Tribos
Os fulô atacaram os haussa.
Num momento do mundo,
o historiador de plantão
registrou o fato.
Chovia? Era noite estrelada
ou tedioso dia?
Napoleão distante dormia?
Que foi na África, se sabe.
Motivos: talvez comida, retaliação,
invasão de território,
provocação de vizinho ou
apenas divertimento.
Os chefes não entraram para a
História, que dirá os guerreiros.
Gritaram slogans de ataque?
Saquearam os despojos?
Estupraram e mataram mulheres?
Riram à roda da fogueira?
Alardearam os malignos feitos?
O tempo encobriu tudo, menos
o breve registro.
E, à roda do seu calor morto,
com palavras dou vida ao evento.
O mundo sempre foi cheio de mongóis,
mouros, mandingo, bérbere (ou bárbaros?),
godos, visigodos, ostrogodos.
Os fatimídias de hoje moram
nas quitinetes de Copacabana.
Os otomanos tomam sorvete
no calçadão da Rua das Flores.
Os capetos jogam baralho
com os viquingues em cassinos
clandestinos. E perdem.
E sobram cholas, vândalos, hunos,
bizantinos em estádios de futebol e
shows de rock.
Nada se perde, nada se cria.
Embolamos anglo com saxões e
temos um império, incas tiram prata
do nariz da Estátua da Liberdade,
muçulmanos brincam de terroristas e
rezam pra matar e pra morrer.
Tudo se transforma em receita de
fazer jornal com fermento de
estranhas ideologias e tempero de sangue.
Tudo servido em porções pautadas
pelo consumo rápido e quente.
A História que coma depois. Frio
ou requentado.
E vomite pras futuras tribos.
Rui Werneck de Capistrano
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