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Cronicas-->Lico, o primo campeão mundial -- 14/08/2015 - 09:58 (AROLDO A MEDEIROS) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Lico, o primo campeão mundial

Aroldo Arão de Medeiros

Somos primos com uma diferença de pouco mais de um ano. Sempre nos demos muitíssimo bem, principalmente quando éramos crianças e adolescentes. O tempo foi passando e cada um tomou seu rumo. Encontramo-nos esporadicamente em aniversários de parentes e nas piores datas quando alguém de nossa família falece. Vamos deixar as coisas tristes para trás e falar daquilo de bom que aconteceu conosco.
Fazendo um resumo de sua carreira, ele começou no América de Joinville, foi para o Grêmio e, em seguida, retornou ao futebol catarinense, atuando por Figueirense, Avaí, Marcílio Dias e Joinville.
Em 1980, Lico se mudou para o Rio de Janeiro, onde foi jogar pelo Flamengo. Teve a felicidade de atuar ao lado de craques como Zico, Leandro, Andrade, Júnior e Adílio, fazendo parte da equipe rubro-negra campeã da Libertadores da América e do Mundial Interclubes em 1981. Em vários momentos daquela geração Lico foi um titular com papel importante, quer seja fazendo gols ou gerando oportunidades de gol com cruzamentos, tabelas e deslocamentos em velocidade pelas laterais ou pelo meio.
Após duas cirurgias no joelho, se viu obrigado a encerrar a carreira em 1984 aos 33 anos.
Depois da aposentadoria nos gramados, Lico alternou projetos no futebol, ora como treinador, ora como diretor ou supervisor técnico, sempre em clubes do Sul, como o Londrina e o Avaí. Também foi gerente de futebol no Joinville.
Títulos: Figueirense - Campeonato Catarinense: 1974; Joinville - Campeonato Catarinense: 1979, 1980; Flamengo - Campeão Mundial: 1981;
Copa Libertadores da América: 1981; Campeonato Brasileiro:1980, 1982, 1983;
Campeonato Carioca: 1981; Taça Guanabara: 1981, 1982, 1984; Taça Rio: 1983.
Quando eu era guri ia até a cidade vizinha, Imbituba, onde ele nasceu e vive hoje, passar as férias na casa dele e de outros primos. Embarcava no trem e quando o cobrador aparecia, eu corria para o banheiro. Só saía de lá quando não escutava mais o barulho da maquininha que ele usava para picotar o tíquete da passagem. Quando o Lico ia nos visitar em Laguna, fazia a mesma coisa.
Ele era muito esperto quando garoto. Rei do ioió na Zimba, apelido carinhoso para Imbituba. Fazia misérias com o brinquedo. Na bolinha de gude, no peão, não tinha para ninguém.
Naquela época espocavam álbuns de figurinha o ano todo. Era Ping Pong Craques da Bola, Brasil Tri e dos campeonatos catarinenses e brasileiros. Ele só fazia coleção de álbuns que tivessem relação com futebol. O Lico ganhou muitos prêmios sem gastar muito dinheiro. Usava uma técnica que só para mim confessou, provavelmente por eu ser tanso e não falaria para ninguém e não o copiaria. Olhava o envelope contra o sol e via se a pequena estampa era carimbada ou não. Ganhou bolas, panelas de pressão, tabuleiro de madeira de jogo de damas e outros prêmios. Às vezes vendia a figurinha carimbada por um bom dinheiro.
Sua vida de engraxate foi simples, mas compensadora tanto para ganhar algum dindin, como para ensinar-lhe a vencer as agruras da vida, contorná-las sem sofrer tanto. Ele fazia batucada na caixa com a escova e com o pano no sapato.
Não era só o Lico que era craque na família Albino, sobrenome materno. O irmão dele, o Admilson ou simplesmente Sinha era do mesmo nível futebolístico ou para alguns, melhor que ele. Era dono de um futebol clássico com requintes de pura beleza e magia. Infelizmente foi chamado ao céu bem cedo, não conseguindo seguir a carreira do irmão. O terceiro primo bom de bola era o Joãozinho, assim tratado no meio futebolístico e Janga para os familiares. Este era de Tubarão e chegou a integrar o elenco do Avaí e do Guarani de Campinas, São Paulo.
Tive uma ligação forte ou para alguns pode ser interesseira. Quando ele começou no América, de Joinville, eu era estudante de curso superior naquela cidade. Não tinha dinheiro para gastar com supérfluos como futebol e cinema. O filme eu assistia às sextas-feiras porque era sessão dupla. Podia, portanto, ver dois filmes por semana pagando por um. O jogo eu assistia porque chegava duas horas antes do início da peleja e mandava chamá-lo. Ele vinha e me colocava para dentro do estádio.
Lico, na infància, era alegre, vivaz.
No América de Joinville, tornou-se um jogador afoito, que adorava dar dribles nos jogos e nos treinos contra seus parceiros, mais velhos que ele. Como era um trabalhador no esporte bretão, reclamava muito da arbitragem. Lembro que certa vez em seu apartamento em Joinville, conversamos e falei para ele:
- Lico, porque reclamas tanto do juiz e estás sempre sendo expulso da partida.
- Aroldo. Eles não marcam pênalti a meu favor, anulam gols que na minha opinião eram para serem validados. Eu não aguento ser roubado. Estão tirando o pão da minha boca.
Hoje fala bem, com desenvoltura, e é muito bom de papo, sendo simples e comunicativo. Quando pegamos um depoimento seu sobre o meu pai que completará noventa anos, disse palavras que ficarão guardadas com carinho e emoção pelos familiares.
Vamos falar um pouco dos casos de fanatismo que presenciei e um acontecimento que me contaram. Quando ele chegou do Rio de Janeiro com a faixa de Campeão do Mundo houve uma festa em Imbituba. A organização da recepção foi feita por um jovem torcedor fanático pelo Flamengo. A despesa correu toda por sua conta, provavelmente. Não me sai da cabeça a cena. Càmera de televisão a postos e o jovem abraçado ao Lico em prantos suplicava:
- Tirem uma foto minha com o Lico, por favor. Ele é campeão Mundial. Meu ídolo, meu amigo.
Outra vez, minha irmã estava com o Mário em Imbituba e depois de pegarem depoimentos do irmão gêmeo do meu pai e de sua irmã, comentou que poderiam pegar depoimento do Lico.
Mário ficou branco e falou:
- O Lico que estais falando é o ex jogador do Flamengo?
- É. Não avisamos nada para ele.
- E daí o que ele é de vocês?
- É nosso primo.
- Vamos já.
Só faltava chorar. Não sabia o que dizia. Ganhou o DVD autografado do documentário que traz a carreira do craque. Travessia de um Sabiá é o trabalho de conclusão de curso dos jornalistas Cleber Latrónico (repórter do Notisul) e Fábio Lima. O documentário em vídeo, de pouco mais de 30 minutos, conta a trajetória de Lico no futebol. O resgate histórico, além de mostrar gols, jogadas e imagens raras da vida e carreira. Traz depoimentos de ídolos do futebol como Zico, Andrade, Paulo César Carpegiane, Balduíno, Orivaldo, Fontan, Luís Everton e Lauro Búrigo, além de mestres da crónica esportiva como Roberto Alves, Maceió, Hélio Costa, Fernando Linhares.
Ficou de pegar uma camisa também assinada pelo seu ídolo. Ao sair dali, rindo o tempo inteiro, de alegria, por conhecer o Lico, pegou o celular e ligou para o filho, outro fanático.
- Filho advinha o que aconteceu comigo?
- Ganhou na loteria?
- Não, conheci alguém.
- Quem o Zico?
- Não, foi o Lico. Em casa conversamos...
Não posso deixar de lado o que ocorreu quando levei meu irmão para visitá-lo. Ele não teve muita ligação com o primo porque a diferença de idade é bem grande.
Quando chegamos já queria tirar foto ao lado do primo famoso. Lico com sua calma disse que esperasse um pouco que o levaria até outra sala que tiraria fotos com ele, com a fixa de Campeão Mundial, Brasileiro e era também onde guarda seus troféus, medalhas fotos e reportagens. Adriano inquieto não via a hora passar para entrar na sala dos seus sonhos. Finalmente entrou, ria sozinho e depois de ser fotografado com o primo, e ganhar deste o DVD proferiu.
- Hoje é o melhor dia da minha vida. Muito obrigado, Lico.
Quando embarcaram no carro, vi pelo retrovisor que corriam lágrimas pelo rosto dele. Berrei para o Lico que veio ver, abraçou-o afetuosamente. No caminho Adriano confessou que estava até com dor de barriga pela emoção que proporcionamos.
Certa vez fui a sua casa presentear-lhe com meu livro Viajando com as palavras. Deixei uma dedicatória que fez com que risse e dissesse:
- É, foi verdade. Ah, ah, ah
Foram esta as minhas colocações:
- Lico, uma lembrança daquele que te ensinou a jogar bola. Ah, ah, ah. Do teu primo que te admira. Aroldo.
Pensam que é mentira? Ensinei todos os segredos da bola e do futebol. Assim como uma cozinheira transmite o conhecimento de certa comida, não passa um segredo que se adiciona, senão "perde a mão".
Ensinei tudo, inclusive certos segredos que deveria omitir. Acabei "perdendo o pé" e desaprendi a jogar futebol.
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