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Contos-->Assim Seja -- 09/04/2000 - 14:14 (Nilto Maciel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
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Mal pulava da cama, já os joelhos de Hélio se acomodavam ao frio do chão. A mulher, Selenita, dormida, resmungava advertências. Aquilo não havia de fazer bem. Pneumonia pegava um cristão pelo pé e só largava com reza de padre velho. As imprecações do tipo "me deixem em paz" ou "éguas paridas" saíam como ave-marias cheias de graças, dedos ligeiros ao redor das contas do terço. Os olhos do devoto, grudados de sono, miravam o Eterno pregado.
À mesa, para o café com pão, bolacha e não, persignava-se três vezes, em nome do Padre, do Filho e do Espirito Santo. E enchia a boca de fumaça e massa, faíscas a saltarem-lhe das pálpebras inchadas.
No banheiro, na sala, na rua, se ouvia o nome Deus, louvava a vida e bumbava o coração. Na semana não havia domingo sem missa nem preguiça. Dormia feito um porco, a pança a roncar debaixo do lençol, a santa baba da paz a escorrer-lhe pela papada.
Antes da difícil e lamentosa foda das noites sem sono, mordia a língua de pedir perdão, enfiava nos dedos as contas do rosário, tempos e tempos em penitência.
Nisso iam eras. A da bunda suja na antiga sesmaria. A das putarias com cabras e jumentas. A da ligação com Dona Selenita. A das noitadas nos cabarés. Ora, o pai deu ao solar dos Figueiras ares de igreja, a mãe morreu beata. Dos filhos destes só o Hermano Gentil deu para herege. Um se fez padre, outra madre.
Enterrados os velhos Figueiras, herdou o varão Hélio a boa herdade e seus hábitos de séculos: a cama de dormir e parturir, a alcova de sonhar e foder, a morada de viver e mandar, o rosário da obrigação e o rifle da devoção.
Chegada a era da praga, os mil gafanhotos do Egito se apossaram da plantação feito lavradores do cão. Pediu Selenita a proteção dos santos em comunhão. Ordenou nove novenas o dono do chão, da planta e da praga. Para cada semente, uma torrente de oração. E nem assim o tormento acabou.
Se nem Deus dava jeito na maldição, só o veneno podia salvar a situação. E mandou Hélio Figueira despejar inseticida no campo. Fulminados, os gafanhotos da perdição voaram para o inferno. Porém, desprevenidos, dois filhos do manda-chuva pararam de respirar.
Nos dias seguintes, os joelhos do devoto Figueira continuaram dobrados, os dedos ligeiros, os olhos bondosos, a boca balofa, a pança cheia de esperança. Amém.






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