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Cronicas-->O ANDARILHO DAS CIRCUNSTÂNCIAS -- 25/07/2001 - 01:02 (Marco Aurélio Bocaccio Piscitelli) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O Andarilho das Circunstàncias


Andar de pouco rumo, quase nenhum aprumo, idéias sem sumo, espremidas num canto da mente. Desse modo, alinhavava uma caminhada pelo fiapo da tarde. Contrastando com o movimento planejado dos outros pedestres, que cumpriam os últimos itens da agenda do dia, mais os acréscimos das demandas inusitadas, ele caminhava na contramão das intenções, serpenteando o labirinto das lembranças de um tempo que independia de marcação.

Titubeando pelas ruas, era como se acompanhasse Galbraith por sua era de incerteza. Caminhar ajudava a encontrar o próximo passo, assim como empurrava solo abaixo as sobras vivas do dia não-acabado. Desviando de pedestres, obras e trechos interrompidos, andava mais para os lados do que para frente. Isso quando o espaço livre não fosse rapidamente ocupado por um braço de panfleteiro enfiando uma lança no interior de seu corpo.

De longe, avistou uma praça. No olhar, foi reservando lugar para uma pausa muscular no único banco desocupado.

No movimento insosso das massas, um ou outro destaque puxava o seu olhar. Aquele velhinho tocando saxofone, com óculos negros, parecia mais interpretar a partitura da cegueira arrecadadora de fundos do que a de um trecho musical. O cameló que estendera uma toalha no chão, com quinquilharias de brilho falso, era como quem vendesse o que não comprara. Em meio a todo esse vaivém, havia até quem se plantasse por horas a fio em estátuas branquicentas, retirando passos do fluxo incessante. Um grande teatro ao ar poluído, que não cobrava ingresso, mas, quase sempre, aguardava por uma contribuição provisória de movimentação pelas ruas.

- Por favor, é por aqui uma agência de turismo? Fez um esforço para lembrar o nome e acabou apontando na direção do prédio. Quando a mulher deu-lhe as costas, percebeu que o local era agora ocupado por uma agência bancária.

Nem bem retomava o lazer privado do olhar descomprometido, alguém indagava sobre uma rua. - Não estou bem certo, mas acho que é no próximo quarteirão. Entre a primeira à direita, quebre a terceira à esquerda...depois... pergunte que não tem erro.

- O senhor tem horas? Informou a hora do relógio que voltara a trabalhar por sacudidas de bateria em hora de partida.

Alvo estático era como poste iluminado. As pessoas não haviam perdido nada naquele lugar, mas nele sempre buscavam abrigo para ler algum papel ou encontrar um elo perdido.

Ao longe, um cão esticou a guia de sua dona para vir tirar satisfação tão logo ali. Latiu, latiu, cheirou, tanto cheirou que ele até desconfiou do banho que acabara de tomar. A persistência do ato desencadeou o alerta máximo. De tanto ser esquadrinhado, passou a ser o esquadrinhador de si próprio. - Não fumo, não bebo, não uso drogas. Será que estou exalando cheiro de alguma doença?

Vozes e mais vozes. Gritos, também:

- Tem fogo?

- Graxa aí?

- O senhor me consegue vinte centavos para completar a passagem do meu ónibus?

- Olha a raspadinha! Todo o mundo raspando para ganhar na hora.

Sentado para espairecer e abstrair-se, convencia-se de se ter transformado em realinhador de destinos truncados, socorrista de almas penadas.

Era gente perguntando de tudo. Gente obtendo respostas para todos os gostos e desgostos. Gente que perguntava para ficar mal-informada e mal-humorada. Gente que perguntava para voltar a perguntar. Gente se oferecendo ao desconsolo do não.

Incomodado com as atribulações do ócio, decidiu retornar para casa. De livre para viver, o seu tempo não tinha mais nada. Os outros economizavam o seu; ele não conseguia gastar o dele. Assim como o Custo Brasil, existia o Custo Ócio. De graça, nem o banco da praça.

Marco Aurélio B. Piscitelli
bocaccio@terra.com.br
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