O Estado de S. Paulo
1 de junho de 2012
RECATO NO SUPREMO
Excessos cometidos por ministros do STF nos últimos dias, após encontro de
Lula com Gilmar, vêm confirmar a deterioração de padrões
O Supremo Tribunal Federal se compõe de 11 ministros, escolhidos entre cidadãos
de notável saber jurídico -e reputação ilibada. Assim exige a Constituição.
Não há honra maior, para um jurista, que ser escolhido para integrar esse corpo de
guardiões da Carta. O preço que lhes cabe por tal distinção é manter sem mancha o
renome com que ali chegaram, pois de seu comportamento como ministros passa a
nutrir-se o prestígio da própria corte.
É lamentável constatar que, ao longo da última década, o zelo para com essa
obrigação vem decaindo paulatinamente. Nas últimas semanas, acentuou-se o
descaso até o ponto de suscitar alarme.
E não se trata só do efeito das palavras e narrativas impensadas que emergiram
nestes dias conturbados, com as entrevistas ocasionadas pelo encontro que o
ministro Gilmar Mendes aceitou realizar com Luiz Inácio Lula da Silva no escritório de
Nelson Jobim -três ex-presidentes, ressalte-se, um da República e dois do Supremo.
Muito já se falou e escreveu sobre a impropriedade da reunião. Impropriedade
evidente, em face da conjuntura politicamente aquecida pela vizinhança da CPI do
caso Cachoeira, centrada na figura de um senador com que o ministro Gilmar
mantinha relacionamento próximo o bastante para aceitar caronas de avião. E,
também, do julgamento, pelo STF, do mensalão, na negação do qual Lula concentra
sua atividade de ex-presidente (embora em reunião ministerial de 12 de agosto de
2005 tenha pedido desculpas pelo que então chamava de "práticas inaceitáveis").
Erraram Gilmar, Jobim e Lula, concluíram muitos. Mais que repetir o que está claro
como o dia, cabe destacar que o padrão de excessos verbais e de comportamento
não é novo. Há coisa de um mês, o ministro Cezar Peluso, que deixava a presidência
do STF, criticou o colega Joaquim Barbosa em entrevista; este retorquiu, também
pela imprensa, com adjetivos como "caipira", "tirano" e "corporativo".
O STF já exibiu até bate-bocas em plenário. Em pelo menos duas ocasiões (2007 e
2009), altercaram-se os ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes. Há quem veja
aí o produto da combinação de personalidades ególatras com a transmissão de
sessões pela TV Justiça.
A transparência dos trabalhos do STF, no entanto, é algo que veio para ficar. Não é
ela que precisa ser contida, mas os impulsos e costumes dos próprios ministros.
Recomenda-se começar com algumas regras básicas: não se pronunciar sobre casos
por julgar; restringir contatos com políticos a cerimônias públicas; receber partes e
advogados só no recinto do STF, com divulgação prévia da agenda.
Entre as prerrogativas dos ministros, em sua independência, não está a de macular a
reputação da corte a que servem. |