A cidade era pequena mas havia uma escadaria próxima à praça onde todos se encontravam para discutir assuntos irrelevantes. Havia disputa de dominó e quebra-braço, onde todos julgavam ser a melhor distração da pequena cidade. No entanto, a escadaria observava de longe e quieta, a movimentação elementar dos gestos e palavras articuladas de pouco enriquecimento linguístico. A escadaria era sempre observadora das dores das articulações alheias que a ilhavam com certo saudosismo dos tempos em que jamais pensaram que seria praticamente impossível alcançar-lhe o topo. Os cães, gatos e crianças brincavam nela e com ela aprontavam todas as peripécias típicas de seres inocentes. O casal de namorados usava seus degraus para torná-la fiel depositária das mais indecentes revelações e propostas inomináveis. Seus degraus ouviam atentamente sem que eles percebessem que ali haviam excelentes ouvidos. Eles se divertiam ouvindo tantas tolices e a validação do amor no concreto cimento de que eram feitos. Combinavam entre si, silêncio pois se a cidade soubesse de tantos segredos, jamais eles seriam anfitriões das nádegas alheias. Mas as crianças e os animais não paravam de brincar, entretanto o segredo era mantido e não haviam mentiras ou mesmo deboches. As crianças e os animais são a inocência em sintonia pura na melhor sabedoria.