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Artigos-->Onisciência ou Livre Arbítrio ? -- 26/07/2003 - 01:35 (Tiago Xavier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Algumas lembranças do tempo de menino são jogadas, atualmente, do inconsciente para o consciente de maneira espasmódica. Lembro de quando morava num condomínio na zona sul de São Paulo. O prédio em que estava localizado meu apartamento era um dos últimos do condomínio, ou seja, na base da ladeira. Sim, o condomínio era uma ladeira. No topo ficava a portaria e, a medida em que se ia descendo pela rua principal, ia se encontrando os prédios dispostos e enfileirados.

Todo dia eu reclamava de ir a escola. Aquela ladeira maldita me desanimava e eu não entendia o motivo dos meus pais terem comprado um apartamento naquele lugar inóspito. Numa noite de insônia, pude observar meu pai saindo para o trabalho. Ele subia a ladeira de carro.

Minhas reclamações não eram aprovadas pela minha mãe, que dizia ser a escola a base de um futuro promissor. Desdobrava-me, argumentava e contextualizava a subida da ladeira. De nada adiantava a força argumentativa diante daquela sandália havaiana calibre 35/36 em punho da minha querida genitora. E lá estava eu, dia após dia, subindo a ladeira a caminho da escola. Diferentemente do que pensava minha mãe, eu gostava de ir às aulas. Não gostava era de percorrer o caminho.

Até os dias de hoje, a preguiça sempre foi presente em tudo o que faço. Ela é a mãe de todos os pecados. Como toda mãe, a preguiça também merece respeito.

Naquela época eu estudava em colégio católico. Lembro-me das tardes no Colégio São Francisco de Assis. Tínhamos aulas de ensino religioso, o que sempre me foi inútil, apesar de, na inocência de minha infância, acreditar em Deus.

Mas foi nesta mesma inocência que tive minha primeira briga com o Divino. Eram os últimos dias de aula daquele ano, e como atividade, a tia Gertrudes mandou que cada um fizesse um presépio, usando apenas cartolina, cola e tesoura. No dia anterior a estas atividades, já sabendo o que iria ser feito em sala, eu pedi à minha mãe que comprasse cartolinas, de várias cores. Lembro-me de ter ganho um prêmio, que era um pacote com balas de hortelã, que tia Gertrudes oferecera ao presépio mais detalhado. Eu era aplicado. Estudara cada detalhe do episódio do nascimento de Cristo antes da aula, com a ajuda das enciclopédias que haviam sido dadas pelo meu avô materno.

Saindo do colégio, dividi as balas do prêmio com alguns amigos e me coloquei a caminho de casa. Estava ansioso para chegar e mostrar a "obra-prima" para a minha mãe. Desci a ladeira correndo feito um louco.

Mas ladeira íngreme e criança correndo não combinam. Caí sobre o presépio, que ficou sujo e amassado, assim como minha roupa. Meu queixo ralado respingava sangue pela camiseta branca do uniforme. Cheguei em casa e apanhei da minha mãe, aos berros de "quantas vezes eu já disse pra você não descer a ladeira correndo".

Chorando, fui até o meu quarto e coloquei o presépio amassado sobre a escrivaninha. Olhava para os três reis magos, um deles com a cabeça amassada, enquanto crescia uma ira enorme, insustentável. Como Deus podia deixar aquilo acontecer, depois de tanta dedicação?

Lembro-me de ter destruído o presépio e jogá-lo pela janela. Aproveitei e olhei para o céu, pendurado ao parapeito:



- Tô de mal... . Humpt.



E fui dormir.



A partir daquele dia, e das leituras que me foram sendo apresentadas no decorrer dos meus vinte e um aninhos, deixei de acreditar num ser superior. Mesmo porque vejo esse deus bíblico como um grande tirano. O próprio Santo Agostinho, filósofo católico, diz que não há o livre arbítrio descrito na Bíblia, e sim, a onisciência de Deus. O que isso quer dizer?

É bom salientar que eu não acredito em deus algum. Na minha concepção, Ele é como Papai Noel, Os Duendes e o Coelhinho da Páscoa.

Deus, antes de fazer este mundo maluco em que vivemos, em sua onisciência, já sabia que esta crônica estaria sendo feita e que você a estaria lendo neste momento. Sendo Assim, tudo está predestinado por "aquele que tudo pode". Livre arbítrio não existe, pois seus direito de escolha já foram eliminados no momento da concepção do mundo. Se Deus já sabia de tudo antes mesmo da existência, por que foi que resolveu dar início a criação, sabendo que ia dar nisso? Como disse Vinícius de Morais, "Aí pergunto a Deus, escute amigo? Se foi pra desfazer, por que é que fez?".

Deus sabia que Adão comeria do fruto, da queda de Roma, da feudalização da Europa, das pestes que assolaram o mundo, da modernidade, das duas grandes guerras, da bipolaridade e multipolaridade mundial e do neo-imperialismo norte americano antes, muito antes de criar a primeira estrela. E sabe tudo sobre o destino da Terra, das pessoas que ainda vão morrer de fome, das injustiças sociais. Ele sabia da merda que ia dar, e mesmo assim, fez a porra toda acontecer. Deus é tirano e o homem é como um daqueles bonequinhos playmobil em suas mãos.



- Tiago, faça-me o favor. Apague essas linhas. Não sou nenhum tirano.

- Opa. De onde vem essa voz?

- Sou eu Tiago. O criador.

- Tá bom, eu sou o chapeuzinho vermelho. Seja quem for, é melhor parar com esta brincadeira. Estou ocupado agora.

- Apague estas linhas, estou lhe dizendo. Não sou nenhum tirano.

- Como não? Não posso nem escrever o que quero. Não apago linha nenhuma. A crônica é minha. Faça a sua, como direito de resposta.

- Não sei escrever. Por que acha que a bíblia foi escrita por apóstolos?

- Sei lá. Disseram-me que você escreve certo por linhas tortas. A leitura ia ficar prejudicada.

- Piadinha infame.

- Desculpe, não agüentei. Mas e a sua onipotência? Como não sabe escrever?

- A escrita foi sempre minha dificuldade. Nunca precisei escrever por saber de tudo. Nunca precisei fazer anotações, pois tenho tudo na memória.

- Ta explicado...

- Mas não sou nenhum tirano, nenhum ditador. Apague essas linhas.

- Então me explica essa coisa do livre arbítrio?

- Você está certo, não existe livre arbítrio.

- E então? Como diz que não é um ditador?

- E não sou. Vocês homens se julgam muito importantes. É o cúmulo. O planeta Terra é meu brinquedinho pessoal. Preciso me divertir de vez em quando. Tenho muito trabalho em planetas que criei seriamente, onde existe igualdade entre os indivíduos. Estes planetas têm vinte e sete vezes o tamanho da Terra. Criei vocês pra brincar nas horas vagas. Vocês são o meu Reality Show.

- Você é muito irônico mesmo. Diz-me quando o império americano vai cair e qual será a nova nação dominante. Dá pra ganhar dinheiro com essa informação.

- Não digo nada. Vocês querem tudo na mão, é incrível. Chegam a ser um brinquedinho enjoativo, de tão previsíveis. Mas tem momentos muito engraçados.

-Exemplifique.

- Quando estão transando, na hora do orgasmo. Ficam com uma fisionomia hilária. Pensam que isso é que é prazer, não sabem o que é prazer de verdade.

- Existe coisa melhor que sexo?

- Sexo é masturbação perto dos prazeres dos planetas reais.

- Não somos reais?

- Claro que não. Já lhe disse que são meus brinquedinhos. Você fez uma bela comparação, com os bonequinhos Playmobil.

- Obrigado Senhor.

- Por nada.

- Deus. Me fala uma coisa?

- Diga.

- Adão tinha umbigo?

- Como?

- Quero saber se Adão tinha umbigo? Essa pergunta me persegue desde os tempos de infância.



Deus não respondeu, mas provou que não está nem aí para o mundo. Somos os Big Brothers da criação divina. Provou-me também que existe. Sua existência apenas se concretiza pelo fato de muita gente acreditar. Pois Deus é como nossos sonhos. Quando não se acredita neles, aí sim, eles deixam de existir...







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