaldo ficou pensando nestas coisas até que seu coração passou a sentir que ela estava por perto. Era como uma sintonia que havia ocorrido. Ubaldo precisava saber da mulher por que certamente ela era uma pessoa como ele e deve ter alguma história para contar.

A semana de lua cheia chegou no mês de agosto. A cidade estava agitada por causa da festa da Padroeira. Até nas estradas de roça tinha movimento de gente. O povo se deslocava para Tobias afim de participar das festas. Ubaldo aproveitou e comeu algumas galinhas que encontrou soltas pelos pastos e estava a fazer a digestão num tanque próximo do povoado Roma. A lua alta dava a Ubaldo a ânsia para uivar. Ele uivava muito com muita força. Até que ele escuta vindo por detrás dele a criatura fêmea que o transformara:

- Tem sido boa a vida de lobisomem? Perguntou a criatura rosnando como um cachorro brabo.

- Eu queria a minha vida anterior. Esta é uma prisão. Estou preso neste lobo.

- Mas você pode ter muitas coisas e fazer outras mais. Você pode ter poder por exemplo.

- Como assim? Poder?

- Ora os lobos e os vampiros são donos do mundo. Em Tobias as pessoas são atacadas por vampiros quase todos os dias e você pode se tornar um herói.

- Ora, mas isso é história de revista. Como é seu nome?

- Você me pergunta meu nome e eu te digo meu nome são muitos. Eu sou muitas... A estranha figura abraçou Ubaldo e encheu a boca do rapaz com o liquido da sua boca. Depois deu um salto sobre a lagoa e saiu correndo pelos pastos até se transformar numa tocha de fogo. Ubaldo retornou para casa e meditou sobre as palavras da mulher lobo.

Ubaldo era um lobisomem que não sentia vontade de atacar as pessoas. Tudo que ele queria era viver em paz com os seres humanos. Contudo, os humanos não queriam saber dele.

Mas a pesar do preconceito e da diferença Ubaldo conseguiu sair na rua e fazer algumas coisas. Tomava uma medicação para não virar de dia. Dr. Anacleto fez o remédio com ervas do campo. Ubaldo andava no meio do povo que assustado olhava pra ele com certo receio. O tempo foi passando e com o tempo as pessoas se acostumaram mais. Nas noites de lua cheia as pessoas se reuniam na praça do cruzeiro para ver Ubaldo transformado em lobisomem. Era um verdadeiro show. As pessoas contribuíam com qualquer valor. O dinheiro Ubaldo mandava para casa. Era sua nova renda. Finalmente Ubaldo achou o seu lugar. Com certas restrições, mas, finalmente ele estava integrado apesar do medo das pessoas.   

Mas, a paz não durou muito tempo. Parece que o destino reservava algo muito especial para o lobisomem de Campos, ou melhor de Tobias Barreto. Uma jovem de 20 anos não voltou para casa na noite anterior a apresentação na praça. O Rádio local anunciou no noticiário de meio dia. A família muito preocupada dizia que a filha havia morrido. As pessoas comentavam apavoradas com o sumiço da moça que todos conheciam, mas ninguém sabia de nada; a moça apenas saiu e sumiu. Por volta de três da tarde a família vai a polícia:

- Mas, a gente só começa a procurar quarenta e oito horas depois da denúncia.  Explica o delegado Plinio para os pais da menina Gloria esse era o nome dela.

- Então, o senhor está me dizendo que só vai procurar depois de amanhã?

- Não é isso. A gente já está em alerta desde que soubemos, mas, formalmente a partir de amanhã. Os pais de Gloria voltaram para casa e esperaram a manhã chegar.

A busca por Gloria durou alguns dias. Todos os protocolos foram seguidos. Mas a moça não foi encontrada. A polícia passou a seguir Ubaldo. Ubaldo não ligava para a polícia que vez ou outra tentava incrimina-lo:

- Onde você estava na noite do sumiço da menina?

- Eu estava em casa. Durmo cedo como quase todo mundo desta cidade.

- Olha Ubaldo, se você tiver alguma coisa com essa história nós vamos descobrir. O delegado Plinio despede Ubaldo com a seguinte recomendação: “Evite andar de noite pelos pastos porque estamos de olho em você”. Ubaldo retorna para casa com o pensamento no caso de Gloria: “Afinal. O que houve com a moça?” Os dias passaram e o caso da menina ficou sem solução. A cidade ficou um pouco assustada e as opiniões eram muitas: “Eu acho que Ubaldo tem alguma coisa a ver com isso”. Dizia Carlinhos da locadora. Já seu Demétrio dizia que isso foi uma abdução alienígena. Os comentários eram muitos, mas a verdade ainda não havia aparecido.

O tempo passou. Mais de dois meses correram como um carro de corrida. A cidade voltava ao normal quando se ouve o povo dizer que mais uma moça havia sumido. Era Maria Julia, a filha do ex prefeito Deocleciano: “Maria Julia foi para a faculdade no ônibus dos estudantes, retornou à meia noite, o povo a viu descer do ônibus, mas a moça não chegou a sua casa”. Era esse o comentário. O pai da menina apavorado foi ao Radio oferecer recompensa para quem desse uma informação sobre o paradeiro de Julia. A polícia de Aracaju foi acionada e com ela veio o grande inspetor Aníbal. Aníbal era conhecido por solucionar casos difíceis. Foi o próprio governador que o pôs no caso. A cidade de Tobias ficou repleta de carros pretos com luz vermelha na capota. O povo alvoraçado não saía de casa. Os vendedores de muamba do Paraguay e Caruaru se entocaram em casa de tal jeito que a feira da Coruja ficou vazia.

Aníbal colhe informações com Plínio e a principal suspeita é o homem que vira lobisomem:

- Quer dizer que aqui em Tobias Barreto tem um homem que vira lobisomem? Eu pensava que isso era história de Trancoso! Tem certeza mesmo que isso é real? Perguntou o delegado famoso.

- É meu amigo eu vivi para ver um lobisomem. As pessoas da cidade têm muito medo dele, mas, até hoje não achamos motivo para prendê-lo. Ele faz exibição de sua metamorfose na praça do Cruzeiro todas as quintas feiras. O pai e a mãe são gente muito boa. Os dois vivem rezando pelo filho.

- Chame ele aqui. Eu quero falar com ele. Disse Aníbal cheio de curiosidade.

- Nós investigamos todos os matagais ao redor da cidade num raio de três quilômetros e não encontramos nada. Uma pista se quer. O caso parece de gente profissional eu acho. Continuou Plínio.

- Olha amigo, não há crime perfeito. Sempre eles deixam uma pista. Disse Aníbal com esperança de encontrar as meninas.

A investigação de Aníbal começou por entrevistar todas as pessoas que estavam no ônibus de Julia e amigos. A mesma coisa com Glória. As pessoas de Campos começaram a suspeitar umas das outras, mas, o principal suspeito era o lobisomem Ubaldo:

- Onde você estava na noite do desaparecimento de Glória e de Julia senhor Ubaldo. Perguntou Aníbal com voz firme.

- Eu estava no pasto de Neto. Eu havia virado lobisomem e fui me refrescar no tanque. Geralmente quando estou lobisomem minha temperatura fica muito alta e eu preciso me refrescar.

- Tem alguém que pode confirmar sua história? Continuou o inspetor Aníbal.

- O senhor deve concluir que não, pois, ninguém anda com lobisomem. Disse Ubaldo um pouco constrangido.

- Fale a verdade rapaz! Você matou as duas meninas não foi? Gritou Aníbal com voz firme.

- Apresente uma evidência de que eu estive com qualquer uma das duas. Disse Ubaldo olhando nos olhos do delegado de Aracaju. A entrevista seguia, contudo, à proporção que Ubaldo ia sendo acusado seus nervos iam se alterando e Ubaldo se transforma em licantropo. A pessoas se assustam, sacam as armas, e ameaçam o rapaz que pula pela janela da delegacia e sai em fuga rumo as matas. A polícia tenta encontrá-lo, mas a busca não deu em nada. O lobisomem estava nas imediações da serra do Cavalo. A polícia, embora tivesse desconfiança de Ubaldo o deixaram em paz por enquanto.

Aníbal nada obteve com as entrevistas. Um mês havia se passado e o inspetor não teve sucesso com suas investigações. Os dois casos eram um verdadeiro mistério. E para sua tristeza um rapaz de nome Teixeira é dado como desaparecido. A família organiza uma passeata na Avenida Sete de Junho para caçar Ubaldo. Todos gritavam que o assassino era o lobisomem que estava desaparecido. Tobias acredita na história e homens valentes de Campos organizam uma caçada ao licantropo de Campos. Os pais de Ubaldo ficam apavorados e pedem ao delegado que impeça a caçada, mas, o mesmo estava envolvido também, Definitivamente, Tobias estava disposta a matar Ubaldo:

- Vamos pegar este lobisomem. Afirma Aníbal com muita fé.

- Mas não vai ser tão fácil assim. Diz Plínio.

- Por que o amigo acha isso?

- O lobisomem é tinhoso. Ele conhece cada grota deste sertão.

- É, mas, comigo a coisa é diferente. Concluiu o delegado de Aracaju.

Dois helicópteros sobrevoavam a cidade. Soldados e populares revistavam as roças de Tobias Barreto. Isto durou quinze dias. Nem os corpos foram encontrados nem o lobisomem foi capturado. Ubaldo estava muito bem escondido na fazenda São José que ficava ao pé da serra do Cavalo. O delegado especial Aníbal convoca uma reunião com Plínio. Na reunião ficou decidido que a cidade seria fechada. Todas as fronteiras de Campos foram fechadas. Quem entrasse ou saísse seria parado e entrevistado. Com isso o prefeito de Tobias reclamou porque a medida estava atrapalhando o comercio da cidade uma vez que sua maior freguesia vinha da Bahia. Apesar das reclamações do prefeito a medida foi mantida assim como as buscas pela captura de Ubaldo.

Ubaldo no São José vivia tranquilo. A fazenda abandonada era o lugar perfeito para um lobisomem viver. Tinha bastante água. Não faltava raposas e tatus para o alimentar. Em São José, do alto da serra ele via toda a movimentação em Campos. Ubaldo estava decidido a não voltar mais para a cidade apesar da saudade dos pais. As noites de lua cheia eram lindas. Ubaldo se controlava para não uivar. De fato, estava tudo tranquilo, contudo, o dia de encarar a polícia havia chegado. Foi numa quarta-feira que a polícia cercou a fazenda. Os homens entraram no casarão e revistaram tudo. Ubaldo escondido no porão da fazenda observava tudo. O rapaz manteve o controle por vários minutos, no entanto, a adrenalina subiu e com isso a metamorfose veio e desta feita com muita violência. Ubaldo avança na direção dos policiais e estraçalha alguns apesar de ser atingido por vários tiros. Ubaldo, mesmo ferido foge para a serra do Canine onde há uma gruta que não é conhecida exceto pelos mais velhos moradores do Cancelão. Desta vez, Ubaldo viu que as balas não tinham poder para mata-lo e aí ele se lembrou da mulher lobisomem e mentalizou sua figura até que as vibrações de sua presença foram percebidas. Ela estava por perto e a qualquer momento poderia aparecer.

A gruta da serra do Canine fora morada de homens pré-históricos. Lá se encontram vários desenhos rupestres que falam da vida de seus antigos moradores. Ubaldo logo se recuperou dos ferimentos. A presença da mulher lobisomem era sentida, mas, nada dela aparecer. Havia momentos em que Ubaldo achava que ia se encontrar com a estranha e misteriosa criatura, mas, nada dela aparecer. Ubaldo ficou por um mês na gruta. De lá não saiu, pois, as buscas da polícia estavam ainda mais fortes. Helicópteros, soldados, e populares se espalhavam por toda a vastidão do sertão de Tobias Barreto. As pessoas amedrontadas permaneciam enclausuradas em casa na esperança de tudo isso acabar. Aníbal e Plínio pediam ajuda a população no intuito de colher informações sobre o paradeiro de Ubaldo. Ninguém sabia de nada ninguém viu nada.

Numa segunda feira de lua cheia, a presença da mulher lobisomem estava muito forte. Ubaldo sai da gruta e decide uivar para a lua cheia. A proporção em que ele uiva uma jurema que ficava bem na entrada da gruta se contorce toda. O tronco assume a forma do corpo de uma mulher e de repente sai daquele tronco uma dama linda totalmente despida e caminha na direção do moço Ubaldo que atônito e em pé observa o fenômeno. A mulher diz: “Desculpe a demora”. Os dois fazem amor por horas. Para o jovem Ubaldo aquela era a noite mais feliz de sua vida. A mulher lobisomem podia se transformar no que ela quisesse, e ele, Ubaldo, também. Os dois se sentaram sobre uma pedra no alto da serra e uivam juntos para a lua cheia; era uma verdadeira matilha de lobisomens. Ubaldo e a moça proseiam:

- Eu avisei a você que você podia muita coisa. Você é um encantado. O povo do sertão encantou você com suas memórias. Você representa um grande tipo do imaginário brasileiro. Você é um licantropo do bem. Disse a mulher lobisomem com sua voz mansa e bem colocada.

- Mas, as pessoas querem, na verdade, é me matar. A cidade de Campos quer a minha cabeça por algo que eu não fiz. Eu não faço a menor ideia do paradeiro dessas pessoas sumidas. Se estão vivas ou mortas.

- Se você se concentrar você vai achar essas pessoas. Nosso faro é o pensamento. Pelo pensamento podemos encontrar pessoas e saber o que elas pretendem. Somente evite o contato com a prata. A prata e a água benta causam danos ao nosso corpo.  Podem até nos matar. Você já percebeu que você pode se transportar pelo pensamento?

- Não.

- Então pense em ir ao Cancelão. Ubaldo fechou os olhos e pensou na praça do Cancelão. De imediato ele se transportou até a praça do Cancelão. As pessoas que estavam na praça viram Ubaldo e começaram a gritar. Um destacamento da polícia que estava lá o viu e começaram a atirar. Ubaldo se transporta de volta ao alto da serra. No alto da serra a mulher lobisomem cospe na sua boca e desaparece numa tocha de fogo. Agora Ubaldo sabia de seus poderes, então, podia resolver o mistério das pessoas desaparecidas.

 

Enquanto isso ocorre, em Tobias Barreto, a polícia revista casa por casa. As pessoas não gostaram e reclamaram ao prefeito:

- Mas isso é um absurdo. Reclamou Osvaldo proprietário de padaria.

- Não, não pode ser. O senhor prefeito está sem autoridade sobre a cidade que governa. Reclamou seu Bigode dono de um abatedouro de frango.

- Isso é o fim do mundo e a volta de Cristo. Disse Genivalda do abrigo dos velhos. A reclamação maior foi de Agenor, o vidente de Campos: Campos está cega. Deixa um aventureiro criar pânico na cidade com um problema que não será resolvido por ele. Mas um homem encantado dará fim a tudo isso. Esse prefeito é um incompetente.

Um casal namorava no interior de um carro na ponte do Tourão. O rapaz era muito cabeludo. A polícia o confundiu com o lobisomem e passou fogo. A moça foi atingida no braço e o rapaz morreu. Isso causou revolta em Campos e fez o povo ir para as ruas. A sociedade de Campos, hoje, Tobias Barreto tomou coragem e foi protestar em frente à prefeitura. Um grupo gritava defronte a delegacia e outro na sede da prefeitura: “Deixem Campos em paz”. Aníbal vendo o tumulto decidiu chamar a polícia de caatinga. Dizem que esses policiais são extremamente preparados para matar. A cidade de Campos ficou cercada de policiais. O povo não podia mais vender a muamba, o comercio parou o contrabando. A economia de Campos estava em colapso.  

Ubaldo se concentra nas pessoas desaparecidas. Em sua vidência ele ver um casarão velho no conjunto Irmã Dulce. O casarão tinha janelões abertos e era muito espaçoso. Ubaldo se transporta até lá. O lobisomem de Tobias Barreto entra na casa sinistra e encontra em um cômodo escuro a carcaça de três corpos. Certamente eram os corpos das pessoas desaparecidas. O mal cheiro era muito forte. No porão da casa Ubaldo encontrou centena de ovos grandes. Pareciam ovos de avestruz. Era na verdade aquele lugar um ninho. Os ovos estavam lá e sobre eles no telhado, de cabeça para baixo estava uma dezena de seres estranhos. Eram morcegos com cara de homens. Eles estavam a dormir. Os homens morcegos reproduziam por meio de ovos e isso era muito estranho. As criaturas exalavam um cheiro de enxofre misturado com fezes. Ubaldo não sabia o que fazer nem como matar as criaturas.

Tobias estava de cabeça para baixo e a noite se aproximava. O povo jogava pedras na polícia e gritava palavras de ordem: “O povo unido jamais será vencido”. “Queremos Aníbal fora da cidade”. A polícia da caatinga realizou diversas prisões. Eram pessoas cabeludas e peludas que pareciam com o lobisomem.

Ubaldo se transporta para casa dos pais. Os velhos receberam o filho com alegria. Ubaldo conta para eles que havia uma força tenebrosa sobre Campos e que eles precisavam permanecer trancados em casa. Ubaldo aguarda a noite chegar na casa de seus genitores. Finalmente a família estava reunida. Ubaldo conta a história da mulher lobisomem e como ela lhe explicou sobre seus poderes e que ele podia usá-los para salvar Tobias Barreto.

A noite chega a campos. A Rádio toca a Ave Maria. As coisas se acalmam um pouco. As pessoas saem das ruas e o clima fica menos tenso. Ubaldo retorna ao casarão para espionar. Os homens morcegos estavam agitados e emitiam um zumbido que doía os ouvidos. Um a um sai da casa. Era a hora da caça. Parecia que desta feita eles queriam caçar em grupos. Ubaldo acompanha os morcegos a uma certa distância. Eles sobrevoam a cidade a uma altura de trintas metros. Fazem voos rasantes e outros mais altos. Cada um seguia sua trajetória circular sobre determinado ponto da cidade. Contudo, as ruas estavam vazias. O povo havia parado os protestos.  Isso durou cerca de uma hora. Por volta de sete e meia da noite eles formam uma nuvem sobre a praça do cruzeiro. A nuvem se move em círculo. De repente, os morcegos invadem as casas e capturam as pessoas e arrastam para fora. Suas garras e dentes eram poderosas. As pessoas estavam morrendo em Campos. Ubaldo sem saber o que fazer para parar o ataque mentaliza a mulher misteriosa, contudo ela não aparece. A polícia inicia o tiroteio. As armas são apontadas para as criaturas. Aníbal e Plínio lideram o ataque que parece não surtir muito efeito pois as criaturas atingidas pelos projeteis caiam e depois se levantavam. Ubaldo se concentra e se transforma numa tocha de fogo, e a luta com os morcegos inicia. Campos ver aquela tocha de fogo no céu lutando por seus filhos. As pessoas pensavam que era Nossa Senhora Imperatriz que havia descido para salvar seu povo.

Os morcegos cercam Ubaldo e começam a cuspir nele uma gosma ácida, mas, para sorte de Ubaldo o veneno não o atingiu. A luta demora horas e finalmente os morcegos se retiram da cidade e retornam ao ninho. Ubaldo persegue os morcegos até o ninho. Os morcegos aguardam Ubaldo chegar. Eles cercam os ovos e fazem frente a Ubaldo mais uma vez. Ubaldo é atingido por um esporão. Os morcegos tinham esporões entre os dedos das mãos. Ubaldo cai e se transforma em homem. Os morcegos partem para cima de Ubaldo se aproveitando que ele estava na forma de homem. Ubaldo é ferido mais uma vez. De repente, um clarão surge no céu. Os morcegos se afastam de Ubaldo que imóvel está estendido no chão. O clarão fica mais intenso. Era a mulher lobisomem. Os morcegos se escondem no casarão com medo da mulher e no intuito de proteger os ovos. Ubaldo é socorrido pela mulher que cospe na sua boca uma baba lilás. Em seguida Ubaldo se levanta restabelecido. Os dois trocam um dedo de prosa:

- O que vamos fazer para destruir estas criaturas?

- Use seus poderes. Disse a mulher lobisomem

- Vamos fazer juntos. Os dois se unem. Se abraçam e juntos se transformam numa bola de energia que aos poucos vai provocando uma ventania que se transforma numa tormenta. Os morcegos são banidos juntamente com seus ovos para o mundo astral. A cidade de Campos estava finalmente livre das criaturas horrendas. A mulher lobisomem some com a ventania. Somente Ubaldo permanece no lugar.

Ubaldo volta a casa dos pais que em oração o aguardava. Agora, certamente, a cidade de Campos não iria mais importuna-lo. Ubaldo era um verdadeiro herói.

A cidade de Tobias Barreto volta a sua rotina de sempre. Aníbal e Plínio recebem comendas pelo serviço prestado e Ubaldo volta a fazer shows na praça do cruzeiro. Nunca mais se ouviu falar de pessoas desaparecidas nem de morcegos gigantes. Campos, ou Tobias Barreto retorna a sua lucrativa atividade que é vender suas muambas...

 

 

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