O BOLO-REI
Era assim chamada uma padaria na esquina de casa, onde nem bolo havia. Pães de todo tipo se via, dos filões aos pãezinhos, trançados ou enroladinhos, cheios de creme ou morenas bisnaguinhas. Alguns mais altos, fofinhos, atreladas feito binóculos perfilavam-se ao lado de douradas broas de milho. Lá de dentro da vitrine enormes sonhos piscavam pra mim. Dizíamos, por brincadeira, que tão grandes assim, nem conseguiríamos comê-los. De sonhos passariam a pesadelos.
Eu achava estranho, naquela época só encontrávamos bolos prontos em confeitarias. Recheados, cobertos com chocolate ou chantili, cheios de cerejas a enfeitá-los. O que seria esse bolo-rei ? O rei dos bolos ?... Eu perguntava, e o padeiro português só dizia que o “bolo-rai” era o “bolo-rai”, ora!
Um dia o estabelecimento fechou, ou se mudou. A velha casa demolida, no terreno um prédio se levantou. E nós, órfãos de pães, tivemos que procurar, em outro lugar, a fonte do alimento secular. Lá se foi o bolo-rei a voar...
Mas o nome, esse ficou na minha cabeça, volta e meia a batucar. Até que finalmente, uma hora descobri. Vem da tradição europeia, que não temos por aqui.
Por acaso lembrei-me da “galette des Rois”, uma torta que os franceses fazem para o dia de Reis. Taí, em Portugal...
Beatriz Cruz
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