O que me resta além de escrever? Deitada em uma cama que não é a minha e com tempo sobrando para não fazer absolutamente nada. Pensar! Diria você, mas evito aguçar a imaginação que cruza mares até onde nenhum dos olhos podem seguir.
Já reparou que a solidão é maior em um quarto estranho? As paredes não guardam segredos, os móveis não dizem nada, nem um objeto faz lembrar vida. Por isso a alternativa é escrever.
Só o cigarro parece meu companheiro. Quantos amores deixei, quantas pessoas amei e ele, o objeto do desejo, continua ao meu lado. Sim. Para depois do sexo, como havíamos comentado. Mas não só. O cigarro escuta minha lamuria silenciosa. Repara que não tenho paciência para decifrar suas cinzas.
Leio notas sobre a vida de Rimbaud. O jornalista que escreveu a matéria parece estar com inveja do francês. Comenta: “Rimbaud erra no deserto!” Quem disse? E quem errou afinal?
Será que, se Rimbaud fosse vivo, faria sexo comigo? Até porque esse quarto parece perfeito para ele: bebidas, cigarros, solidão. Uma mulher que escreve sem saber exatamente o que. E papéis, muitos papéis para serem lidos, revisados ou escritos. Pensando bem, eu seria a última tentação de Rimbaud por aqui.
“Você é eternamente instável” , me diria o poeta entre olhares salientes para minha tão complexa bunda. Ah, como gostaria de ouvi-lo falar assim! Talvez revidasse, contando à ele como gosto de homens instáveis. Passaria minhas mãos em seu cabelo loiro e imaginaria por quantas temporadas passou no inferno. Poderia enfim, ameaça-lo: se você me amar, agora e enfim, saberá como é o inferno.
O quarto sussurra para que eu pare de brincar. Quem disse que não iria aguçar minha imaginação? Faço isso até não saber para onde vai minha mentira.
O francês exausto na cama poderia me olhar e dizer (bem adaptado ao nosso tempo): Ingrid, onde fica o reino de possibilidades em você?
Oh, Senhor Rimbaud , quisera eu saber!!!
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