A peça shakespeareana expõe a vida assassina de um mau caráter nato. Na sua fase ascendente, o crápula dizima opositores e aliados na arena política. Mas nesse papel, ele pode – digo mais: deve - ser considerado um instrumento da justiça divina, de forma análoga a Richmond, que, no final de peça, ajuda a “abreviar” a criminosa trajetória do Breve.
Mas por que teriam os pecadores de ser punidos nesta vida e não na outra – logo, logo depois do julgamento final? Ora, o que aconteceu, tinha de acontecer, se aceitamos a lógica divina, que, entretanto, é, por vezes, difícil (impossível?) de ser compreendida e aceita por simples mortais.
Em nosso tempo, nem mais esse conforto se tem – de que existe uma lógica divina em operação. Nem a existênca do próprio Deus está mais assegurada. Se Ele não existe, então abre-se espaço para o absurdo, o caos, o acaso (ao contrário de Einstein, eu tô achando mais é que Deus gosta mesmo é de jogar dados nos seus momentos de relax!) –; enfim, a vida como ela é, segundo Nelson Rodrigues, o admirado dramaturgo brasileiro, recentemente agraciado com o prêmio “O Chato Repetitivo”.
A peça finda com uma espécie de “happy end”, mas este, no contexto da história da Inglatera, é seguido, cem anos depois, por redobradas lutas intestinas. Mas um consolo existe: por qualquer critério, Ricardo III foi um abominável tirano, que, para a felicidade dos seus concidadãos, só o foi por um curto período. Isso porque soube ele conquistar, mas não manter-se no poder por muito tempo.
Bom que as artimanhas palacianas não lhe tenham deixado tempo livre para ler Maquiavel! Aliás, nem que quisesse teria podido. Explicação científica – e por isso, no mais das vezes, com prazo de validade: quando “O Príncipe”, rabiscado em 1513, foi lançado pela Companhia das Letras aqui no Trópicos, o ex-rei inglês já havia se retirado para a clínica de repouso mantida pelos gauleses, que o assaram em 1485. É o que dá andar sempre de mal com a vida! Os riscos se multiplicam e surge um inimigo novo em cada esquina!
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