Sou lagarta. Não lamurio meu destino. Arrasto-me sobre terra donde tudo veio e para onde tudo vai.
Enlameio meus membros inferiores que se misturam no caminhar lento e harmonioso. Compartilham um peso acrescido dia a dia.
Pouso com facilidade meus pequenos olhos, ocultos por uma aparência horrorosa, sobre folhas que irão garantir minha sobrevivência.
Observo-as como uma lupa e constato a beleza e diversidade com que foram concebidas.
É óbvio que tenho minhas preferências, se for ponderar sob o ponto de vista do paladar, porém, quando enfoco o sentido da visão: todas são magníficas!
Percebo o tatear de algumas sementes quando voejam sobre meu corpo antes de tombarem definitivamente no chão. Torço para que não caiam no asfalto, e sim, na terra em que piso. Torço para que se desmanchem em meio ao musgo e principiem uma nova vida.
Na estação em que conduzo meu corpo já pesado e com pele trocada, para que eu não estoure tal qual fogos de artifício, sinto o pulsar das raízes quando se aprofundam em busca de nutrientes.
Sou lagarta e, enquanto me arrasto, vejo filhos daquelas sementes, perfurarem a terra em busca da luz e calor do sol.
Sou lagarta, mas fico deveras penalizada quando não encontro uma folha madura por perto, o que me deixa sem escolha, pois saboreio folhas jovens que nem mesmo tiveram tempo de oferecer o primeiro sorriso para a vida: viram-se derrubadas pelo vento ou por um infortúnio qualquer.
Mas o que posso fazer?
Sou lagarta e tenho que cumprir meu destino até que chegue meu tempo de deslumbrar o mundo com as cores e desenhos que se escondem em minhas asas.