SONHOS QUEIMADOS
Ela estava sentada no terraço quando lhe entregaram a carta. Ai que emoção! Naquele tempo a correspondência se fazia assim, via correio. Pelas cores do envelope, mesmo antes de abrir, já sabia que era dele. Do seu amado. O fim do ano se aproximava, era chegada a hora dele vir ao Brasil. Tudo estava arranjado, depois de muita relutância, sua mãe concordou em hospedá-lo. Afinal, o rapaz devia gostar mesmo da filha, naqueles meses todos, quantas cartas tinham trocado.
Contente, abriu o envelope. De imediato estranhou a letra, de hábito tão bonita, ali meio desleixada. E leu:
“Joana querida, você não pode imaginar minha tristeza ao escrever essas linhas. Nem sei como começar, tão atordoado me sinto. Tudo estava acertado para que eu fosse ao Brasil., só pra te ver. Você sabe muito bem. Papai ficou de comprar as passagens e quando me entregou os bilhetes, para minha grande surpresa e desilusão, vi que eram... para a Europa! Ah! Essa Europa que eu tanto queria conhecer, mas não agora! Quando receber esta carta já estarei no navio. Ele vai parar em Santos no dia 28 de dezembro. Será que você podia ir até lá?...”
Joana parou a leitura e pensou na data: 28 de janeiro. Mas era aquele dia! O mesmo em que lia a carta! Ela ali no terraço e ele lá no porto, esperando em vão... Nada mais a fazer. Tudo perdido. Sonhos e ilusões se foram por água abaixo, pro fundo do mar... E ela chorou, como chorou!
Alguns dias depois, teve uma reação inesperada. Pegou todas as cartas do amado e riscou um fósforo. Bem devagar, de uma em uma, queimou tudo, enquanto lágrimas rolavam por sua face.
Beatriz Cruz
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