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cronicas-->TRADIÇÕES, CONTRADIÇÕES (54) -- 27/01/2013 - 19:34 (Walter da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
TRADIÇÕES, CONTRADIÇÕES (54)

KISS, o beijo da morte. Essa poderia ser a manchete de algum editor nalgum jornal brasileiro. A notícia me apanhou ainda acordando quando começo a ouvir a CBN, a exemplo de todas as manhãs. Centenas de jovens com uma idade média de dezoito anos, adolescentes, saltitantes, cheios do joie-de-vivre, mortos por asfixia numa discoteca. Essa coisa funciona como uma bomba-relógio, pronta para explodir. O espaço, por maior que seja, não oferece a segurança exigida pelas normas de engenharia de segurança. Maior do que ele é a ganància pelo lucro exponencialmente multiplicado por uma clientela que em sua maioria, bebe refrigerante. Ou estou equivocado? Na minha juventude, porém muito depois da adolescência, eu também frequentei alguns naiteclubes da moda, nos subúrbios da zona sul do Recife. Com muito mais para me ocupar, jamais observei se as paredes portavam algum extintor de incêndio, alguma portaria municipal ou similares. O que importava era sorver alguns bons tragos de Hollywood em combinação com um escuro cuba-libre, a bebida então na moda. Hoje, com uma população teenager bem maior, a rapaziada quer mesmo balançar o esqueleto. Na mídia, através de um especialista em segurança, os cálculos que perfazem regras, são simples, mas jamais levados em conta.
As portas de emergência, a contraexemplo das da aviação, não são observadas com facilidade, nem ninguém recebe qualquer instrução na entrada. O adolescente está mesmo a fim das minas ou dos gatinhos, pois não se pode desperdiçar nenhum minuto nessa idade maravilhosamente dourada. Fui algumas vezes conduzir ou trazer de volta à casa, meus adolescentes filiais, nas discotecas do bairro das Graças. E me lembro bem que a hora de voltar era a pior, ora para os genitores, ora para a moçada pingando de suor, no auge de seu tenro contentamento. Jamais em minha vida de pai de aborrescentes, teria passado na cabeça, meio cenário que visualizei na tevê. São cenas chocantes, desesperadoras. Ademais, ninguém, no auge de sua extrema felicidade, estaria a par de qualquer tipo de tragédia, em contrafação. Não seria humano. E agora tudo era verdadeiro, cruel, apavorante. Pais e mães que buscam por notícia de filhos e filhas desaparecidos. Irmãos e parentes que vão à cata dos amigos que, doze horas antes, ajudavam na maquiagem e na escolha correta da indumentária. Porque sabe-se bem, quando estamos na Universidade e somos verdes demais, esse tal futuro pouco importa, está mais distante do que nossa intensa vontade de vivenciar cada momento.
De minha parte, ainda que já tenha me deparado com cenas absolutamente inefáveis, não sei como agiria num momento desses. O pànico é uma situação de extremos limites. Por mais que todos e cada um o estejam vivenciando, a semelhança com um pesadelo talvez seja ainda muito pouco, pouquíssimo. Certa vez, durante meu trabalho de professor, na rua do Hospício, parei a aula porque alguém gritava lá fora que a barragem de Tapacurá havia se rompido. Lembro-me que, encerrando a aula, corri para o pátio da velha Escola de Engenharia e avistei uma desenfreada correria de gente assustada, se esbarrando e tentando se salvar de uma tragédia ilusória. Minha única atitude naquele momento, ao saber que a Avenida Conde de Boa Vista estava sendo palco de um desfile de horrorizados, foi correr para o carro. Imaginei, por que não ligar o rádio e ouvir o noticiário? E o fiz. O pànico fora causado por uma falsa notícia. Imagine contudo, você em casa, pai de filhos jovens, receber um telefonema altas horas, informando "parece que a boate "Kiss" está ardendo em chamas". Imaginou? Logo você que conduziu dois filhos e uma amiga deles. Tudo pode acontecer, inclusive nada. Esta é uma frase bonitinha, mas ordinária. Através da Globo News, ainda fiquei alguns minutos assistindo a uma tentativa do esforçado apresentador, falar com um sobrevivente por telefone. Mas nada, quase nada estava dando certo naquele contato. Havia muito "ruído" como se diz em teoria da comunicação. Eram médicos, delegados, chefe de bombeiros, transeuntes, todos querendo ouvir e ser ouvidos a fazer um diagnóstico do que ocorrera, sem dados suficientes para reduzir sua angústia.
As imagens lá continuavam, as mesmas. Vermelho-amarelado, as cores da fogueira. A bravura dos bombeiros de hábito, rompia paredes, cortava fios de iluminação e martelava tudo que fosse obstáculo. Madrugada de horror era o que o locutor da CBN repetiu algumas vezes. Num instituto de medicina legal improvisado, lá estavam sendo depositados corpos e mais corpos intatos, antes belos e joviais. Ali se expunha a última esperança a se expirar nos mais de duzentos cadáveres de rapazes e moças, que não conseguiram cumprir sua tarefa, sua derradeira missão de alegria e juventude eterna.
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Walter da Silva
Camaragibe-PE
27.01.2013
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