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Humor-->OS MINEIRINHOS - A INVASÃO -- 01/06/2000 - 22:10 (Mario Galvão) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Domingo de sol bem quente, muito quente mesmo.
Idos de março.
As águas do Sapucaí correm mansas.Todavia, na curva grande do rio, cheio pelas chuvas intensas, um rodamoinho voraz engole galhos e folhas caídas dos ingazeiros e de outras árvores que fazem sombra nas barrancas.
Ali é o poço grande, onde moram as traíras, bagres e mandi-guaçus de maior porte.
Os dois mineirinhos chegam até à beira, em silêncio, como se diferente pudera ser, cada um deles portando, igualmente, como se gêmeos nascidos, o mesmo chapéu de palha, a camisa xadrês quase igualzinha, botinas rangideiras e, ambos, embornais com garrafa de café e pão com mortadela pendurados no ombro direito.
Sem ruído, porque de nascença assim são, e também porque não querem espantar os peixes, agacham-se, cada qual escolhendo o seu lugarzinho. Vão desembrulhando a tralha de pescaria, ajeitando a latinha com minhocuçus e terra solta em torrões, as chumbadas ali, os anzóis aqui, alicate de cortar arame acolá, canivete e que tais.
As cigarras, zumbindo no oco dos páus da matinha da beira do rio, são o único som audível quilômetros em volta, no calorão da tarde: zzzzzzzzzzzzzzzzzzzz!!! zzzzzzzzzzzz!!! zuzuzuzuzuzuzuzuzuzu!!!!!!
Uma hora depois, dois mandizinhos estraídos da água, os mineiros continuam ali, visceralmente quietos, assuntando a chegada de algum peixe maior e, de quando em quando, jogando a linha com a isca neste ou aquele remanso mais promissor.
Lá pelas quatro da tarde, um deles, com fome, tira o pão com mortadela do embornal e, equilibrando a vara numa só mão, continuando agachado, ou melhor, de cócoras, vai engolindo o lanche.
O outro, sem dizer absolutamente nada, puxa também o lanchinho do embornal e começa a engolir, mastigando cautelosamente para não fazer qualquer barulhinho, o pão com mortadela, que diferente do do outro só tem um pouquinho de manteiga, colocado pela mulher mais zelosa.
Terminado o lanche, mais uma hora de silêncio absoluto, só quebrado por algum bem-te-vi que trina ali por perto do grande poço ou de um ploc ou tloc de um galho que despenca do alto de alguma árvore seca.
O sol começa a descambar no horizonte. De peixe mesmo, até agora, só três mandizinhos e um bagrão amarelo.
Ninguém diz nada, nem reclama, que afinal começa ao entardecer a hora boa para os mandí-guaçus que vem cheirar a água mais clara que chega do afluente transparente: o Rio Renó,adorado pelo pessoal que gosta de pegar umas piabinhas.
Só que pegar piaba exige muito esforço, vara mais longa e isca comprada na venda, queijo prato, que custa caro. Melhor ficar nos minhocuçus e esperar os mandis graúdos do anoitecer.
O sol está quase sumindo, quando uma sombra tapa o seu disco brilhante que ameaça descansar na morraria distante.
Um dos compadres olha prá cima, ou outro também o faz, curioso.
Um enorme elefante passa, voando, batendo as orelhas enormes de Dumbo: plá, plá, plá, plá...
E some no meio das árvores mais altas.
Os mineirinhos se entreolham, mas continuam calados.
Ninguém se aventura a dizer nada.
Quinze minutos depois, outra sombra enorme se antepõe ao disco solar.
É outro enorme elefante voador, batendo as orelhonas: plá, plá, plá, plá, plá, plá...
Agora o silêncio é quase sufocante, com os primeiros grilos aventurando-se a cricrilar nas moitas à beira do Sapucaí.
Uma sombra enorme escurece completamente a mata ribeirinha.
São mais de trinta elefantes, voando juntos, em manada aérea, batendo todos, quase uníssonos, as enormes orelhas de abano, voando como uma esquadrilha de bombardeiros da II Guerra Mundial, um barulhão de tremer a terra e fazendo ondular a superfície do rio, com a ventania:
PLÁ, PLÁ, PLÁ, PLÁ, PLÁ, PLÁ, PLÁ!!!
Um dos mineiros, depois de passar a elefantada toda voando, levanta-se calmamente, apaga a bita do cigarro para fumar metade mais tarde, apanha as tralhas de pesca, ameaça dirigir-se de volta para casa, mas resolve comentar alguma coisa com o compadre.
Voltando-se, diz para o outro, que também está juntando os "trem" prá ir embora:
"Ocê viu, cumpadre? O ninho dêles deve di sê prás banda de lá."
A noite cai de vez, em completo silêncio, enquanto os dois mineiros, caladinhos, somem na primeira curva da trilha mata adentro.
Falá prá mode quê?


Mário Galvão é jornalista e profissional de RP
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