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Artigos-->Retorno ao Reino da Marambaia -- 04/02/2004 - 11:57 (Aloysio Clemente M. I. de J. Breves Beiler) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Retorno ao Reino da Marambaia



Durante muitos anos quis conhecer a ilha de Marambaia, que fora em tempos remotos uma importante fazenda de café e entreposto do comércio de escravos. Hoje está sob o controle da Marinha e lá funciona um Centro de Adestramento. Entrei em contato com o comando daquela corporação e falando com o Comandante Lobo, um capitão-de-mar-e-guerra recentemente transferido para aquela unidade consegui a permissão para o embarque.

Disse-lhe o objetivo da visita e que era descendente do antigo proprietário daquela propriedade.

Fomos até Itacuruçá para o embarque na lancha da Marinha. Rigoroso controle de acessa às instalações é feito pelo Comando e durante o trajeto recebemos um rádio do para confirmar nossa presença na embarcação. A ansiedade era grande pois ia visitar um local que em tempos passados fora de propriedade do Comendador Joaquim José de Souza Breves, intitulado por muitos como "rei do café no Brasil Imperial".

A paisagem é belíssima e a brisa fresca da manhã na proa da nave me fazia lembrar das histórias contadas na familia. Em 1927 outro passageiro também fizera o mesmo trajeto, curioso com o destino que havia sido dado aquela propriedade. Foi Assis Chateaubriand o grande jornalista que movido pelas comemorações do 2o. Centernário da Introdução do Café no Brasil, desembarcara na ilha de Marambaia em busca das recordações daquele que foi um de seus maiores produtores.

Passamos por Jaguanum na Baía de Sepetiba e nosso barco repleto de jovens que pela primeira vez estavam indo para aquele lugar. Curiosos perguntavam aos mais veteranos como eram as instalações, o que se tinha para fazer, e como seria a longa estadia de estudos e aperfeiçoamento.

Alguns moradores da ilha viajavam conosco. Gente humilde que ia rever parentes ou simplesmente tinham ido às compras no continente.

Depois de quarenta minutos começamos a avistar a ilha, e pouco a pouco podemos ver sua topografia. A emoção bate forte nesse momento.

No desembarque eramos aguardados por um oficial, o Comandante Dejair - pessoa simpática e atenciosa que nos deu as boas vindas e nos levou numa camionete para a base da corporação.

Como era hora do café, fomos para o rancho. Os militares aproveitaram a antiga senzala dos Breves e preservando sua estrutura montaram um local para refeições e um mini-hotel de trânsito para os visitantes.

Após a refeição fomos para um encontro com o Comandante da Corporação, e no caminho pude observar a beleza da ilha. As instalações militares são simples mas extremamente limpas e bem dispostas. O carro seguia pela praia acompanhando a linha de coqueiros tendo ao fundo os morros com a mata atlântica que cobre toda a ilha. O ponto mais alta da ilha atinge os 500 metros e a vegetação é densa. No tempo do império o Comendador Joaquim Breves plantava café, milho e cana por toda ilha, inclusive nas encostas do pico.

Passamos pelo casario de oficiais e chegamos ao Comando. O Comandante nos recebeu em sua sala juntamente com o Imediato e conversamos sobre o passado daquela localidade. Ele é profundo conhecedor daquelas paragens e da história local. Ficou muito fácil a conversa. Deixei com ele um material impresso com fotos e textos sobre a família, e recebi um pequeno livreto sobre o Centro de Adestramento e sua história de fazenda de café antiga.

O oficial fizera uma rápida pesquisa nos cartórios de Mangaratiba e achou documentos interessantes da época que o café ditava os rumos econômicos do Império.

Após o almoço servido na senzala transformada, fomos dar um passeio pela vila. O tempo ruim prometendo chuva dificultava nossas intenções, que era visitar a praia de Armação. Só haviam duas opções: caminhar por uma trilha no meio da mata por cêrca de uma hora ou pegar carona numa embarcação até lá.

Caminhando pela praia chega-se a uma pequena igreja e um colégio, que aquela hora estava cheio de alunos. Também existe um pequeno posto de saúde para o atendimento dos moradores. A vista é maravilhosa e a paz enche o lugar.

Saindo deste pequeno povoado seguimos uma trilha de terra que adentra os manguezais no entorno da ilha. Perguntamos a um morador quem era a pessoa mais antiga da região. Disse o homem que seguíssemos em frente que daríamos em uma casa. Chegamos até lá.

Atende-nos um senhor de cabelos brancos, Sr. João que nos diz estar com 75 anos. Falei sobre minha família, os antigos proprietários da ilha e restinga. Ele pediu que aguardássemos e retornou com um retrato pequeno, uma cópia de uma fotografia de Joaquim Breves. Era uma reprodução tirada provavelmente de algum livro. Falou que seu pai o conhecera.

Duvidei da afirmação e perguntei-lhe se conhecia alguém com mais idade, morador da ilha que pudesse nos fornecer maiores informações.



- Dona Caetana! disse ele. O sr. ande mais um pouco por essa trilha que vai ver a casa dela. Deve ter uns cem anos, riu o velhote.



Agradecemos e saímos em direção ao local apontado. Mais vinte minutos de caminhada chegamos à casa de Dona Caetana. Um de seus filhos vem nos atender.

Logo após chega a velha senhora. Disse ter 84 anos. Parecia forte e com saúde. De pés no chão com o olhar baixo, ouviu minhas explicações. Quando lhe disse que a ilha pertencera à minha família em tempos muito distantes, perguntou:



- Que família?

- Breves, falei.



O olhar e a compostura da senhora se alterou. Parecia assustada e nervosa. Sorrindo tentei acalmá-la dizendo que não viera reaver a propriedade, e que Joaquim Breves já desaparecera há muito.

Perguntei-lhe então como era o nome de seu pai.



- Adriano, respondeu.

- E o de seu avô?

- Gustavo Vítor.



Dessa vez quem ficou surpreso fui eu. Repetia-se a história de Assis Chateaubriand. Ele em 1927 encontrou-se com dois ex-escravos do Comendador Breves residentes na ilha. Eu encontrava-me com a filha e neta de um deles.

Dona Caetana tinha boa memória e contou-nos que seu pai conhecera o latifundiário. Repetiu a afirmativa de seu avô, que Joaquim era bom. Bondade essa que muitos historiadores atribuem ao fato da ilha e restinga de Marambaia ter sido comprada por Joaquim para servir como quarentena do tráfico de escravos, que recebiam boa alimentação para recuperação da longa viagem até o Brasil, para então subir a serra fluminense em direção aos cafezais.



Agradeci muito a informação e tirei com sua autorização algumas fotos. Saímos dali reconfortados, pois a história estava viva. Atualmente os ilhéus descendentes dos antigos escravos dos Breves reclamam a posse da terra, vivem da pesca e a Marinha faz vista grossa.



A velha senhora respondeu quando lhe perguntei como vivia:



- Como Deus quer!



A simplicidade, o rústico, as pessoas, os peixes e a rica fauna, sem dúvida, formam aquele belo teatro natural.

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