NOSSA! COMO VOCÊ TEM SORTE!
Sempre que me falam em sorte, penso logo no hasard - assim mesmo, em francês, o que parece estranho, mas vem a ser a mesma coisa: acontecimento fortuito, ou conjunto de circunstâncias inesperadas e inexplicáveis. Coisas que acontecem por acaso.
E então me dizem, como você tem sorte, ganhou uma bolsa para estudar na França! Que sorte, você tem a mesma empregada há vinte anos! Que sorte, seu casamento dura há tanto tempo! Que sorte, você sabe falar francês! Que sorte, como você tem amigos! E assim por diante...
Em geral concordo, com um sorrizinho sem graça, por me considerarem uma pessoa assim tão
especial. Diferente dos outros. Para não estragar o prazer deles, evito a discussão. Mas quando percebo que há uma pontinha de inveja, me ponho a explicar. Primeiro, para que essas pessoas compreendam a minha “sorte” e depois, para que ninguém fique de olho gordo pra cima de mim. Não costumo andar com folha de arruda na orelha.
Na febre daquela loteria esportiva, tentei algumas vezes preencher o cartão. Se tivesse prêmio para quem acertasse um ponto, ou nenhum, estaria feita. Milionária. Nas quermesses, tantas que frequentei, jamais abriram aquele papelzinho com o meu número. Ou era um bem distante, ou o da pessoa que estava ali ao meu lado.
Só duas vezes na vida fui premiada em sorteios. Uma quando criança, naquela brincadeira de jogar argolas num parquinho de diversões. Ganhei uma compoteira de vidro, feinha, feinha, que mamãe guardou por anos a fio, sem usar... A última foi mais recente, numa festa que os coroas aqui da minha cidade fazem para relembrar a juventude. Este foi legal, um par de óculos escuros. De grife. Tão incrementado que não pude usar, porque teria que trocar as lentes, o que ficaria caro demais. Minha filha ficou com eles.
Minha cunhada é que tem sorte. Quando sai dessas festas em que há sorteios, volta pra casa cheia de pacotes. Dos bons. Liquidificadores, torradeiras, DVDs...
Tanto falei que nada expliquei. Agora é tarde. Azar de vocês. Mas pra ninguém ficar com inveja, prometo contar tudo direitinho uma outra vez. Querem em francês, ou em português?
Beatriz Cruz
|
