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cronicas-->DE MOTORISTA A PREGADOR -- 08/07/2001 - 23:03 (odoricoaffonsofilho) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
cronicas DO COTIDIANO



DE MOTORISTA A PREGADOR

TINO



A nossa crónica começa homenageando toda a equipe responsável pela realização do filme A CENTRAL DO BRASIL.
A conquista do Oscar é problema político. Envolve outros fatores que não a arte cinematográfica. O que vale mesmo é o reconhecimento, é a consagração popular do filme na própria terra dos criadores do troféu. Parabéns!

De desvio em desvio, os vagões pareciam querer pular dos trilhos e os passageiros, jogados prá lá e prá cá... Era o trem chegando ao seu destino final. A Central do Brasil.
Portas abertas, a saída e a correria desenfreada em direção ao próximo destino.
Em formato angular, o prédio da Central tem no vértice, a grande torre com seu relógio monumental apontando nas quatro direções do Rio, culminando com o grande mastro para ostentar o Pavilhão Nacional. Da Ponte Rio-Niteroi dá para se visualizar tanto a torre como o relógio em todo o seu esplendor.
A gare, como toda gare ferroviária, ampla e sem colunas centrais e com outro relógio este, para os usuários. Bancas de jornais e Revistas, agências dos Correios, guarda bagagem, guinches, bares, roletas ... O sistema de som anunciando a partida do próximo trem.
Em frente ao portão principal, a velha edificação do então Palácio da Guerra, testemunha ocular da Proclamação da República .
Pela lado leste, lá para depois da Av. Presidente Vargas, o Campo de Santana com suas árvores centenárias, jardins floridos, chafarizes, fauna própria (cotias, pavões, gatos famintos), caramanchões com seus bancos rústicos mas confortáveis servindo para descanso e reflexão das pessoas estressadas, mendigos, namorados, apreciadores da natureza. É um oásis de tranquilidade e de beleza silenciosa dentro do caldeirão louco e efervescente que é o movimento da grande metrópole.
Pór baixo da Av. Presidente Vargas, o moderno metró com saídas para todos os terminais. Ainda aí, no terminal de ónibus para a zona sul, local totalmente tomado pêlos camelós, vendendo de um tudo, churrasquinhos de gato, pastéis de carne, refrescos ...
Para o lado oeste, deparamos com outro terminal de ónibus, agora para a Baixada Fluminense. Este local sofre assaltos a mão armada diariamente. Rua Marcílio Dias, com os seus famosos ¨ pés sujos ¨, restaurantes aonde se saboreia uma bacalhoada gostosa regada ao bom vinho. As mesas colocadas ao comprido sem nenhuma formalidade para se sentar. Assim, é comum, trabalhadores braçais, suados sentarem-se ao seu lado, levantar o braço para apanhar o sal e exalar aquele perfume de desodorante já vencido. Não bastasse isto, os sanitários bem próximos das mesas com a conservação deixando a desejar. Ainda nesta rua, hotéis de prostituição e casas assobradadas com cartaz ¨Alugasse Vagas ¨. Mais para frente, o túnel João Ricardo, escuro, pessimamente conservado, perigoso durante o dia e mais ainda durante a noite, interligando a Central ao Cais do Porto. Terminais de carga e becos, locais desertos e frequentados pór prostitutas, mendigos e viciados. Aí encontramos meninos e meninas de 8 a 12 anos se prostituindo abertamente.
- Vem moço! - Vamos transar! - Sou todo seu... Me pague um prato de comida, estou com fome...
- Eih! Menino! Você é menor de idade! - Vou leva-lo para a delegacia de menor! Vociferava o guarda ferroviário.
- Deixa ele seu viado!!! - Não tá fazendo nada! - Só quer comer... Explodia a menina da vida que se encontrava no local.
Este o ambiente hostil e degradante do nosso Terminal Ferroviário.

O destino, a zona sul da cidade. O ónibus, o de No 125, Pça Gen Osório, parado no terminal do lado direito da Central. Horário previsto de saída: 18:06 horas
Ao chegar ao veículo, notei que algumas pessoas se posicionavam para sentar próximo ao motorista.
- Pretinho! Cheirou cola hoje? Perguntou o motorista
- Não... Seu Pedro, não cheiro mais...
- E a aula com D.Maria?
- Eu fui, tá legal...
A mesma pergunta foi feita para o Bicudo, para o Tenente e para o Bocão. Bem ou mal, o motorista Pedro cuidava, a sua maneira destes meninos e eles o respeitavam.
- Não há menino mau. Dizia ele. - O macete é saber lidar com eles.
Pronto o ónibus, ligou o motor e deu a partida. Não parava a máquina do carro de trabalhar e nem parava o motorista Pedro de falar. Casos e mais casos. Casos envolvendo garotos, policiais, furtos, prostitutas, era um desfile de acontecimentos. Até o Teatro Municipal, o trànsito ia lento. Era aquele anda e para.
- A Sra. deseja saltar? - Calma! - A sua vida vale muito... - Pronto! - O carro já está encostado no meio fio. - Pode saltar agora!
Era a gentileza em pessoa. Sempre encontrava uma palavra de otimismo com o guarda de trànsito, com o motorista do outro carro, com o pedestre...
Quando adentrou ao Aterro do Flamengo, pista livre, sem sinal, sem ponto de parada até a Praia de Botafogo, o motorista Pedro assumiu o púlpito, pegou a bíblia, abriu aleatoriamente e começou a pregar sobre o capítulo sorteado. Possuía poder de síntese muito grande e sempre dava como exemplo a sua realidade de vida, a Central do Brasil.
Ainda me recordo que numa das viagens o tema foi: Não furtarás! Um dos dez mandamentos.
Pregava ele.
- Não furtarás 1 tostão
- Não furtarás 1 pão
- Não furtarás 1 milhão.
- A falta é a mesma !
- Quantos neste ónibus poderiam afirmar: Eu sou honesto!
- - É fácil pregar para pessoas com a barriga cheia...
- - Como pregar para os meus meninos famintos a não furtar 1 pão, 1 tostão para mitigar a fome? 1 milhão, nem pensar, não sabem o que é isto...
Após o Túnel Novo, já em Copacabana, voltava a realidade e passava a ser novamente o motorista Pedro, atencioso. Ao cruzar com o guarda na Xavier da Silveira perguntou: - Como vai o trànsito no aterro? - Tá legal! Respondeu o guarda.

Ainda me lembro quando saltei, ele disse:
- Vá com Deus! - Boa Noite!
- E o que é feito do motorista Pedro, o Pregador?
Certo dia, cheguei no horário certo de saída do carro, 18:06. Não vi o Pedro nem o seu ónibus. Como os demais, perguntei:
- O que houve com o Pedro/ - Cadê o Pregador?
- Foi despedido!!! Respondeu o fiscal.
- E porque?
- Pór economia! Economia empresarial! - Redução de Pessoal.

MUNDO PERVERSO !!!

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