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cronicas-->O DEDO DE DEUS -- 24/11/2001 - 11:23 (Denis Cavalcante) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O DEDO DE DEUS

" Deus quer, o homem sonha, a obra nasce." ( Fernando Pessoa )

DENIS CAVALCANTE

A manhã não parecia das mais promissoras. Os aborrecimentos de sempre somados a quebra imprevista do ar condicionado, o diabólico telefone tocando sem cessar, a falta de assunto para a crónica de hoje... Tudo conspirava para um dia pouco ou nada auspicioso. A tela do computador permanecia branca e vazia a minha frente, o que escrever?
Meu fiel escudeiro Machado, interfona pedindo ajuda para atender um cliente; vou meio que contrariado a procura do sujeito. Pergunto-lhe em que posso ajudá-lo e ele me pede um livro quase impossível de ser encontrado: "O Apanhador nos Campos de Centeio" do Salinger; como só tenho um exemplar na minha sala vou solícito buscar, depois de longa procura, acho finalmente o raro exemplar, mostro-lhe o livro e quando digo-lhe o preço, sinto que o cara ia ter um troço! Balbucia palavras inteligíveis, me deixa falando sozinho, e bate célere em retirada: - Ó diazinho!..
Minha atenção volta-se para a campainha da porta, olho e não vejo ninguém; olho com mais vagar e vejo um vulto praticamente no chão, abro a porta e um homem ofegante abre um sorriso de dentifrício dando-me um sonoro: - Bom Dia!!! Eu cá com meus botões: - Bom Dia só se for pra voce! Entra arrastando-se pelo chão, pulando com agilidade invulgar e felina em cima da cadeira. Pergunta meu nome, diz o seu, e começa a tagarelar: - Estou á procura de livros do filósofo Schopenhauer, tens algum?
É bom que se diga que o jovem em questão foi um dos milhares de seres humanos mutilados por uma droga americana chamada Talidomida, que era receitada a larga para mulheres grávidas nas décadas de 60 e 70, só que os efeitos colaterais foram tão devastadores, que foi terminantemente proibida. Má formação congênita, perninhas tortas, braços que terminam nos cotovelos, dedinhos gordinhos saindo do nada...
Bem voltemos ao nosso personagem, bem falante, alegre, e sagaz surpreendeu-me ao folhear com seus dedinhos miúdos as páginas do almejado livro. Eu encucado não conseguia entender uma pessoa que se arrastava pelo chão, sem mãos, e mesmo assim irradiando tanta alegria, tanta felicidade. Acho que ele "leu" meus pensamentos pois explicou-me sem rodeios e com pormenores, o porque de sua alegria contagiante: - Deus me deu a vida, me deu pais maravilhosos, me deu a visão, bem ou mal ando com meus próprios pés, pego com dificuldade mas pinço coisas com minhas mãos, como sozinho, até escrever e pintar ele me ensinou, porque haveria de me lamentar?
Eu que andava como uma hiena pelos cantos reclamando de meus ínfimos e pequenos problemas, acabo tomando um "banho" de otimismo daquele jovem iluminado por Deus.
Por sinal sempre que me afasto, duvido de sua existência, questiono seu poder infinito, cultivo meu lado agnóstico; ele dá um jeitinho de se fazer presente, ora me dando uma lição, ora me mandando um emissário especial, como o jovem Mateus.
Conversamos longamente sobre livros, sobre a vida, nas vezes que esbocei a intenção de oferecer ajuda, ora numa prateleira mais alta, ou quando puxou a carteira e com os dois pequenos apêndices tentava pinçar com dificuldade as notas de dentro da mesma, ou quando pegou um exemplar monstruosamente pesado da Divina Comédia, todas as vezes recusou educada e firmemente qualquer tipo de ajuda.
Assim como chegou, partiu. Entreabriu a porta de vidro, abriu um largo sorriso levantou o pequenino braço, acenou com os dois dedinhos, deu tres pulinhos na escada e sumiu.
e-mail: denis@amazonline.com.br
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