Nunca fui funcionário dos correios mas já fui mordido por um cachorro.
Não vou dizer o lugar da mordida apenas por um simples motivo: não quero. Entretanto, e disso lembro-me bem, o tal bicho encheu a boca, sem dó. Doeu.
Apesar da dor sentida, por um motivo que até hoje eu não consegui entender – talvez o cão não gostasse de moleques gordinhos, que carregassem uma lancheira do Fofão – apesar da dor sentida, gosto de escrever sobre esse animal.
No entanto - pois preciso ser verdadeiro, caso contrário a leitora ou leitor poderá deixar de confiar em mim – no entanto, quando encontro uma raça de grande porte pela frente fico meio ressabiado. Nesses momentos, para que volte minha valentia e robustez só mesmo quando estou frente a frente a um pequinês da vida. Olho-o de cima e faço uma cara de quem está falando: "O que foi?? O quê que há??" e o bicho fica quietinho, quientinho. Mas não posso ficar convencido, pois essa atitude não é 100%, alguns danadinhos rosnam, latem, intimidam-me e sou obrigado a correr.
Mas, independente de minha frescura ou covardia, o fato é que dia desses um cão que vivia esplendidamente, como um príncipe, e que por isso era invejado por todos os tomba-latas e vira-folhas das redondezas, recebeu um suculento osso para um tira-gosto, pois o almoço ainda estava por vir e prometia muito, por conta de um churrasco do dia anterior.
Pois bem, o osso era realmente um espetáculo, com muita carne e também alguns buraquinhos nas pontas, que escondiam mais carne ainda. Ótimo para cães, que gostam de chupar osso, fazendo aquele barulho horrível – pior que isso só mesmos as pessoas que gostam, ou precisam, chupar o buraco no dente.
Enfim, o tal cão privilegiado, receando ser importunado por outros cães - que estavam sempre ali por perto, e que tinha narizes gelados, segundo algumas cadelinhas de madame - saiu de mansinho, carregando na boca o seu quinhão, a fim de comê-lo bem longe dos olhares pidões dos companheiros.
Para chegar num bom lugar teria de atravessar uma pequena ponte, construída sobre o riacho cristalino que por ali corria.
Não pensou duas vezes, queria ocultar-se dos outros animais. Já no meio da ponte olhou para baixo e viu refletida na água límpida a sua própria imagem.
Como um estúpido, e isso não é apenas atitude dos cães, julgou estar diante de outro cão que, como ele, também carregava na boca o seu osso. Apenas havia uma diferença: o osso do outro se apresentava muito
maior e, portanto, melhor ainda do que aquele que levava.
Ganancioso, e mais uma vez isso não é apenas coisa de cão, cobiçou o osso do suposto companheiro e
decidiu latir com toda valentia para intimidá-lo.
Mal abriu a boca tentando amedrontar o parceiro, o seu próprio osso caiu na água e se perdeu para sempre.
Pois então, os cães sempre estão ensinando os homens a não serem animais. O grande Cony, e seu caso público com a cadela Mila, que o diga.
Não é assim que é a vida?
Anderson
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