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Artigos-->Literatura erótica, falso moralismo e sexo sem culpa -- 21/06/2001 - 23:13 (Maria José Limeira Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Literatura erótica, falso moralismo e sexo sem culpa







Idealismo patriarcal. O poder absoluto do Patriarca, encarnando todos os valores sociais da época... Isto é coisa do passado? Pode-se dizer que sim. Mas tão viva como antes...



Parece que esta é a questão principal da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, publicada pelas Editoras Antígona e Frenesi, com seleção, prefácio e notas de Natália Correia.



O que tem a ver Poesia com poder patriarcal e sexo com ou sem culpa?



Tudo a ver, se nos debruçarmos sobre a História, acompanhando, à luz dos textos poéticos, o desenrolar do princípio do prazer, desde os primórdios dos agrupamentos humanos até a Revolução Sexual dos Anos 60.



A citada Antologia, cuja primeira edição data de 1965, chocou o pensamento oficial da Ditadura de Salazar, quando a autora sofreu sanções e a obra foi considerada maldita...



Pretendia-se esmagar o andamento da Revolução Sexual que explodia no mundo, e manter o país intacto quanto aos princípios da Ditadura Militar, em plena realização...



Diga-se de passagem, porém, que o estudo introduzido pela poetisa Natália Correia, na Antologia, está muito longe de satisfazer a curiosidade popular sobre o assunto.



Neste ponto, os poemas eróticos de vários autores, com indicações de suas biografias dizem muito mais.



A linguagem da autora é densa e fechada. A exposição acadêmica restringe a compreensão do texto a uma minoria.



A história do Eros na Literatura registra a contingência de mulheres e homens em relacionamento amoroso, condicionados a regras sociais de cada época.



A mulher, musa inspiradora de todos os poetas através do tempo, exercendo sua atividade de sacerdotisa, foi considerada no Olimpo homérico o símbolo da maternidade, condição que a ligava aos ritos telúricos. Embora que seu estado tenha sido rebaixado à autoridade de Zeus...



O Cristianismo Patriarcal derrubou-a desse pedestal ao condenar as práticas telúricas, considerando-as manifestações demoníacas. Mulher encarnava, a partir daí, a idéia do pecado.



Igreja e Estado uniram-se em defesa da separação dos poderes físicos e espirituais, condenando aqueles às trevas e trazendo o espírito à luz.



O Eros foi banido da convivência social, e até perseguido, sujeito a castigos e às leis da Santa Inquisição... O braço armado do poder político abatia, por extensão, toda e qualquer manifestação contrária à manutenção do status quo.



Como conviviam os textos poéticos com esta circunstância, quando o gozo sexual era proibido até entre casais unidos oficialmente pelos laços matrimoniais, e as uniões carnais só podiam se realizar em alguns dias da semana estipulados pela Santa Madre Igreja?



Os poetas passaram a venerar as Damas Angelicais e execravam as prostitutas que lhes davam prazer sexual...



Era a dualidade Bocaccio/Petrarca, “conflito que intoxicou até aos nossos dias a psicologia ocidental, simbolizado finalmente no Satanismo e Angelicismo baudelairianos, encarnados na megera libertina (Jane Duval) e na mulher do olhar divino (Madame Sabatier)”, diz Natália Correia.



A Igreja estruturava sua hierarquia em cima da repressão sexual, representando “o sustentáculo espiritual do patriarquismo despótico do Estado”.



Mas, os ventos mudaram de direção. O poder dos reis tremia nas bases. Uma nova mentalidade acompanhava as revoluções que se processavam nas relações econômicas e sociais no mundo.



Começou o embate da luz contra a escuridão. A bandeira da liberdade tremulava.



O Eros reintegrou-se, e a libertinagem tomou conta dos textos.



“Se a Igreja estruturara sua hierarquia sobre a repressão dos instintos – diz Natália Correia – era este o ponto vulnerável para a revolução mental do Século XVIII, cuja doutrina genialmente exposta por Sade abriu caminho à Dialética, à Psicanálise e à Síntese Surrealista, foi assim constrangido a admitir e a racionalizar os instintos”.



Os direitos da natureza se batiam contra as normas antinaturais da religião, e o verbo libertário de Bocage ecoava de canto a canto, como representante dessa nova ordem.



Desenham-se as primeiras sombras da hostilidade sexual entre homens e mulheres...



Pelo menos em tese, a supremacia do macho sobre a fêmea estava com os dias contados...



O homem que até então considerava a mulher-prostituta como objeto de prazer e a senhora-esposa como simples receptáculo de esperma para fins de reprodução, encontrava, na nova ordem, uma pessoa como ele, reivindicando direitos iguais... na cama, e na produção poética...



“Deste sobressalto nasce uma nova erótica, uma outra noção de sublimidade do amor que reconhece e glorifica a mulher como potência sexual, celebrando a comunhão fisiológica como símbolo da humanidade integral, e o corpo feminino como imagem ativa do espírito divino, ao qual o homem se une pelo êxtase carnal”. (Soloviev, em A Verdade do Amor).



Mas foi o Surrealismo quem reabilitou e regenerou o Eros mutilado pela divisão Anjo-Demônio. O corpo da mulher ressuscitou livre da idéia de pecado que a subjugara nas trevas da Idade Média.



“Libertando a erótica romântica das impregnações do culto do Eros celeste que perturbava a sua fundamental aspiração à sublimidade da fusão do espírito e da carne, o Surrealismo abriu à Moderna Poesia a via luminosa do amor sem culpa, dentro do qual a fulguração carnal da mulher retoma o brilho mágico primordial, pois que a vida justificada pelo amor a reconhece como ponto central do seu círculo”. (Natália Correia).



Mas o Idealismo Patriarcal ainda atravessa o Século XX e se faz sentir na obra de Jean Genet, escritor maldito que se auto-proclama satanista, sem se despir da roupa de Santo que a velha teoria lhe impôs. E nisto se iguala aos seus antepassados adeptos do Cristianismo Patriarcal. O filósofo Jean-Paul Sartre chamava Genet de Santo...



O livro inclui poemas e biografias dos seguintes autores, entre outros: Martim Soares, Pero da Ponte, João Garcia de Guilhade, Gil Vicente, Luís de Camões, Fernando Pessoa, Gregório de Matos, Guerra Junqueiro, José Régio, Leonor de Almeida, Jorge de Sena, Ana Harthetly, Maria Teresa Horta, Herberto Helder, e mais alguns poemas anônimos dos Séculos XVII, XVIII e XIX.



Em homenagem à autora, pela coragem de publicar sua pesquisa em 1965, em condições adversas, os editores incluíram na Antologia um poema erótico de Natália Correia, na 3a. edição, publicada em Lisboa, em 1999.



Natália Correia nasceu em 1923, na Ilha de São Miguel (Açores), e faleceu em 1993. Mudou-se ainda criança para Lisboa. Foi Deputada pelo Partido Social-Democrata.



Publicou teatro, ensaios, romances, memórias de viagens, e os seguintes livros de Poesia: Poemas (1954), Dimensão encontrada (1957), Passaporte (1958), Comunicação (1960) e Cântico do país emerso (1961). Sua extensa obra literária foi traduzida em vários idiomas.



Eis o Poema de sua autoria incluído da Antologia:











COSMOCÓPULA



Natália Correia







I



Membro a pino



dia é macho



submarino



é entre coxas



teu mergulho



vício de ostras.







II



O corpo é praia a boca é a nascente



e é na vulva que a areia é mais sedenta



poro a poro vou sentindo o curso de água



da tua língua demasiada e lenta



dentes e unhas rebentam como pinhas



de carnívoras plantas te é meu ventre



abro-te as coxas e deixo-te crescer



duro e cheiroso como o aloendro.







(Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica – Seleção, prefácio e notas de Natalia Correia, Ed. Antígona/Frenesi, 3a. Edição, 2ª. Tiragem. Lisboa, 1999).











Maria José Limeira é escritora e jornalista de João
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