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cronicas-->33. O ASSALTO À FORTALEZA -- 10/08/2001 - 07:01 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Quando estive internado na carne, não admitia a hipótese de ser assediado por nenhum espírito maldoso, estivesse vivo ou não. Estabeleci para comigo que minha alma seria fortaleza de amor, defendida dos vícios por todas as virtudes. Era sonho de criança, fundamentado em historinha que ouvi repetidas vezes, pela voz condescendente de minha irmã mais velha. Eu e os demais pimpolhos de mesma idade.

Entretanto, quer parecer-me que as lérias romànticas do entrecho se fixaram profundamente só em mim, sonhador e místico, que jamais pude entender que os males existem para se constituírem nas provas da experiência.

Mas o sonho infantil não teria tido sucesso, se não fosse eu predestinado a vida pacata e séria de organizador público, sentado em cadeira da administração, de onde fazia emanar ordens superiores, com regularidade e eficiência.

Resisti o quanto pude às ofertas de subornos, mas fui conivente com as que serviram aos chefes, jamais interferindo no que quer que fosse de que tivesse conhecimento. Nada desejava a mais, todavia, agarrava-me ao emprego com surpreendente tenacidade para quem elegera a virtude como apanágio da alma e sedimento das atitudes.

De religião em religião, cheguei ao kardecismo pela via natural da dor, ao perder filho muito amado. Passageira condição de ingresso, adentrei a casa espírita como se lá tivesse nascido e me criado.

Afoito de início para conhecer o paradeiro da criança, fui compreendendo as normas evangélicas ali praticadas e difundidas. Ao conhecer a necessidade do exame detido da consciência, fui capaz de perceber que errara profundamente ao ter deixado passar sem denúncia os malfeitos da repartição. Senti a fortaleza ameaçada, ainda mais porque foi ao tempo da aposentadoria e não poderia reparar os erros.

Não tive dúvida, contudo, em romancear os fatos e em redigir obra em que evidenciava todas as mazelas do poder burocrático.

Por razões de prudência e pelo profundo respeito que adquirira em relação aos orientadores espirituais do centro, antes de levar à publicação o escrito revelador, cismei de consultar os protetores, para que me fizessem sentir até que ponto haveria real necessidade de desfazer o tremendo engano de que me tornara vítima.

A resposta não se fez esperar, mas continha certos conceitos enigmáticos, como se não dependesse deles a decisão definitiva da publicação. Entre outras observações, destacava-se a de que tudo o que pudesse dizer não iria, à vista desse mesmo fato, ser apagado de minhas recordações. Se fora prudente em consultá-los, que também me estimulasse para o perdão, não dos que fazia representar como vilões na narrativa, mas de mim mesmo, que não me sentia acomodado, conforme os rígidos padrões que tão elementarmente estabelecera como norma de conduta moral. Afinal de contas, terminavam, era passado a cavalaria andante.

Mas o trabalho estava feito e me demandara muito tempo, durante o qual se me cristalizara na mente a idéia de obra-prima. Alguma coisa parecida com a ànsia que se tem de demonstrar os resultados das sessões de psicografia.

Resolvi esquecer as sábias recomendações e me atrevi a buscar editor idóneo, que se interessasse pela divulgação do trabalho. Evidentemente, ninguém quis bancar a editoração, especialmente pela fraqueza estrutural da narrativa. Como último recurso, procurei a imprensa do periodismo jornalístico, para, quem sabe, conseguir reprodução da peça, mesmo que folhetinesca.

Houve quem tivesse a boa vontade de sugerir alterações substanciais, para que o texto ganhasse notações de reportagem, a ponto de se refazerem os fatos, eliminando o romanesco, para, inclusive, se darem os nomes próprios das criaturas reais camufladas pela fantasia.

A princípio, a idéia pareceu-me bem espontànea e muito mais próxima da verdade.

"Quem fez", pensava eu inconsequentemente, "um dia ou outro terá de pagar. Que seja o quanto antes, pois, no Umbral, as coisas poderão ficar muito mais negras."

Elaboradas novamente as matérias, antes de assinar o contrato e o termo de responsabilidade com que a empresa desejava evitar qualquer ação judicial contra si, temeroso das repercussões entre os antigos colegas de repartição, fui, de novo, em busca da aprovação dos mentores espirituais.

Agora os dizeres nada tiveram de misteriosos: que voltasse aos bancos da evangelização, pois a fortaleza havia sofrido investidas perigosíssimas e a defesa estava prestes a ceder passagem aos piores inimigos da integridade moral.

Recuei a tempo de assumir a responsabilidade das publicações, mas os jornalistas, levados pela incontinência que faz da profissão uma das mais temerárias do século das comunicações e da informática, decidiram levar avante o plano das acusações, ampliando a investigação e levantando documentos comprobatórios do envolvimento de diversos dirigentes do setor público, inclusive incriminando-me, por não ter dado conhecimento das falcatruas.

Fiquei alucinado quando me revelaram as intenções. Felizmente, tudo deu em água de barrela, pois a doutrina ideológica dos responsáveis pelo jornal, naquele instante, estava em aliança com o governo. Fui salvo pelo gongo, no último assalto da luta.

Imediatamente, motu proprio, sem pesquisas espirituais junto aos orientadores, deliberei revelar aos antigos companheiros de trabalho os riscos pelos quais estavam passando. Nada lhes escondi, nem mesmo a minha falta de caridade, e supliquei-lhes que me perdoassem e, se fosse razoável a solicitação, que se integrassem comigo no kardecismo.

Evidentemente, fui mal compreendido e só obtive deles muita prevenção e diversas ameaças. Não fora o abnegado trabalho a que me dediquei a partir de então e não teria tido sossego moral até o final dos dias.

Mesmo após o desencarne, por muito tempo, fui perseguido por maldosas vibrações, tendo sido difícil compreender que, embora não me tivesse exposto tanto, teria sido assombrado, do mesmo modo, pelas críticas ferozes que sempre realizei contra os corruptos e corruptores.

Lembrando-me dos escudos de virtude e do castelo de amor, pude sofrear os impulsos de maldade do coração e consegui recuperar-me para o serviço socorrista junto a esta instituição espiritual.

Diante desta folha passada a limpo, temo que não tenha sido a exposição suficientemente clara e, por isso, ineficaz para o objetivo da exemplificação a que almejava. De qualquer forma, desejo vivamente demonstrar o interesse em revelar somente as raízes das crises conscienciais, rogando aos irmãos que desconsiderem todas as informações relativas àqueles cujas intenções não se coadunavam com os ditames evangélicos.

Guarde-nos o Senhor de julgar as pessoas e ampare-nos sempre nas iniciativas de auxílio e esclarecimento!

Otacílio.

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