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Contos-->O que você teme? -- 28/04/2000 - 15:47 (Fábio Robson Massalli) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O QUE VOCÊ TEME?
Fábio Massalli

- O que você teme?
Ele ouviu novamente esta pergunta ao telefone. Depois mais nada. Quem quer fosse desligara antes mesmo dele esboçar uma resposta.
Era sempre a mesma voz. Uma voz de homem, rouca e grossa, ao mesmo tempo maquiavélica, demoníaca e quase sensual. Chegava quase a ser etérea. Era um tipo de voz que, se alguém a ouvisse uma vez jamais a esqueceria. Poderia esquecer-se do seu dono, mas jamais da sua voz.
E era esse o seu purgatório. Havia meses que vivia a mesma tortura psicológica de um inimigo desconhecido. Alguém tão desconhecido que nem mesmo poderia descarregar-lhe seu ódio. direcionar-lhe, por nome ou feição, as maldições e injúrias. Era apenas uma voz pelo aparelho de telefone. Uma voz que perseguia-lhe por todos os esconderijos em que se achava seguro. Não importava se erra em seu trabalho, em seu lazer ou em seu descanso. Onde quer que estivesse, fosse na reserva privativa de seu lar, enquanto tentava descansar ouvindo jazz e blues sentado em uma poltrona numa sala semi-escura, fosse no meio de uma danceteria com música eletrônica repetitiva onde, no meio de centenas de pessoas apertadas, era descoberto e induzido, levado ao telefone, onde sempre ouvia uma única e rápida frase.
- O que você teme?
Depois nada mais. Desligado.
Tentara mudar de número. Não adiantou. De alguma forma o misterioso perseguidor, este ser de poderes visionários que seriam fonte de inveja a qualquer dos grandes profetas e advinhos da história, conseguia não apenas o novo número, mas também os horários em que poderia encontrá-lo e não se visse obrigado a falar com a impessoalidade e a desumanização de uma secretária eletrônica. Era verdade. Jamais encontrou, em tempo algum, mensagem alguma em sua secretário fazendo aquela fatídica pergunta.
- O que você teme?
Sempre falara-o diretamente. Encontrava-o nos mais variados e diferentes locais, nas mais impróprias horas de visitação. Fosse em uma igreja de madrugada, em um bordel ao meio-dia ou em seu trabalho num sábado ensolarado. Encontrava-o e depois sempre a mesma coisa.
- O que você teme?
Depois o silêncio do tuuu, tuuu do telefone desligado.
Pensara em todas as alternativas possíveis. Em todas as pessoas que poderiam ser a culpada daquele crime infame. Lembrou-se de todos os seus conhecidos, mas descartou-os logo. Não por não poderem fazer uma troça destas, mas porque nenhum teria a paciência de levá-la por tanto tempo, sem, nem mesmo por uma vez, ter tido a ousadia e a oportunidade de vexá-lo em sua angústia. Além disso nenhum tinha uma voz com aquela tonalidade e com aquele poder de sedução.
Imaginou, talvez, por alguns instantes, na possibilidade de alguma ex-namorada, paixão ou caso que estava se vingando com a ajuda de um cúmplice qualquer. Novamente rejeitou a alternativa. Esta não seria o tipo de vingança que lhe traria o gozo pelo mal, pela dor e pela humilhação a que foram submetidas. Não. Como boas personagens shakespeareanas idealizariam vingança muito mais complexa e de resultados mais efetivos que todo este trauma a que estava sendo submetido.
Jornalista que era, chegou até a imaginar a possibilidade que alguma matéria de sua autoria pudesse ter perturbado os interesses de alguma figura importante e poderosa, ou ele estar chegando perto de algum furo jornalístico de grandes proporções. Isso explicaria a rápida descoberta dos novos números de telefone, mas do mesmo modo que explicava muita coisa, a lógica transformava esta idéia em um simples sonho de desespero.
Se alguma notícia de sua autoria tivesse incomodado alguém importante provavelmente ela não teria sido publicada, pelo grande atrelamento e dependência monetária daquele jornal às empresas e ao governo. E mesmo que saísse, tentariam comprá-lo ou intimidá-lo, numa prática que ele mesmo já testemunhara do depoimento de colegas que, surpreendente, conseguiram facilidades. E isso nunca aconteceu. Nunca teve a chance de testar seu idealismo e honestidade estudantil. Testar se seria forte para resistir às tentações do capital, o que, em seu íntimo nas noites solitárias onde ele era sua própria testemunha e seu próprio juiz e não havia nem mesmo o eventual ronronar de um corpo ao lado, duvidava. Além disso, no último ano, só escrevia matérias banais sobre assuntos que não lhe despertavam interesse algum. Há muito não escrevia sobre algo que realmente lhe agradava. Alguma denúncia pública, escândalo político ou algo com um pouco mais de emoção e feeling jornalístico.
E continuava a ser a vítima indefesa, por mais que isso lhe causasse repulsa, daquela maníaca, insistente e curiosa voz. Era isso uma das coisas que mais lhe aborrecia. Não tinha como se defender. Não tinha como contra-atacar. Não tinha nem mesmo como esquematizar alguma tática militar para um ataque rápido, fulminante e glorificante. Estava totalmente indefeso. Não tinha nem mesmo um inimigo real, algo palpável. Era apenas uma voz, uma voz e nada mais.
- O que você teme?
Uma voz de uma frase única. Sempre ao mesmo tempo, com a mesma duração e com a mesma interpretação. Como um filme que repete sempre a mesma cena ou um velho disco de vinil riscado, tocando eternamente o mesmo trecho de uma canção.
Talvez até mesmo a mesma canção que ele ouvia, bem baixinho, quase imperceptível, vinda da sala ao lado, enquanto ele trabalhava na tarde de domingo na redação do jornal.
Já estava com seu trabalho adiantado. Já colhera todo o material, fizera as entrevistas e visitara o local. Alguma matéria insípida sobre as feiras de artesanato das manhãs de domingo. A matéria já havia nascido em seu computador e já passara da puberdade e avançava na idade adulta. Em breve estaria em sua velhice e em seu próprio fim.
- Pazilotti! Telefone!
Aquele grito praticamente tirara-o de um transe. Praticamente se assustara ao voltar à realidade da redação do jornal. era Antônio Hara quem lhe chamava. Antônio Hara, o fotógrafo que trabalhara com ele naquela manhã, na feira, e agora, depois de ter acompanhado mais dois repórteres e fotografado para suas matérias, esperava apenas alguns minutos, lendo algumas notícias em jornais policiais, antes de ter sua carga horária cumprida e se ver liberado para deixar a redação do jornal e finalmente abandonar o seu fardo.
- Quem é? - gritou Cláudio Pazilotti ao Hara.
- Não sei. Não perguntei, a Aline que me passou dizendo que tinha um telefonema para você. Linha 3.
- Pazilotti - respondeu atendendo o telefone, depois de ter ficado por alguns instantes observando-o. Temendo-o.
E ouviu justamente as quatro palavras que mais odiava naqueles dias.
- O que você teme?
As odiava talvez pela perseguição. Pela perda de sua individualidade e pela percepção de que havia alguém, fosse quem fosse, que sabia exatamente quando e onde ele estaria. Mas também odiava por não saber a resposta. perderas noites pensando, perdera dias imaginando, mas jamais poderia responder, nem a si mesmo aquela pergunta. Se sentia incapaz de definir, com palavras, exatamente o que temia.
O que se seguiu depois daquelas palavras ditas por aquele telefone na redação foi tão rápido, espontâneo e imprevisível que dificilmente as imagens poderiam captá-lo em todos os seus detalhes.
Em um violento levantar Cláudio Pazilotti jogou a cadeira no chão num estrondo seco e arremessara-o, como numa prova de obstáculos, escada abaixo. Verdadeiro milagre foi ter conseguido chegar ao térreo intacto, pois descia os degraus a passos largos e rápidos, pulando ora três, ora quatro degraus de uma única vez. Nem mesmo a parede ou o corrimão serviram de apoio. Apenas o seu equilíbrio, desespero e ódio serviram-lhe de suporte.
Já no térreo debandou-se com fúria para a portaria, onde uma secretária controlava a entrada de pessoas estranhas e atendia os telefones, mandando-os para os ramais e pessoas adequadas a cada caso. A única secretária naquele domingo era uma menina loira, não muito alta, no frescor de seus dezessete anos. Com uma beleza discreta na maquiagem quase inexistente nunca antes fora reparada por Cláudio Pazilotti, exceto nos inescapáveis bom dia, boa tarde e tchau. Aline Mendonça assustou-se com a fúria quase impetuosa com que Pazilotti apareceu em sua frente.
- Quem me telefonou? Quem me telefonou? - gritava.
- Não sei. Só disse que queria falar com você. Não deu nome, nada. Até perguntei quem era, porque achei a voz muito bonita, mas disse só que era um amigo seu. Por que, algum problema?
- Muito! Ele não disse nada mais? - perguntou espalmando o balcão.
- Não! Não! Não disse nada, nada ...
Aline já estava nervosa. Temia ter cometido algum erro e perder o emprego. Estava a beira das lágrimas. Mordia o lábio inferior direito para não chorar. Pazilotti se acalmou um pouco com o desespero da pobre menina. Ela era inocente de seu desespero.
- Não se preocupe. Você não fez nada errado. - disse dando-lhe as costas e olhando para a rua, através da porta de vidro semitransparente da entrada do jornal.
E então ele viu. O telefone. O telefone público que ficava em frente ao jornal, simplesmente atravessando a rua, estava fora do gancho. O seu fone pendurado balançava de um lado para o outro como se dizendo-lhe venha, venha, venha. Saiu correndo do jornal e chegou até o telefone. Era do tipo que funcionava com fichas e, em sua pintura vermelha, ele viu duas coisas, duas coisas que o afligiram ainda mais. O telefone do jornal e a frase.
- O que você teme?
Ele. O dono da Voz, fosse quem fosse, fosse o que fosse, ele estivera ali. Talvez pudesse até mesmo vê-lo visto, se sua atenção não tivesse se concentrado em atormentar e tirar alguma informação da assustada secretária.
E Pazilotti também sabia que ele, a Voz, queria que ele, Cláudio Pazilotti, soubesse que estivera ali, há poucos metros de seu torturado.
Voltou ao jornal e perguntou, já mais calmo, à Aline se vira alguém naquele telefone. Negativo. Estava concentrada lendo uma revista para moças adolescentes ou pós-adolescentes e tentando se acalmar.
Subiu novamente as escadas e encarou o olhar inquisidor e assustado de toda a redação. Ninguém entendeu sua reação. Tampouco alguém perguntou o que aconteceu, apenas ficaram olhando-o por alguns minutos como se fosse um louco ou uma aberração qualquer. Talvez esperassem um novo ataque de fúria. Provavelmente queriam isso. Logo foram perdendo o interesse e a redação voltou ao normal. De que lhes interessaria as esquisitices e os problemas de um colega.
Mas para ele não estava normal. Perdera toda a concentração para finalizar seu artigo. Pior, perdera todo ele. Acontecera uma queda de energia enquanto estivera torturando a pobre Aline e tudo o que não havia sido salvo nos computadores foi perdido, inclusive a totalidade do que ele escrevera naquele dia.
Para piorar já havia jogado a maior parte de suas anotações no lixo. Teve que recuperá-las todas, entre papéis de outros jornalistas, cinzas de cigarro e copinhos plásticos de café vazios, a maioria não pertencentes a ele.
A matéria foi das piores de sua carreira. O editor, Luciano Dammre, era seu desafeto. Desde que começara a trabalhar no jornal pegara uma antipatia do e para o sujeito. Raramente isso acontecia, mas quando acontecia, era para valer. E sabia que o oposto era recíproco. Se dependesse de Dammre, ele jamais teria sido contratado, mas tinha um padrinho forte, por isso conseguiu o emprego e ainda estava nele. Entretanto, Dammre jamais perdia uma oportunidade de humilhá-lo e modificar suas matérias, tratando-o pouco pior que a um colegial mal-educado. E naquele dia ele não perdeu a chance. A cada item, a cada palavra que tirava ou modificava, olhava-o nos olhos com ar de superioridade e perguntava: não sabe que isso deve ser assim ou que aquilo deve ser assado?
Sentiu-se péssimo. Cerrou os punhos para não agredi-lo. Quando saiu do jornal, enfrentando um olhar assustado de Aline, tinha as palmas da mão fortemente marcadas pela pressão das unhas.
Por ter que rescrever totalmente a matéria e ser submetido a uma humilhante revisão do editor e um sermão do chefe-de-redação sobre a sua atitude, acabou saindo do jornal muito depois do horário previsto. Certamente não receberia hora-extra por isso. Se não fosse o seu padrinho não teria nem mesmo um emprego depois daquele dia. Foi isso uma das coisas que lhe disse, literalmente, o chefe-de-redação.
Foi para casa já muito depois do anoitecer. Deveriam ser quase nove horas da noite e o jornal já estava sendo rodado. Foi andando, evitando as ruas mais claras e movimentadas. Estava bastante deprimido. Era uma sensação quase constante em sua vida nos último meses, em especial depois que os telefonemas começaram.
Por vezes pensava ouvir aquela voz vinda de algum lugar nas sombras ou de trás de si.
- O que você teme?
Virava-se rapidamente, num misto de medo e ódio. Nada. Nunca havia nada lá. Nem mesmo um gato ou cachorro vira-latas. Sequer um rato saindo do esgoto ou uma barata correndo pela rua. Tudo vazio em sua escuridão.
Chegou em casa. Colocou a chave na fechadura e, depois de virá-la, antes de abrir a porta, ouviu novamente a voz, vinda de dentro de sua casa.
- O que você teme?
Entrou correndo pela casa, quase gritando. Novamente nada. Seria sua imaginação? Estaria enlouquecendo? Naquela noite não foi para o seu quarto. Dormiu agachado no piso frio do banheiro, com a porta trancada e uma faca de cozinha em suas mãos. Por nenhum momento ouviu a Voz. Ou mesmo o telefone.
Quando acordou não ouviu a voz. Mas ainda a temia, temia ouvir suas palavras, sua pergunta e até mesmo temia ouvir o som do telefone tocando, entretanto tomou uma decisão: compraria uma arma. Sabia como fazê-lo e com quem conseguir.
Precisava ser rápido. Quando a notícia de seu ataque no dia anterior se espalhasse seria mais difícil conseguir a arma. teria que recorrer a outras fontes, e não queria ser obrigado a isso. Já era bastante desagradável dever um favor à pessoa com quem iria tratar.
Tuca Souza era outra das poucas pessoas que não suportava. Mas mantinha um certo contato, mais por educação que por desejo. Encontrara-se, por várias vezes, em diferentes bordéis e zonas da cidade e, por trabalharem no mesmo jornal, acabavam tomando algumas doses juntos, antes que um se cansasse da companhia e da falsidade do outro e a trocasse por uma hora ou duas de programa com alguma garota.
Tuca era o colunista social do jornal. Um desocupado que dividia seu tempo entre festas da alta sociedade, bordéis e um envolvimento não muito saudável com elementos não muito corretos. Dizia-se, em boca pequena, que lidava também com drogas e contrabando. Ou conhecia muito bem quem estava no negócio. O certo é que levava uma vida muito distante de seus ganhos.
E se achava um grande jornalista, mas na verdade era dono de um ego de fazer inveja a qualquer imperador romano. no auge da decadência moral do império.
Como, por muitas vezes, se encontraram e beberam juntos em vários prostíbulos, um tinha o telefone do outro, embora nunca tivessem usado ou tivessem a intenção de usar. Até aquela manhã.
Eram onze horas e Cláudio Pazilotti sabia que Tuca Souza deveria estar acordado e tomando o café da manhã. Normalmente só ia no jornal de segunda a sábado no final da tarde. Certamente ainda não sabia dos incidentes do dia anterior.
Pazilotti olhou o telefone por alguns segundos e o pegou com rapidez. Temia ouvi-lo tocar. Discou o número de Tuca e esperou. O telefone chamou uma vez. Duas. Três. Apenas na oitava alguém atendeu.
Era uma voz melosa, como a de alguns travestis que entrevistara certa vez, muito diferente da voz áspera e dura de Tuca.
- Alô.
- Quero falar com Tuca Souza, Por favor.
Pazilotti ouviu a pessoa que atendeu o telefone chamar: “Tuuucaaa” e uma outra voz, esta a áspera e grossa do colunista, ao longe, dizendo: “Trás esta merda aqui, boneca”. Boneca? Então era mesmo um travesti. Tuca Souza e um travesti, quem diria? Mas e daí, a vida era dele e ele que fizesse dela o que quisesse. E com quem quisesse. Ninguém, muito menos Cláudio Pazilotti, tinha nada a ver com isso.
- Aqui é o Tuca. Quem fala?
- Tuca, aqui é o Cláudio Pazilotti ...
- Pazilotti?! Do jornal?! Que é que há, seu puteiro?
- Eu precisava de um favor teu. Você tem como me vender uma arma ainda hoje. De preferência m entregar antes de você ir para o jornal.
- Arma? Algum problema? Se tiver encrencado eu conheço uns caras que podem te ajudar.
- Não se preocupa. Só quero me sentir mais seguro em casa. Entende, né?
- Claro. Um 38 cano curto está bom. Eu te dou até umas balas de graça. Uma meia dúzia.
- Ótimo. Quanto é que vai ficar?
- Quinhentão. Em dinheiro. Posso entregar na tua casa. Me dá o endereço.
- Tem caneta?
- Espera aí. - Boneca pega a caneta e o bloco aí em cima e trás pra mim, gritou sem pôr a mão no bocal do fone. - Fala!
- Avenida Brasil, número 477, apartamento 34. Anotou?
- Certo. Me espera aí às duas horas com o dinheiro, combinado?
- Combinado. Te vejo às duas então.
- Tá, até logo.
Naquela noite Cláudio Pazilotti já estava com a arma carregada em seu bolso quando saiu de casa. Tuca Souza, depois de ouvir a história sobre o domingo, se perguntava se teria sido um bom negócio vender a arma e, pior, o que um sujeito que fizera o que Cláudio Pazilotti fez ali naquela redação faria com ela. Não que realmente se importasse, mas temia que se acontecesse alguma coisa a polícia podia querer envolvê-lo. É podia sobrar para ele, Tuca Souza, ainda mais agora, que arranjara um desafetos dentro da polícia, gente graúda.
E o que Cláudio Pazilotti fez?
Ele saiu andar, pouco depois do anoitecer. A arma em seu bolso pronta para ser usada. Aquela segunda era sua folga e foi a primeira vez, naquele dia, que saiu para a rua e sentiu o ar poluído do centro da cidade. Atravessava uma quadra meio escura. Haviam muitas árvores e poucas luzes. Nenhum telefone. Na esquina seguinte, uns 80 metros a sua frente, duas patrulhas da Polícia Militar estavam estacionadas em um posto policial. Em seu interior 5 oficiais. E Cláudio Pazilotti ia andando por esta rua quando ouviu, mais uma vez, a Voz.
- O que você teme?
Cláudio Pazilotti naquela noite, naquela hora, agiu simplesmente por instinto e por desespero. Sacou a arma de seu bolso e disparou uma vez para a esquerda,
- O que você teme?
outra vez para a direita,
- O que você teme?
para frente.
Os policiais, ouvindo os tiros, saíram correndo, já com as armas em punho.
Viram Cláudio Pazilotti com o revólver calibre 38 na mão e gritaram.
- Polícia! Solte a arma!
Cláudio Pazilotti nunca ouviu a polícia. Sequer os viu. Em sua mente só existia uma única coisa.
- O que você teme?
Atirou mais uma vez. Na direção dos policiais. Feriu um na perna. Eles responderam fogo e Cláudio Pazilotti morreu com 8 tiros no peito. Ninguém contestou a história dos PMs, pois haviam muitas testemunhas que assistiram a todo o espetáculo de suas janelas, atraídas pelos gritos e tiros. Cláudio Pazilotti ainda ouviu mais uma vez a Voz antes de cair no chão com o peito ensangüentado.
- Sou o que você teme ...
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