Vejo a indignação que desperta a posição da Igreja diante da sexualidade, sua inflexibilidade em não admitir artifícios no tocante à vida em geral ( reprodução, aborto, clonagem, eutanásia, etc.).
Aprendi a compreender e aceitar estas posições graças ao bom senso de um velho padre holandes. Dizia ele existirem duas maneiras de - em nossa tradição cristã-ocidental – considerar a lei:
O modo germânico e o modo latino.
Ao latino apraz elaborar leis, as mais rigorosas e detalhadas possíveis. Mas não tem maiores escrúpulos em seu cumprimento.
Ao anglo-saxão repugna minúcias legais (vide constituições), mas as cumpre estritamente. Diante de dificuldades práticas quer primeiro que se mudem as leis. Adaptam as normas à realidade.
E a realidade muda.
Ora, a Igreja Católica expressa predominantemente a mentalidade latina. Rigor na formulação, laxismo no cumprimento.
Assim se compreende o antipático sacramento da confissão.
A suposição é de que todos somos pecadores. Sem nenhum complexo de inferioridade. É da condição humana. E podemos conviver com isso, pois seremos perdoados tantas vezes quanto quisermos. Já o protestante nórdico terá dificuldades em se aceitar como pecador, infrator da norma. Parco na legislação mas perfeccionista na prática. O católico latino se reconhece fraco, necessitado de perdão, incapaz de se auto justificar.
A lei católica portanto deverá ser interpretada como exigência máxima, um ideal a ser atingido, não como uma linha demarcatória que não deve ser ultrapassada. O ideal seria a sexualidade casta, fiel e responsável. Mesmo que 99% dos fiéis pouco se esforcem para atingir tal perfeição, conquanto saibam que o ideal existe. A lei é uma advertência permanente.
A consciência de ser pecador e assim carecer de uma maternal misericórdia da divindade, representada pela Igreja, explica a alma do católico latino. Já a luciferiana tentação seria rebelar-se contra a lei, uma vez que não tenho forças para cumpri-la.
O setor atlético se presta aqui para uma analogia. O record da modalidade será exposto como desafio ao competidor, ainda que este esteja longe de poder atingi-lo.
A interpretação usual que se faz da rigidez da lei católica deve pois ser revertida. A Igreja acolhe os pecadores. Os santos são reconhecidos como raras exceções, a serem rigorosamente escrutinados. Mas a missão da Igreja é apontar o ideal de santidade.