Ela não estava com meias e o frio lhe subia aos pés.
O sapato estava úmido e as pernas tremiam. Embrulhada no seu casaco de lã, que bom seria saber então que deveria ter colocado uma malha mais quente e não a camisa fininha que estava.
Enroscada ao namorado, com os dois braços em volta de sua cintura, os dois tentavam ficar sob o mesmo guarda-chuva, desviavam das mesmas poças e procuravam as ruas mais escuras para passar.
O chuvisqueiro e a grossa neblina haviam espantado as pessoas para suas casas, a rua e a noite era só deles.
Paravam a cada par de minutos para um gostoso beijo.
Poderiam ter sabido, então, que teriam uma vida inteira juntos e que o dia seguinte sempre seria melhor.
No rosto de ambos, o frio intenso de um início de outono não lhes incomodava. Beijar muito, como se o mundo fosse acabar amanhã, e como se tivesse demorado muito encontrar um ao outro nessa vida. A saudade de séculos amontoada e traduzida num pulsar simultâneo e arrítmico dos corações, agora recompensada pela voracidade dos beijos.
Não reconheceram, então, um no outro, mágoas e desgostos esquecidos de outras vidas. Para que a paixão emergisse e se realizasse, deixaram de perceber os sinais quase apagados do que já sabiam um do outro.
Que pena não adivinharem que se amando tão cedo os riscos eram maiores e as consequências, inevitáveis.
Quase não se falavam, não perdiam tempo com explicações do que não entendiam, apenas se deixavam levar pela imensa emoção, achando que, injustamente, o tempo corria demais quando estavam juntos.
Não sabiam que iria ser guardado aquele momento em suas mentes e eternizada aquela sensação gelada nos rostos e nas mãos, o gosto dos lábios e o perfume que usavam misturado com os aromas da noite.
Os dois corpos seguiam pela noite, levando seus donos e seus projetos de vida. Eram novos demais, então, para saber.
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