AS PIRUETAS DO MINGAU
Foi o Geraldo, meu irmão, quem chegou com ele pequenininho lá em casa. Cresceu, mas não muito, era um fox paulistinha, branco de manchas marrons, pêlo curto e pernas finas. Um barato!
Agitado, corria pra todo lado, fazia festa pra todos nós. Tinha que ficar no quintal, mas sempre que dava, entrava, correndo como louco. Ia até a sala, pulava no sofá. No impulso, rodopiava uma ou duas piruetas no ar. E saía feito ventania. Mas voltava, na mesma correria. Repetia. Sabia que todo mundo ria.
Fugia. Sozinho na rua, xeretava todo lugar. Andava atrás da molecada, procurava gatos pra caçar. Horas depois, vinha pro seu lugar.
Mas um dia não voltou. Nós e a vizinhança a procurar, aqui, ali... nada! Foi na carrocinha, da esquina o padeiro avisou. Todo mundo chorou.
E lá foi dona Laura até a periferia, pra descobrir o paradeiro, hotel derradeiro, xilindró dos vira-latas. Diziam que os prendiam para deles fazer sabão. Mas mamãe, competente, achou o dissidente. De volta ao lar, contente, aí é que não parava de piruetar. Mas nada de se emendar. Assim que podia, saía.
Duas ou três vezes mais, a carrocinha o levou e mamãe, já enervada, recuperou. Até que desapareceu. No xilindró não estava, ninguém sabe, ninguém viu. Sumiu.
Quem salvou a situação foi seu Ari, com cara de sonso, mas que de bobo não tinha nada. Andava pelo bairro, pra lá e pra cá, levando em domicílio compras do armazém. Eu vi, na outra rua, na casa tal, tá lá preso o Mingau. Lá morava um menino enjoadinho, chamado Chiquinho. Mas não vão brigar com ele,não. Deixem comigo.
No dia seguinte, veio avisar. Fui levar uns trem pra dona Neném. Na saída, falei baixinho pro cãozinho docêis: eu vou, mas o portão fica aberto, viu? Mingau ouviu direitinho e entendeu. Se escafedeu.
Magro e abatido, com o rabo entre as pernas, do exílio voltou. Reapareceu.
E só anos mais tarde, lá em casa, de velho morreu.
Beatriz Cruz
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