Solta-se-me a Caixa de Pandora no cérebro. Pecinha a peçona, espatifo-as todas, escáco-as de encontro às paredes do raciocínio, desde aquela que por tão ínfima não detecto com o olhar, à enormíssina que não consigo abarcar. Após esta simples-e-complexa operação, debruço-me então sobre o seguinte dito:
"Desta água não beberei"...
Claro, desta água? Desta? Como quiser, bebo ou não bebo, mas, de imediato, defronto-me com a inevitável sede que em delírio horroroso me proporciona magníficas e indizíveis miragens...
E... Meus caros, bebo, bebo sem parar, quase me mato a saciar-me, bebo o "desta água não beberei" mesmo que veneno seja.
Não me venham pois com historiazinhas, com mais caixinhas e caixinhas, cessem o pulhedo ou - que pena - as boas intenções... Essas, meus caros, são belas, excelentes, são como as crianças, mas têm a maléfica contrapartida de serem profundamente ingénuas e ignorantes, inspiradoras da sabedoria que abominamos e nos indigna às raias do ódio. Olhem e reolhem o visível do invisível, a Internet, autêntica Babel actual que de torre se transformou em infinito espaço. E o esforço pelo entendimento de tanto intentar revigorar-se cada vez mais se fragiliza.
Para me confortar e reconfortar intimamente, em acérrima defesa do benquisto orgulho que me resta como pessoa, persisto continuar com uma das mãos, sempre que considere necessário, a proteger a entrada do meu fecho da dignidade e, se de quando em vez lhe passo um dedo para coçá-lo, isso, isso é tão só para aliviar a insuportável comichão que a todos inevitavelmente às vezes acontece. De resto, ora, quem, com milhões de opções em redor, teria o mau gosto de violar um velho?!...
Vá, pois, venha de lá mais uma da caixinha de Pandora, uma daquelas inteligentes pecinhas que os luminosos cérebros hodiernos estão sempre prontos a exibir, mesmo que escondida entre o pó de antanhos milénios. Vá, limpinha, muito limpinha, até parecerá que foi concebida mesmo agora e surja messiânica a prometer mais largo gozo entre os efeitos do supérfluo.
Vá, recusêmo-nos a ir a pé todos os dias para o trabalho e, nos tempos disponíveis, façamos longas marchas ao redor de um jardim para emagrecer e manter uma excelente condição física. Ah... Ah... Ah...
António Torre da Guia |