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Artigos-->U-News (3) - Esse Negócio Mequetrefe que é o Natal. -- 12/12/2003 - 22:03 (Márcio Scheel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
U-News 3 Ano I nº3



Ibitinga, 11 de dezembro de 2003.

O Primeiro Caderno de Notícias Contra o Natal.



Ah, o Natal! Tempo de paz, saúde, amor, entendimento e concórdia. Momento mágico que nos permite, de um dia para o outro, ajustarmos nossas contas – apurando sempre um saldo favorável, é claro – com os outros 364 dias de vilania, impostura, desconversas e hipocrisias que ensejamos, sobremaneira, como uma forma natural e humana – demasiada humana – de estarmos vivos. O Natal é o instante de redenção deliberada em que todos passam a reivindicar para si o direito de serem piegas, sentimentais, apaixonados e sofistas, falando na felicidade possível, nas expectativas minúsculas para o ano que chega, e desejando Boas Festas! com o mesmo sorriso insuportável e artificial de quem quer nos ver, literal e diabolicamente, pelas costas, para não dizer na merda, fodido e abandonado. O Natal é essa coisa vergonhosa que anda a solta por aí nos programas de TV., nas campanhas publicitárias, nos canteiros, praças, avenidas e postes de iluminação pública. Uma pirotecnia sem vergonha ou sentido.



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Falando em pirotecnia, nada mais ridículo do que associar o espírito natalino aos milhares de lampadinhas piscantes com as quais somos obrigados a cruzar, diariamente, sem aviso ou cuidados. E pensar que tem gente que se ilumina com o Natal, para dizer o mínimo. Na verdade, concordo com meu amigo Zé Pedro Antunes: é quando chega o Natal que nós percebemos que nossa vocação, no fim das contas, é fundamentalmente junina mesmo. E nem preciso dizer que ando completamente desacreditado do Papai-Noel, do trenó, das invasões pela chaminé – uma vocação fora-da-lei, será? – e da Rena do Nariz Vermelho. Para ser sincero, nem no espírito natalino eu ando botando muita fé. No fim das contas, é só um pretexto para a mais para decorar as ruas, vincular propagandas de fé e esperança, saúde e paz, amor ao próximo, ao irmão, manja? para recomendar, depois, os melhores produtos, os melhores preços, os melhores crediários, para quem quiser comprar seus presentinhos esdrúxulos e inúteis, o que, acredito, é só mais uma forma de vilania para com o próximo.



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Felicidade é artigo consumível.

E já vem dividida em doze parcelas sem juro nos balcões das Casas Bahia. Quer pagar quanto? Quer pagar quando?

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O Natal é uma forma de ser canastrão e auto-indulgente sem, necessariamente, parecer ridículo, danado ou infeliz. E tem ainda as reuniões familiares, a ceia, o amigo oculto e as tias-velhas. Além dos malditos e broxantes pisca-piscas. Tem gente que vai para o litoral ou que dá de presente o último CD da Sandy e Junior, nesses casos, é bom ensejar um suicidiozinho nostálgico e melancólico, trancado no quarto, ouvindo um sino distante que parece dar conta de nossa morte para além da morte, comezinha e vulgar, que sequer notam mais. Ninguém cogita Bach, nessas ocasiões. Depois, é cantar “Noite Feliz” embalados por qualquer infelicidade guardada a sete-chaves no fundo sem fundo das retinas.



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O Natal, hoje, é made in Taiwan.



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A chinesada sim é que faz a festa. E saem ganhando três vezes: além de não comemoram o nascimento de Redentor do cristianismo, responsável por nossas piores e mais cruéis castrações, não se afundam nas taras esquizofrênicas da sociedade de consumo ocidental e ainda vendem pisca-pisca para o mundo inteiro. A chinesada só acredita mesmo em cachorros, macacos, cavalos, dragões e quaisquer outras entidades exóticas que configuram o famigerado horóscopo local, do qual não consta, ao menos até agora, que o Papai Noel faça parte. Esse ano, se não me engano, eles estão vivendo sob a influência do dragão. Taí um lagarto simpático, sempre pronto a queimar as almas mais entregues ou desavisadas. Uma boa época para dar crédito a essa chinesada sorridente e desprendida, a dragões e zodíaco chinês, desligar a televisão e não se matar até a próxima cena.



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O Natal, no fim das contas, nunca foi um negócio tão mequetrefe quanto agora. A oportunidade perfeita para exorcizar nossas descrenças mais calculadas. Hoje, por exemplo, tive ímpetos de assassinar um Papai-Noel mal ajambrado, com a barba caindo pelas tabelas, um olhar canino e distante, um sininho irritante, uma barriga indecente e uma voz entre entediada e indiferente gritando FEEELIIIIIZ NATALLLLL! FEEELIIIIIZ NATALLLLL! FEEELIIIIIZ NATALLLLL! Tive ímpetos de lhe dizer que a felicidade é artigo consumível, que não existe para além dos comerciais das Casas Bahia ou das páginas bem-transadas da revista “Cláudia”, “Caras” ou “Marie Claire”. Mas pensei que ali, naquele calor de trinta graus, numa roupa de veludo vermelha, com uma barba postiça e mal ajambrada, ele já soubesse. Ou que, talvez, não fosse justo acabar com algumas ilusões que ele ainda tivesse nessa vida. O fato é que Papai Noel é um troço que constrange muito mais do que consterna – ou: algo que, há muito, deixou de ser uma ilusão possível. Tenho, para mim, que o Papai Noel é tão mequetrefe quanto o Natal. Mas quem iria tão longe?



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Agora, não vou falar no esvaziamento dos sentidos simbológicos do cristianismo concernentes ao Natal em favor do aspecto mercadológico-consumista pelo qual ele passou a partir da contemporaneidade. Nem fodendo. Pior que o espírito (de porco) natalino, só essa sociologia fundo de quintal de uma gente ainda mais infeliz do que eu - jogando areia na felicidadezinha shopping center dessa classe-média deslumbrada e ignorante que anda a solta pelos calçadões comerciais desse país de indigentes. Nem fodendo. Tem gente que dá “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, do Max Weber, como presente de Natal. E desses trapos bandeiras são feitas...



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Por falar em presentes: se alguém me der a George Foreman Grill ou o novo CD do Belo – o mais procurado do Brasil – eu juro, tenho um colapso. Melhor é ensejar alguns momentos de solidão e indiferença, um olhar abobado, um número considerável de lembranças e esquecer o Natal. Ou dançar um tango argentino, pondo essa imaginação cansada e rendida para funcionar, tal Victorio Grassman em “Perfume de Mulher”. Há quem prefira a versão com Al Pacino. Eu, de minha parte, não abro mão de Grassman e do cinema italiano. O que podem chamar de minha “concessão ao espírito de porco do Natal” ou “meu momento de lirismo e paixão”, não importa, desde que não me confundam com esse tipo de gente que compra a felicidade possível nos balcões das “Casas Bahia” ou da “C&A”, que deseja FELIZ NATAL e UM PRÓSPERO ANO-NOVO com a mesma hipocrisia e o mesmo desprendimento de quem sonha o inferno e a desgraça completa para o próximo. Incluindo os parentes e as tias-velhas, é claro. Não pactuo com isso. Sobretudo com parentes e tias-velhas maldizendo a própria árvore genealógica – Amém. Melhor é um pouco de Sinatra, gim-tônica e a televisão fora do ar, sabe, com aquele arco-íris vertical de fins de noite ou madrugadas alheias.



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Um barzinho monótono e vazio – solitário, em essência. A ausência de palavras e o sorriso entre bêbado e descuidado. Deixar ser. Deixar estar. E fazer valer esse desgosto que se distribui, lentamente, pelas coisas. Desde que não me falem na Rita Lee, que “ama as pampa/ as mina de sampa”, que acha que “amor é latifúndio/ e sexo é invasão” e que não entende nada de concordância nominal ou, o que é pior, Rock And Roll. Mas que chegou a ser simpática e algo adorável quando alimentava um amorzinho hippie, descabelado e maconheiro, um amorzinho modelo anos 60/70, com os irmãos Batista, que se odiavam na exata medida dos Karamazov, de Dostoiévski, embora, graças a eles e a outrora-doce-louca-bárbara Rita, “Panis et Circenses” e “Bat Macumba” puderam fazer algum sentido.

Um barzinho monótono, vazio – solitário, em essência – e melancólico. Como essas praças enfeitadas com milhares de lampadinhas pisca-piscando e sugerindo desvios, atalhos, paralelas impossíveis. Nossa vocação junina. (Um Abraço, Zé! E um FELIZ NATAL, sem as hipocrisias de praxe). Melhor, reconheço, do que o Taumaturgo Ferreira interpretando ele mesmo – ou seria o Nelito? – em “Celebridade”, o fim-da-picada do Gilberto Braga. Melhor do que a programação de fim de ano das emissoras de TV do país. Melhor do que esse vazio que vai tingindo o mundo de cinza.



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Vale que até o dia 02 de janeiro isso tem de, obrigatoriamente, acabar.

Apesar do carnaval e outras frustrações.

FELIZ NATAL!!

Na medida do impossível e do improvável.



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P.S – E-MAILS para contatos, reclamações ou coisas do gênero: marcioscheel@bol.com.br; marcioscheel@uol.com.br; marcioscheel@hotmail.com.br. Para não dizerem que não sou condescendente.



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