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Artigos-->Mário Peixoto - O Limite do Cinema Nacional -- 04/02/2004 - 22:35 (Aloysio Clemente M. I. de J. Breves Beiler) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Ao folhear a revista "Veja", edição de 12 de fevereiro de 1992, deparei com a notícia de falecimento do cineasta Mário Breves Peixoto, em 2 de fevereiro do mesmo ano. Considerado por muitos como "o pai do Cinema Brasileiro" minha surpresa foi maior verificar que na fotografia estampada na revista, aparece o cineasta tendo ao fundo não muito visível, dado as dimensões da foto publicada, o único quadro a óleo do Comendador Joaquim José de Souza Breves.



Durante muito tempo procurei incansavelmente por esta e por outras telas representativas dos Breves mais antigos. Resolvi partir para a descoberta do quadro em questão. Endereço do cineasta na mão em Setembro cheguei ao apartamento de Mário Breves Peixoto onde fui recebido por seu afilhado Arleu.



Ao entrar naquele apartamento em Copacabana, logo no hall estava a tela do Comendador Joaquim Breves, sem a moldura, colocada em cima de um aparador .



O Sr. Arleu é uma pessoa muito afável, tendo 65 anos, mora com seu filho e nora no apartamento que foi de Mário Peixoto. Deixando o hall de entrada dirigimo-nos para a sala principal, onde domina o ambiente uma tela de dimensões enormes, representando o cineasta ainda bastante jovem, com a moldura retirada da tela que estava no hall. Perguntando ao Sr. Arleu porque havia retirado a moldura do quadro do Comendador Joaquim Breves, ele me disse que o quadro precisava de restauração e a moldura ainda estava bastante bôa, apesar de já contar com mais de 160 anos (provavelmente foi pintada em 1829).



"A figura do Comendador Joaquim Breves representava muito para Mário", me disse Arleu. Entretanto, para Arleu a figura de maior importância era a do próprio cineasta, por quem nutriu durante toda a vida grande carinho e admiração, e por isso tinha mandado pintar aquela tela, pagando um alto preço e usando a moldura do quadro de Joaquim Breves.



Para horror dos puristas continua o Sr. Arleu: "Esta moldura era toda em decapê em tons claros. Mandei envernizar pois não gostava do estilo."



A tela de Mário Peixoto foi pintada a partir de uma fotografia, que segundo Arleu, fôra tirada num dos inúmeros passeios que fizeram juntos. A pintora hábilmente, retratou-o sentado numa amurada de mármore, tendo ao fundo os jardins, com várias estátuas gregas, de seu sítio "O Morcêgo" na Ilha Grande.

A mansão do Morcêgo, como é chamada, está localizada na entrada da Enseada do Abraão, junto à Praia do Morcêgo, e é circundada por densa mata tropical. Sua construção é retangular, com curvatura selada e telhado em 4 águas, que se aproximam nos quatro cantos dos beirais, como ornamento de tenda árabe. Guarda um rico acervo, que incluem peças de mobiliário, louças, estátuas, e objetos de arte religiosa, reunidos por Mário Peixoto, seu antigo proprietário. A lenda atribui a Juan Lorenzo, pirata espanhol, a construção da casa no inicio do século XVII, utilizando-se de madeira da região. Em 1942 foi tombada como patrimônio histórico.



O Sr. Arleu me contou diversas histórias sobre o cineasta:



"Mário foi um humanista, um artista incompreendido. Nunca foi lhe dado o devido valor."



Contou-me também que no início da doença, Mário foi obrigado a vender o sítio da Ilha Grande para poder honrar seus compromissos e se manter, uma vez que não possuía qualquer rendimento. Mário tinha investido uma fortuna considerável na reforma do "Morcêgo", estando o mesmo quando de sua venda repleto de obras de arte - mobiliário antigo, pratarias, telas, louças importadas - recebidas de herança, ou adquiridas posteriormente. Um membro da família Klabin é o atual dono desta riqueza.



Durante muitos anos, Mário Breves Peixoto ajudou com seu prestígio a cidade de Mangaratiba. Com certa mágoa, Arleu disse que fora montada uma Fundação em Mangaratiba que leva o seu nome. Funciona no solar do Sahy e presta um excelente trabalho, preservando um pouco daquele que foi durante décadas a mola propulsora de seu desenvolvimento – o Comendador Joaquim Breves.



"Estou passando todo o material que resta e pertencia a Mário, para o Walter (Walter Moreira Salles - do Unibanco), pois foi o único que acompanhou e prestou auxílio a Mário em sua desdita. Ele, Walter, ficou de montar uma sala, num prédio do Unibanco, que levaria o nome de Mário Breves Peixoto e reuniria todo o material de cinema, objetos pessoais e a extensa biblioteca, com volumes ainda inéditos de sua obra."



O Sr. Arleu relata que o cineasta havia retirado da Fazenda da Grama, em Passa-Três, várias telas, estátuas e algum mobiliário na tentativa de preservar o pouco que sobrara. A maior parte das telas, representando membros da família Breves, foram entregues ao Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ficando depositadas num porão daquela entidade por mais de 20 anos. Por pouco não se perdeu tudo. Mário foi avisado por um restaurador daquela entidade para que retirasse suas telas pois tudo estava se perdendo por falta de cuidados.



Arleu me disse que uma das telas, que representava uma Nossa Senhora com o Menino Jesus na mão, foi levada para a Ilha Grande, mas não era mais possível recuperá-la, pois a tinta estava se soltando, devido aos longos anos exposta à umidade. As outras telas foram doadas ou emprestadas para outras instituições.



Fizemos uma pequena pausa em nossa conversa para que eu pudesse fotografar ambas as telas. Notei que o retrato de Joaquim José de Souza encontra-se bastante deteriorado, atacado por fungos e cupins, e perfurada a tela em alguns pontos. Trata-se de uma tela pintada à óleo, sem data e assinatura, de mais ou menos 1,50 x 1,00 metros. Tirei algumas fotos da tela que se encontra na sala principal, e por causa da luminosidade, levamos a do Comendador para uma área externa para que pudéssemos fotografá-la melhor. Não sou profissional em fotografias, mas o resultado me pareceu bastante bom.



Retornando ao interior do apartamento, falamos também sobre o relacionamento da família com Mário:



..."Por seu comportamento esquisito, poucas vezes foi procurado. Uma vez seu irmão Octávio esteve com ele. Mário me apresentou dizendo mais tarde: ... é meu irmão porque temos o mesmo sangue. Vemo-nos de 20 em 20 anos.



Não achei estranho, esse comportamento "esquisito" relatado por Arleu, pois trata-se de uma característica comum aos Breves, isto é: o comportamento arredio e bizarro, chegando mesmo a extravagância, e a tendência ao isolamento.



Prosseguindo o relato:



"Mário foi um homem rico, de muitas posses. Quando sua avó, faleceu em Petrópolis, foi chamado para a partilha do palacete da Avenida Koeller. "



... não quero imóveis, pois para mim não tem valor nenhum. Me interesso apenas pelos objetos do interior da casa.



Foi lhe dado então a oportunidade de escolher o que quizesse.



Como afirma a revista, "Limite", rodado no início dos anos 30 em Mangaratiba, com roteiro, direção e montagem do próprio Mário, entrou para a história do cinema brasileiro como uma de suas maiores lendas. Com ambições filosóficas de traduzir em imagens o naufrágio da existência humana, Limite foi considerado uma obra de gênio, que poucos viram ou conseguiram entender. Sua cadência fúnebre, com composições rígidas e enquadramentos estáticos, atrairam a atenção dos críticos da década de 30, que o classificaram como a melhor contribuição brasileira para o vanguardismo internacional da época. Uma das mais famosas histórias sobre o filme dizia que, depois de assisti-lo em Londres, em 1931, o cineasta russo Sergei Eisenstein escreveu um artigo no qual se derramava em elogios. Mais tarde, trocando o cinema pela literatura Mário escreve "O Inútil de Cada Um", seu único livro, publicado em 1984, reúne segundo o autor, as idéias de Limite.



Arleu, disse-me que existem mais 5 volumes da obra " O Inútil de Cada Um", que Mário pedia que fossem publicados após sua morte. Esperamos que o Sr. Walter Moreira Salles se interesse pela publicação, visto que, encontra-se em suas mãos os originais.



Existem controvérsias sobre a data de nascimento de Mário Peixoto Breves. Dizem alguns que, teria nascido em 1908 em Bruxelas, mas há quem diga também, que teria nascido em 1918 no Rio de Janeiro. Pelo que pude apurar junto ao seu afilhado Arleu, Mário nasceu em Bruxelas em 1908, e juntamente com seu irmão Octávio, estudaram na Europa durante muitos anos, na Inglaterra e Suíça.



Falecido o cineasta deixou como herança poucas posses. Os quadros foram para uma galeria em Copacabana, um testamento a ser cumprido, pois nêle Mário solicitava um túmulo em mármore com clarabóia para que pudesse ver o céu, e a escultura de um cão sobre a lápide.

Bizarrices da família Breves que Mário cultivava.



Voltei a procurar o Sr. Arleu no apartamento de Mario Peixoto, tempos mais tarde e então ele me levou até uma galeria em Copacabana, e pude ver o conjunto de 7 retratros: Comendador Joaquim José de Souza Breves, Barão de Piraí - José Gonçalves de Morais, Baroneza de Piraí - Cecília Pimenta de Almeida Frazão de Souza Breves (irmã do Comendador); do Comendador José de Souza Breves (irmão de Joaquim); de um filho de Joaquim (José Frazão de Souza Breves); da mulher e filha dos barões de Piraí - Maria Izabel de Morais Breves e de Rita de Moraes, filha dos barões e esposa de José. Apesar de alguns não estarem assinados, vê a assinatura do pintor preferido da Côrte Claude J. Barandier. Fiquei extremamente emocionado. Os retratos de família finalmente haviam sido achados.



Arleu disse-me que gostaria muito de vender as telas, pois precisavam de restauração urgente.



Entrei em contato com o Embaixador João Hermes, e fomos até a galeria de Copacabana. O diplomata e sua esposa ficaram encantados com os retratos. Arleu nos acompanhou e ficamos de retornar com alguma solução.



Os retratos tiveram um destino adequado, graças, é bom sempre reiterar a iniciativa pessoal do diplomata João Hermes., que em contato com o IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, envidou todos os esforços para que nada se perdesse.

O IHGB adquiriu os retratos, que se encontram em restauração.



O resgate dos retratos mereceu notícia no "O Globo" através do jornalista Elio Gaspari:



“Uma bonita história de cavalheirismo e cultura"



Numa época em que o Abaporu acabou leiloado em Nova York e arrematado por um colecionador argentino (US$ 1,5 milhão), aconteceu ao único retrato a óleo do comendador Joaquim José de Souza Breves, um dos homens mais ricos do Império, uma bela história da cultura dos cavalheiros, aquele gênero em que o conhecimento anula exibicionismo e dinheiro.

... Do rosto do comendador há dois registros, um desenho e uma fotografia. Ambos deles já velho. Conhecia-se um óleo do fazendeiro quando jovem, mas sabia-se apenas que ficara com mais um de seus descendentes, o cineasta Mário Peixoto (“Limite”).

...um antiquário da Rua Figueiredo de Magalhães, em Copacabana, tinha sete quadros do acervo da fazenda de Breves. Entre eles o óleo do comendador. Estavam sem moldura, escurecidos. Havia também um retrato do Barão de Piraí, pintado pelo frânces da moda no Vale do Paraíba.

... O embaixador João Hermes Pereira de Araújo, um dos maiores conhecedores da política e da cultura do Império, acertou o preço com o antiquário que guardava o lote herdado por Mário Peixoto e escreveu ao presidente do Instituto Histórico e Geográfico, Arno Wehling. Pouco antes do Natal, o IHGB comprou as sete pinturas. Custaram R$ 5 mil, serão restauradas e ficarão expostas numa sala do Instituto. Caso de gente que tem gosto em fazer um grande negócio para o público. (Elio Gaspari - “O Globo” (Domingo -14 de janeiro de 1996).



Os retratos foram restaurados em 2003, merecendo uma sessão especial do IHGB, na qual falaram o Presidente do IHGB - Arno Frering, o escritor Tasso Fragoso e o autor desse artigo. Estão em exposição permanente para o público e compõe o acervo daquela instituição.

(Aloysio C M I de J Breves Beiler – Setembro 1992)

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