CIRCULAR
O sangue circula na veia
O vento circula no ar
Menina circula na rua
Tudo tem que circular
Isto até parece poesia, mas não é
É a vida que é assim mesmo
Tudo tem que circular
Água parada vira lodo,
chama cobra, cria mosquito
Se a hélice do avião não circula,
o avião cai, não voa
e vai-se tudo pelos ares
Se o dinheiro no mercado não circula,
não se ganha, não se perde,
não tem lucro, não tem perda
A Terra circula em torno
de si e em torno do sol
Assim tem-se os dias, as estações
e os anos. Assim passa a vida:
Primavera. Verão
Outono e Inverno
Trânsito que não circula
é engarrafamento na certa
Água que não circula, já disse,
vira esgoto. Fede
Circulando, circulando,
a ciranda gira e roda
Musicalmente,
roda a roda-gigante
no mesmo compasso de antes
Fazendo um barulho danado,
teima a girar a roda do carro
Circula o carro na estrada
Notícia é velocidade
Fuxico de boca em boca
gira por toda a cidade
Circula as cordas, menina,
deixa sua voz ficar rouca
Vamos circular as estórias
pra que a História, girando,
não se perca em sua boca
Roda pião, rodeia pião
Bambeia pião muito louco;
circula na minha mão
como o vento no sufoco
Um beijo quente e bem doido
circulou na minha boca.
Fiquei tonto e sem graça,
deixei você muito louca
Corri pra lavar minha roupa
e a máquina circulou tanto
que a deixou toda rota
com um repuxo de pranto
Enquanto a fumaça girava,
a secadora rodou, girou
e tudo encolheu sem penar
Tenho agora roupa de anão,
que circula curto e ligeiro,
e não pára pra pensar
Também, parar pra quê?
Se parar, tudo morre e não tem vida
Tem-se que movimentar:
pra baixo, pra cima,
prum lado e pro outro,
como a palavra que circula
e muda de sentido e grafia,
dependendo do tempo,
do lugar e da boca que fala
O Imposto de Circulação
está muito alto e encarece
a mercadoria circulante
com alíquotas indecentes;
sempre indesejáveis...
Tudo fica mais caro
se muito roda e circula,
mas se isso não acontece,
rapidamente apodrece
Está cada vez mai difícil
comprar o meu pão todo dia
Fico parado pensando
se o vinho circula rascante
nas paredes da garganta
Circule em redor da lei
e saia imune do crime
Tudo é válido, tudo vale
Vale a pena circular
como o moinho de vento
que circula sem parar
Vou me embora, vou correndo
Está todo o mundo vendo
Está na hora de amar
Eu também tenho que circular
© Fernando Tanajura Menezes
(n. 1943 )
(in Dos beijos - Editora Blocos
Maricá/RJ - 1999)
http://tanajura.cjb.net |