Usina de Letras
Usina de Letras
143 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62178 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10449)

Cronicas (22532)

Discursos (3238)

Ensaios - (10349)

Erótico (13567)

Frases (50582)

Humor (20028)

Infantil (5425)

Infanto Juvenil (4757)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140791)

Redação (3302)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1959)

Textos Religiosos/Sermões (6183)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Artigos-->A Bela e a Fera ( análise) -- 14/12/2003 - 15:25 (Nilo dos Anjos Gomes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Na teoria psicanalítica de Freud, as ameaças de castração, associada ao complexo de Édipo, representam um papel fundamental na formação da estrutura do aparelho psíquico. De acordo com Freud, a repressão dos desejos incestuosos é um mecanismo para escapar da angústia que essa ameaça provoca. Os contos de fadas representam um modo de expressão de uma realidade interna, de modo simbólico, desenvolvendo-se a partir de nossas angústias e aspirações, permitindo simbolizar o trabalho psicoafetivo de nosso inconsciente.O conto escolhido é rico em imagens, pois relata em seu enredo como ardilosamente estão ocultos os desejos incestuosos e também como são satisfeitos, a questão da falta, a inveja e o amadurecimento dos personagens através de símbolos que numa leitura menos atenta e incauta passariam despercebidos, mas que ainda assim provocam elaborações inconscientes, pois retratam uma realidade, a realidade interna coletiva a que estamos metidos incapazes de nos desvencilharmos, mas que encontram uma maneira de se expressar mesmo que seja sob a forma de disfarce.





A BELA E A FERA (Mme Leprince de Beumont)





É a estória de um rico mercador que tinha seis filhos: três rapazes e três moças. Suas filhas eram muito bonitas, mas a menor era a mais admirada, chamava-se Bela. Além de muito bonita Bela era a mais inteligente, o que provocava a inveja das outras irmãs.



- A inveja: pode ser interpretada como tentativa frustrada de alcance de um ideal de eu. A inveja é a impossibilidade de gozar o que não me pertence exclusivamente, sequer permitir-lhe que subsista, Fabio Herrmann e Amazonas Alves Lima (1982 p.13). Suas irmãs “percebendo” a incapacidade de tornarem-se tão admiradas quanto sua irmã, Bela, reagem com um dos sentimentos mais comum ao ser humano, pois as remetem para o ponto onde tiveram que, na busca de aceitação do amor materno, passar a buscar um ideal de eu. Como para elas parece ser este ideal inatingível e por causa disso nunca serão tão admiradas pelo pai quanto Bela, tornando insuportável permanecer diante daquilo que as faz “lembrar” da causa primária de seu sentido de abandono, de desamor, de angústia; sentem o desejo de destruir, de aniquilar ou no mínimo tornar esse objeto predileto do outro ao qual elas desejam, mas que não são por ele desejadas, o mais prosaico possível, para que possam disputar o amor paterno em pé de igualdade.Bela também sendo ela a predileta, a que cuida dos afazeres domésticos e a mais responsável, passa como mãe, apesar de ser a mais nova da casa, sendo por conta disso, a luz da teoria Freudiana, considerada uma rival. Durante o processo de castração há um momento em que a menina volta-se contra a mãe, pois esta não pode oferecer-lhe o pênis, e parte a procura deste no pai, escolhendo-o como objeto de amor, Nasio (1997).Este sentimento de ódio é mostrado no conto:...No dia em que o mercador perdeu tudo que possuía e foram morar numa cabana.Bela, então, todo o dia acordava às quatro horas da manhã, limpava a casa preparava o café da manhã para a família, depois de terminar todo o trabalho ela passava o tempo lendo, tocando cravo ou cantando. Em contraste com isso, suas irmãs estavam sempre entediadas, não acordavam antes das dez horas da manhã e tratavam com desprezo e inveja os simples prazeres de Bela. Este ambiente de conflito pode muito bem se reportar ao momento vivido por mãe e filha durante o processo de castração, como são órfãos de mãe, sendo elas ainda muito jovens teriam projetado a mãe que lhes faltam na figura de Bela, a predileta do pai e que cuida dos afazeres domésticos além de ser muito prendada. Sem contar o fato de que Bela quer o lugar da mãe e este é o conflito vivido por ela e seu pai no conto “... Após uma longa viagem seu pai, com fome e exausto adentra uma propriedade alheia e após usufruir tudo o que podia, ao se preparar para partir, passando por uma arcada coberta de rosas lembrou-se do pedido de Bela, agarrou um ramo no qual havia várias rosas...”.



O pai bom encontra-se com o pai fera: Neste ponto, o pai, ao arrancar de um jardim que não lhe pertence, uma rosa branca, desperta a Fera inconsciente que existe nele. Há no roubo da flor a simbolização do desejo e do medo inconsciente das meninas de serem raptadas ou violentadas, ao mesmo tempo em que há o desejo do pai em deflorar a menina e a culpa em realiza-lo. Pai e filha vivem o mesmo dilema tendo o desejo como fonte de angústia em que ambos devem encontrar mecanismos de defesa que os substituam. É importante salientar que é o pai quem primeiro encontra com a fera, antes da menina, o que pode denotar uma busca interior por parte do pai, talvez tentando entender-se se confrontando com seus desejos, ou por ser muito intenso, o desejo, não tendo por onde escoar acaba se revelando. No diálogo entre a fera e o pai, a fera repreende o pai por querer roubar a flor que é a coisa que ele, fera, mais ama no mundo.É como se o pai ao sentir-se culpado por tal pensamento fosse comparado a fera que o repreende e diz coisas que o faz refletir: hei... Pare! Isto não é certo, o animal aqui sou eu! Ponha-se no seu lugar e deixe esta rosa aí mesmo.Este momento também revive no pai a época em que mãe e filho eram apenas um, inseparáveis, e o desejo incestuoso se dá justamente por não existir mais esta unidade, o pai então é forçado através do desejo pela filha, a vivenciar o momento em que passou a ser um ser em falta. Mas tendo entrado no simbólico o único caminho é o desejo e por isto mesmo, sofre.

Curiosamente é a filha que se entrega à fera para libertar o pai de suas garras, neste ponto a filha tomada de desejo pelo pai prefere entregar-se a ele a vê-lo doente de desejo mesmo correndo o risco de aniquilar-se . Mas o ato não pode ser consumado, o gozo pleno que a aniquilaria psiquicamente é transformado em desejo, fruto do processo de castração em seu estágio final, quando a menina busca o amor do pai. Após ter se libertado do narcisismo primário precisará buscar o ideal de eu para sentir-se amada e desenvolver-se. Para Freud, o desenvolvimento do eu consiste em distanciar-se do narcisismo primário, Nasio (1997 p.51).Na realidade, o eu “aspira intensamente” a reencontrá-lo, e para isso, para recuperar o amor e a perfeição narcísica, passa pela mediação do ideal do eu. O que fica perdido é o imediatismo do amor. Enquanto com o narcisismo primário, o outro era o si mesmo, a partir daí só possível experimentar-se a través do outro Nasio (1997 p.51).Pode-se notar no texto essa passagem quando Bela vê, após entrar em seu quarto, quarto este representando o mais íntimo de seu ser, e é nele que encontra um livro com os dizeres: “Deseje, ordene: aqui você é a rainha e a dona”. Simboliza a sua entrada no narcisismo secundário o desejo aí não pode ser entendido como fato a consumar-se e sim apenas como um vislumbre, uma artimanha do eu para gozar ainda que disfarçadamente. E é neste momento que ela suspira e diz: “Quem me dera ver meu pobre pai para saber o que está fazendo neste momento”. E neste momento ela vê no espelho uma imagem de seu pai chegando em casa parecendo muito triste. Que alegoria perfeita para exemplificar o quanto seu eu está comprometido, é o desejo incestuoso mais uma vez se manifestando. Mas ela quer o pai bom não a fera. Neste momento já começa a haver um crescimento da personagem, o pai fera, que a quer devorá-la e pelo o qual queria ser ela por ele devorada é substituído pelo pai bom, idealizado, e é esta imagem que a guiará para sempre na busca de seus amores, recriando e revivendo o Complexo de Édipo ao longo de toda sua vida. Essa passagem para o amadurecimento de Bela se dá quando ela triste por ter se afastada da fera, deixa o anel em cima da mesa e vai dormir como havia prometido acaso quisesse retornar ao palácio. O anel aí representa um ciclo ao qual a menina sempre retornará na busca de um amor, revivendo o Complexo de Édipo. Ao voltar passa o dia todo esperando a fera chegar, até o relógio bater nove horas (seria este o registro da idade de seu amadurecimento?). Após longa espera e procura, resolve ir procurá-lo no jardim do palácio, pois havia sonhado que o encontraria ali, “doente de desejo”, quase morrendo. Onde havia acordado sobressaltada chorando e refletindo; “Como posso partir o coração de uma fera que é tão bom pra mim”.Já começava aí a idealização, buscando em outro homem, o reflexo de seu pai, Bela amadurece e substitui o desejo incestuoso por uma forma indireta de realizá-lo amando outro homem, a imagem e semelhança de seu pai. A fera então se transforma em príncipe e os dois vivem felizes para sempre.

Segundo Bettelheim (1996) o conto de fadas é o espelho onde podemos nos reconhecer com problemas e propostas de soluções que só podem ser elaboradas na imaginação.

A moral dos contos de fadas é a que torna desejável o bem pela recompensa, sob a forma da posse do objeto da busca e pune o mal com o fracasso ou com a morte daqueles que se entregam à pulsão destruidora do id.



Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui