O objetivo da escola não é a formação, mas a seleção. Ao que parece, a aprendizagem do alfabeto
nos capacita para a seleção. Aprendem-se, sobretudo, as dificuldades de um idioma, porque são testáveis.
A escola, em absoluto, não quer ensinar um idioma. Quer, isto sim, torná-lo testável. "Eu, por exemplo, conheço todas as dificuldades da língua francesa, e mal consigo formular uma frase."
A invenção de uma palavra: LEGASTENIA, incluiu os problemas com a língua escrita no rol das doenças, se bem que curáveis.
Mas, sendo curável, porque não curá-la? Porque não erradicá-la, em definitivo, como se faz com as outras doenças curáveis? Por que não uma profilaxia?
Não se está interessado no uso da língua escrita, mas nos conhecimentos gerais sobre a escrita.
O uso não é passível de controle, não é testável.
O professor aceitou a escrita daquele aluno canhoto, estabelecendo uma distinção entre a ortografia e o conteúdo. Nesse momento luminoso de um professor de redação nascia o escritor suíço Peter Bichsel.
Hoje, como escritor, os problemas do aluno como que desapareceram, mas não por obra de algum empenho profilático por parte das autoridades competentes. É o próprio Bichsel quem relata: "Passaram a ser tratados como erros de impressão."
[Anotações de leitura de um texto de Peter Bichsel. É o primeiro dos cinco ensaios que compõem o livro "Frankfurter Poetikvorlesungen" (Aulas de poética em Frankfurt). Foram cinco aulas ministradas, em 1981, naquela cidade. Algo semelhante às conferências Norton, nas quais Calvino proferiu as suas "Seis propostas para o próximo milênio".]
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