A porta imensa, antiga, descolorida pelo tempo,
guardava em suas frestas, lembranças emolduradas.
Entre lençós esvoaçantes, sobre a cama desalinhada,
corria também em desalinho, corpos nus,
despido de roupas e de vergonha.
Sexos expostos com suas almas flutuantes.
Visto de longe, pela fresta da porta, era cena inesquecível.
Cabia ali, a mão disposta do artista a retratar em tons
reais, o fogo dos amantes, e, com pouco mais de cuidado,
até o cheiro do desejo ardente que corria no ar.
De longe, pela fresta, dava pra imaginar a cena de pouco antes.
Cada toque das mãos nas pernas macias. Beijos e línguas, passeando,
perdidos na geografia.
Os gemidos, se ouviam sem cuidado. Eram quentes, e urgiam no desejo
de possuir, e quanto mais se penetravam, mais se pediam suplicante, um ao outro.
A cena era viva e tão real,
que mesmo sendo vista pela fresta imaginária, da porta antiga de um quadro em exposição
podia se ouvir do observador, as batidas desajustadas do inquieto coração.
E ali, na parede vermelha, porta antiga, dobradiças enferrujadas, folhagem caída,
moravam a intensidade da cena, o desejo do artista,
e a imaginação do espectador.
Valentina Fraga
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