A CUT TENTA INTIMIDAR O STF
Editorial de O Estado de S. Paulo - 11/7/2012
Não engana a ninguém o recuo do presidente da Central Única dos Trabalhadores
(CUT), Vagner Freitas, prestes a ser empossado, da sua estrepitosa ameaça ao
Supremo Tribunal Federal (STF), a propósito do mensalão. "Não pode ser um
julgamento político. Se isso ocorrer, nós questionaremos, iremos para as ruas",
afirmou, segundo a Folha de S.Paulo de segunda-feira. Estampado o desafio e
decerto repreendido por algum grão-mensaleiro, alertado por sua vez pelos seus
advogados, Freitas deu uma aparente guinada. "Não temos dúvida nenhuma de que
teremos um julgamento técnico", entoou, magnânimo, aproveitando para cobrir o
Supremo de elogios. "Era isso o que eu gostaria de ter dito."
Faltou combinar com o ainda titular da central, Artur Henrique Santos. Em discurso no
11.º congresso da entidade que ele chamou, sem corar, de "independente e
autônoma" - mas no qual as estrelas da festa eram os réus "companheiros" José
Dirceu, o ex-ministro de Lula, e Delúbio Soares, o ex-tesoureiro do PT, além do
candidato petista à Prefeitura paulistana, Fernando Haddad -, Henrique fez um
paralelo entre a denúncia do mensalão e o afastamento do presidente paraguaio
Fernando Lugo. Fiel à versão de Lula para o escândalo, devidamente adotada pelo
PT, o sindicalista disse que o impeachment de Lugo "foi o que tentaram fazer neste
país em 2005", com a revelação, a seu ver fabricada, do esquema da compra de
votos de deputados em benefício do governo petista.
Até aí, nada de mais. Faz tempo que jaz em camadas profundas o perdão que Lula
pediu aos brasileiros, no momento de fraqueza em que também se declarou traído. O
ponto é que, enquanto o bancário Vagner Freitas fingia abafar o repto ao STF, o
eletricitário Artur Henrique o inchava. Fazendo praça do fato sabido de que a CUT
toma partido na política, embora, como as congêneres, seja subsidiada pelo imposto
sindical - todas poupadas por Lula de prestar contas dos milhões embolsados -,
Henrique avisou que a organização sairá às ruas "para impedir o retrocesso e a volta
da direita". Ele se referia às próximas eleições municipais, mas não seria necessário
ostentar a credencial de "petista histórico", como diz a companheirada, para entender
que o objeto oculto da falação era o Supremo.
O silogismo é elementar: se o desvendamento do mensalão foi uma tentativa de
golpe, o mesmo vale para as suas consequências: a peça do procurador-geral da
República, acolhida pela Corte, expondo, um a um, os membros da "sofisticada
organização criminosa" responsável pela lambança, e as eventuais condenações dos
réus petistas, a começar do ex-presidente da sigla José Dirceu. Veredictos "técnicos",
como disse Freitas na sua falsa retratação, serão os que absolverem os mensaleiros.
Sentenças condenatórias serão necessariamente políticas, golpistas - merecedoras,
antes até que se consumam, da justa ira do "povo trabalhador", como Lula gosta de
dizer.
Mas de que "golpe" se trata? Excluída, por insana, a derrubada da presidente Dilma
Rousseff, será a possível eleição do tucano José Serra em São Paulo? Ou a reeleição
do aecista Márcio Lacerda em Belo Horizonte? Assim como os terrores de que
padecem os paranoicos, a teoria conspiratória cutista tem um fundo de verdade.
Perdas eleitorais importantes para o PT este ano - que a sigla tratará de atribuir ao
julgamento no STF - poderiam ter efeitos adversos para a reeleição de Dilma, apesar
dos seus estelares índices de popularidade. O destino pessoal da presidente por
quem a CUT morre cada vez menos de amores é, em si, secundário. O desejo cutista
que não ousa dizer o nome é a candidatura Lula já em 2014. Nada deve pôr em risco
a perpetuação no poder da sigla de que emana.
A soberba, como se sabe, cega. A truculência também. Imaginam os dirigentes da
CUT que o Supremo se deixará intimidar por seus arreganhos? Ou que a organização
tem meios de criar no País um clima de convulsão capaz de "melar" o julgamento que
tanto temem? Em outras palavras, por quem se tomam? Mas, no seu primarismo, as
investidas do pelegato petista servem para lembrar à opinião pública a medida do seu
entranhado autoritarismo e de sua aversão à democracia.
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