O dia em que o terror me pegou
Por Mario Sabino
No último sábado, fui com meu filho de dez anos assistir ao jogo entre Itália e Alemanha, pela Eurocopa, na fan zone do Campo de Marte, em Paris. Fica a cinco estações de metrô da minha casa. Chegamos às oito horas, com o sol de verão alto. Passamos por três revistas e, na segunda, tive de jogar no lixo um frasco de álcool em gel guardado no bolso do meu casaco. Eu adorei jogar no lixo o frasco de álcool em gel guardado no bolso do meu casaco. “A segurança está mesmo excelente”, pensei.
A fan zone parisiense é um espetáculo: cinco telões de alta definição, uma grande loja de uniformes, bolas e outros souvenirs, diversões futebolísticas para crianças, uma arquibancada montada pela Coca-Cola e barracas de comida e bebida — tudo emoldurado pela Torre Eiffel.
Já no final do segundo tempo, perto de uma das saídas, diante do telão mais próximo da arquibancada da Coca-Cola, eu torcia para a Itália aguentar a blitzkrieg alemã, enquanto a poucos metros meu filho fazia embaixadinhas com a bola que lhe dera de presente. Absorto no jogo, demorei alguns segundos para acreditar que centenas de pessoas se atropelavam na nossa direção.
Gelei. Só podia ser um atentado. Alcancei meu filho, colei a minha mão na dele e corremos para longe da fan zone, imersos na multidão. Foi o que fizemos nos dez, quinze minutos seguintes: correr. Sem saber se nos perseguiam, cruzávamos com militares que avançavam com metralhadoras. “Todos para fora do perímetro! Todos para fora do perímetro!”, ordenavam.
Só parei quando os meus 54 anos começaram a ofegar, a quase um quilômetro do Campo de Marte. Meu filho tremia, eu procurava ar, até que consegui perguntar a um policial o que havia ocorrido. “Ainda não sabemos”, disse ele. Ganhei uma garrafa de água mineral.
Telefonei para a minha mulher. Ela não vira nada na televisão ou na internet. No dia seguinte, divulgaram o que ocorrera: uma escaramuça entre alemães e italianos foi confundida com um ataque terrorista. Cerca de trinta torcedores se machucaram na correria.
Entre o frasco de álcool em gel jogado no lixo durante a revista e a garrafa de água mineral oferecida pelo policial, a minha paz se liquefez. O terror não me feriu, não feriu o meu filho, mas me pegou e pegou o meu filho.
É o que eles querem.