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Artigos-->MARVIN E O CARACOL DO TEMPO(CAPÍTULO 8 AO 10) -- 04/03/2005 - 17:41 (Almir Correia) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos




CAPÍTULO 8

MERLIN NOSTRADAMUS

“Você não precisa comer aranhas

para ser e tecer feito elas.”

(Merlin Nostradamus)



Antes que Elvis pudesse pegar uma das bolas-remorsos, elas fugiram em carreira desembestada... Cada qual em uma direção diferente. E Elvis desesperado só podia ir atrás de uma delas por vez. Sabia ele que sua vida dependia disso: recuperar todas as bolas de carniça, antes que elas caíssem em mãos ambiciosas ou ganhassem um poder só controlável pelos MAGOS DA TÁVOLA REDONDA MÍSTICA e...

Melhor não esperar por isso, já que os Magos só interfeririam em casos de extrema gravidade.

Sem tempo a perder, Elvis voou-sumiu, deixando Marvin sozinho na Biblioteca Infinita. Sozinho voando sobre os infinitos livros, voando sobre criaturas aparentemente indiferentes a sua presença, atravessando “Ai que frio!!!” fantasmas leitores. Às vezes trombando contra livros invisíveis.

“E agora como eu faço para sair daqui???”

Se não fosse Torresmo, Marvin ficaria ali na Biblioteca Infinita por um longo e longo e longo tempo, feito uma mosca trancada numa sala de vidro.

Mas afinal, onde estava Torresmo???

O safado se escondera dentro da mochila com asas. No aconchego tirou uma boa soneca. E só acordou quando Marvin trombou contra o primeiro livro invisível. Mesmo assim Torresmo resolveu ficar lá escondidinho. Só saiu mesmo depois que Marvin trombou contra o décimo livro invisível. Aí já era demais. Torresmo ficara cansado daquelas “trombações”. E ao deixar abruptamente a mochila, já foi soltando o verbo:

-- Marvin, eu vou te ajudar a sair daqui, porque senão... Me abra na página 38RT56WS!

-- O quê???

Me abra na página 38RT56WS!!!

-- O quê???

Meio abismado, Marvin não estava ainda captando “as boas intenções” de Torresmo.

Primeiro o livro havia surgido muito de supetão e então já exigia que ele o abrisse na página 38RT56WS.

-- ??????????????????????????????

Assim que percebeu as interrogações nos olhos, no nariz, na boca e nas orelhas de abano de Marvin, Torresmo foi logo se desculpando do seu jeito que não lembrava muito uma desculpa:

-- Deixa pra lá então! Deixa que eu mesmo me abro.

DITO E FEITO.

Torresmo se abriu na página 38RT56WS.

-- Pronto, agora você pode me ler!

Marvin se aproximou mais de Torresmo e ao pegar no livro, este gritou:

-- AI! UI! Cuidado com as minhas asas! Você está querendo que eu fique um desvoado?

DESVOADO??? ESSA ERA BOA!

Marvin se desculpou e quando pôde então olhar para a tal página 38RT56WS viu apenas um amarelo borrado cor de pele-couro.

-- Você está brincando comigo?

-- Claro que não. Me olhe com mais cuidado. Me olhe com mais atenção.

E MARVIN ASSIM FEZ.

Aos poucos o amarelo foi ganhando riscos de veias. E formas. E letras. E palavras. E até imagens em movimento. Torresmo lembrava as páginas da Internet.

MESMO NÃO PARECENDO, TORRESMO, ASSIM COMO A INTERNET, ERA UM LIVRO INFINITO.



Notícias do Livro de Carne:

“Mil vacas malhadas são usadas por dia de trinta horas só nas Terríveis Máquinas de Monstros Semi-Metálicos do Doutor Mago Fritz. O estoque de vacas está bastante reduzido. Talvez em breve teremos racionamento bovino no “Mundo de Almíscar”.



Após a notícia, minúsculas veias começaram a formar uma terrível imagem em movimento: Era uma das máquinas do doutor mago Fritz em pleno funcionamento: dois enormes funis prateados -- no primeiro caíam pedaços de metal e no segundo, inocentes vacas vivas.

VACAS-COMBUSTÍVEL??? VACAS MATÉRIA-PRIMA???

Os funis se fixavam no corpo da máquina que lembrava um elefante todo feito de sucata enferrujada com milhares de reloginhos. De seu traseiro-chaminé saía uma fumaça amarela. O cheiro era quase insuportável para os narizes não acostumados a tal descarga gasosa. AH! Marvin pôde sentir também. Como conseqüência suas narinas ficaram trancadas e ardendo por longos minutos.

NEM SEMPRE É BOM SE TER UM LIVRO QUE PODE EMITIR TODOS OS CHEIROS E FEDORES CONHECIDOS OU NÃO.

Voltando a nossa descrição, sete alados duendes amarelos cuidavam dos reloginhos. A máquina-elefante devia ter a altura de um prédio de cinco andares (medindo-se tudo da base-pés até a boca dos funis). A imensa tromba metálica jorrava vez por outra sangue de vaca. A cada meia hora, dois monstros do doutor Fritz (meio carne gosmenta, meio sucata oleosa) caíam pela boca da máquina.

O CHÃO SANGRENTO ATRAÍA MILHARES DE MOSCAS-JABUTICABAS FAMINTAS.

Assim que as minúsculas veias foram desfazendo a imagem da máquina-elefante, uma nova notícia feita com outras veias chamou atenção de Marvin:



“Depois de ficar preso por mais de 500 mil horas de 90 minutos cada, na Cidade da Redoma de Vidro, Etecétera foi libertado... Assim que tivermos maiores informações sobre o caso, daremos a notícia em primeira mão. Aliás como sempre.”



“Etecétera! Meu amigo! Como pude me esquecer de você! Como pude me esquecer! Não sei, alguma coisa está acontecendo com a minha cabeça! Não consigo mais me lembrar de muita coisa importante! Sei ainda que tenho que salvar alguém, mas já não me lembro mais quem. Minha cabeça está doendo! Meus neurônios estão entrando em curto.”

Enquanto Marvin pensava e despensava, as minúsculas veias criavam a foto animada de Etecétera se transformando em diversos animais: de dragão para leão, búfalo, águia, dinossauro, jibóia, gato, até um inocente coelho branco (homenagem ao seu amigo morto, Teleco).

“Etecétera! Onde será que você está agora?”

Abaixo da figura de Etecétera, as minúsculas veias escreveram outra notícia:



“Neste momento Etecétera está descansando em lugar ignorado. A única dica que temos é que se trata de um verdadeiro paraíso, isso na concepção de Etecétera, já que os paraísos são muito relativos. Cada criatura tem o seu. A horrenda bruxa Moura Torta, por exemplo, adora passar suas férias de maldade dentro de um vulcão, cheio de lava fervente. ‘Faz bem pra pele, isso sim é que é paraíso!’, diz ela.”



Ao terminar de ler a notícia, Marvin já havia se esquecido de Etecétera e, então, já havia se esquecido de tudo. Já não sabia mais quem era, nem onde estava. Nem nada.

A MEMÓRIA É O NOSSO MAIOR TESOURO. SEM ELA NÃO SOMOS NADA. SEM ELA NÃO SOMOS NÓS MESMOS.

Marvin parecia agora uma lâmpada queimada. O livro voador em suas mãos tornara-se também algo desconhecido e medonho. E assim ele o atirou longe.

As criaturas na Biblioteca Infinita ganharam feições mais desagradáveis diante de seus olhos esquecidos.

APENAS O MEDO PERMANECIA MAIS VIVO DO QUE NUNCA. O MEDO NA VERDADE SE AMPLIARA, TALVEZ POR SER O SENTIMENTO MAIS BÁSICO DE AUTO-PROTEÇÃO.

Quando Marvin viu o espectro de um fantasma dourado com mais de cinco metros de altura, deu um grito e depois grunhiu.

MARVIN JÁ NÃO CONSEGUIA EMITIR UMA PALAVRA SEQUER.

Se não fosse a mochila com asas, Marvin poderia ficar em “lençóis de urtiga”: sozinho, sem memória alguma, talvez até enlouquecesse ali, ou fosse devorado por alguma criatura faminta (mesmo todos sabendo que era proibido comer dentro da Biblioteca Infinita).

Foi a mochila que direcionou Marvin até um livro portal que servia como saída da Biblioteca (cada página tinha o tamanho de uma porta tamanho família, isso quer dizer que toda “uma família” poderia entrar ao mesmo tempo). Era só abrir o livro e escolher entre mais de quinhentos mundos mágicos:

-Mundo dos Vampiros da Décima Dimensão;

- Mundo dos Minotauros Mancos;

- Mundo de Almíscar;

- Ilha dos Mutantes;

- Reino do Não-Sei;

- Avalon;

- Cochinchina;

- Cidade da Redoma de Vidro;

- Saskatchuó;

- Reino dos Duendes Alados;

- Reino das Aranhas Mágicas;

- Mundo das Criaturas Invisíveis;

- Cidade Flutuante;

- Mundo dos Zumbis Supersônicos;

- MALdagargar;

- Planeta dos Vermes Gigantes;

- Arquipélago dos Anões Canibais;

- Reino dos Diabinhos Prateados;

- SPA das Múmias;

- Reino das Mini-Fadas;

- Reino dos Vampiros Seguidores do Conde Drácula;

- Mundo das Ervas Venenosas;

- Pântano Azul;

- Reino dos Dragões-Anões;

- Reino das Criaturas do Vulcão Macabro;

- Mundo das Bolhas Gosmentas;

- Cidade dos Esqueletos Assassinos;

- Mundo dos Lobisomens Caolhos;

- Reino das Ilusões Eternas;

- Mundo dos Mistérios;

- Mundo das Mil Luas;

- Reino dos vampiros Seguidores do Conde Herculano;

- Vale das Bruxas Escalpeladas;

- Mundo dos Esqueletos Dourados;

- Reino das Línguas Cortadas...



E MUITO, MUITO, MUITO MAIS...



Marvin ficou frente a frente com páginas-imagens virando-se sozinhas, mas seus olhos agora pareciam distantes. Distantes em lugar nenhum. Ele olhava, mas não via. E sendo assim, foi a própria mochila com asas que resolveu tomar providência, escolhendo um dos mundos.

“Vamos nesse mesmo!”, pensou ela.

E lá foram os dois “GLUBT” (este era o som ao se passar pelo portal) rumo ao reino de...

“REINO DOS QUE NÃO MAIS ADIVINHAM” .

Poucos segundos depois, um novo “GLUBT” seguiu Marvin...



“O Reino dos que não mais adivinham” era o lugar ideal para criaturas que resolveram se aposentar de suas atividades. Principalmente aquelas que “ganhavam a vida e a morte” fazendo previsões sobre o futuro de outras criaturas.

Muitas coisas chamavam atenção daqueles que ali pela primeira vez chegavam: o céu era sempre escuro, cheio de estrelas que não paravam no mesmo lugar. Vez por outra um meteoro rasgava as alturas com seu rabo de fogo. Os lagos se iluminavam com os peixes-vaga-lumes. E até as árvores tinham luz própria.

AH! E os castelos medievais do reino: todos fluorescentes, pintados com tinta mágica feita de luz colorida.

CASO ALGUÉM SE PERDESSE EM ALGUM LUGAR ERA SÓ ASSOBIAR E UM BEIJA-FLOR BRILHANTE APARECIA PARA ENSINAR-LHE OS CAMINHOS...

Marvin não se admirou com nada... Seus olhos continuavam não vendo. Seu coração já não sentia. E seu corpo-zumbi “voava” indiferente a tudo.

Certamente a mochila com asas tinha algum plano “escondido nas mangas”, ou melhor dizendo, algum plano escondido em um dos diversos bolsos. Certamente fora bem instruída pelo Dragão Elvis. Afinal, como já se sabe, ela era resultado de uma de suas mais recentes pílulas.

“PÍLULAS E POMADAS DOUTOR DRAGÃO ELVIS: 99% DE SATISFAÇÃO OU O SEU DINHEIRO DE VOLTA.”

Voando sobre montanhas cheias de grutas, a mochila com asas foi levando Marvin...

Após quase meia-hora de vôo:

BEM-VINDOS A MINHA AMADA GRUTA.

E a mochila com asas entrou voando com Marvin.

Logo em seguida, o “GLUBT” entrou também...

Marvin não viu o chão todo forrado de barbas brancas.

Marvin não viu aranhas-vagalumes andando no teto.

Marvin não viu a bola de cristal sobre a lareira.

Marvin não viu a cabeça de um diabo pendurada na parede.

Marvin não viu uma estátua de mármore se mexendo feito gente que finge ser estátua de mármore e que, às vezes, se mexe.

Marvin não viu uma sombra fugindo da gruta.

Marvin não viu uma bola de fogo azul perseguindo a sombra.

Marvin não viu velhos livros tentando se folhar sozinhos na estante de teias.

Marvin não viu o final do emaranhando de barbas brancas que devia ter mais de duzentos metros de comprimento.

E o final do emaranhando de barbas brancas era um velho muito-muito velho mesmo. Um velho com suas velhas roupas encardidas. Um velho com capuz velho. Um velho com lábios murchos. Um velho com sobrancelhas grossas e exageradas. Um velho com olhos apagados. Um velho com nariz achatado. Um velho com narinas longamente peludas.

Marvin não viu o velho.

Marvin continuou não vendo o velho, agora com dezenas de aranhas caranguejeiras percorrendo suas vestes surradas.

ARANHAS BEM MAIS PELUDAS QUE O NORMAL PARA NÓS DO MUNDO HUMANO.

Marvin continuou não vendo o velho, agora fazendo movimentos com as mãos. Dos longos dedos pelancudos saía fumaça de luz que no ar ganhava forma de estranhos símbolos e estranhas letras.

Dedos-chaminés.

MARVIN CONTINUOU NÃO VENDO...

JÁ O “GLUBT” ESTAVA VENDO TUDO. E PERMANECIA ESCONDIDO.

“GLUBT” ERA O TORRESMO.

Ao lado do velho, um naco de fogo flutuante aquecia uma pequena chaleira, enquanto, vez por outra, ele bebia “um gole de algo”, em uma caneca também flutuante, feita de lava de vulcão.

Os pés do velho pareciam ter vida própria. Num segundo eram pequenos (tamanho 36), noutro inchavam, ganhando mais pêlos e perebas. E aí dava até para ver os dedos balbuciando entre si.

MARVIN CONTINUOU NÃO VENDO...

E o velho que sabia quase de tudo tentou reanimar o menino de cabelos verdes, com vocábulos comuns:

-- Vamos! Vamos! Acorde! Acorde! Desperte para o nosso mundo!

MARVIN CONTINUOU COMO ESTAVA.

“Hum! Hum! Pelo jeito é estresse mesmo. Só pode ser. Estresse mágico.” – pensou o velho.

ESTRESSE MÁGICO SÓ PEGA HUMANOS QUE ENTRAM EM MUNDOS MÁGICOS E VIVEM GRANDES AVENTURAS DO TIPO “TUDO-AO-MESMO-TEMPO-AGORA”.

O velho que sabia quase tudo conversou baixinho com suas aranhas domesticadas e em seguida elas já foram pulando no corpo de Marvin.

ERAM QUARENTA AO TODO.

QUARENTA PELUDÍSSIMAS ARANHAS CARANGUEJEIRAS.

Todas elas morderam Marvin.

Marvin foi mordido desde a orelha, nariz, queixo, pescoço, braços. E sobre a roupa, nas costas, peito, barriga, pernas, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc, etc.

E MARVIN CONTINUOU NÃO VENDO E NÃO SENTINDO...

Depois de todas as mordidas, as quarenta aranhas começaram a enrolar Marvin com seus fios, até ele parecer um casulo (trabalho para “três minutos humanos de 60 segundos cada”).

Nem a mochila com asas foi poupada.

E Marvin assim ficou pendurado. Agora, pelos fios das aranhas.

-- Bom serviço! Bom serviço, meninas!

Torresmo que via tudo escondido no chão de barbas brancas resolveu ir “saindo de fininho”, antes que sobrassem algumas aranhas para ele.

Torresmo nunca gostou muito delas, principalmente depois que uma “viúva negra” o fez de morada por um bom e chato tempo.

Preso dentro do casulo, Marvin “dormiu” horas e horas e horas a fio.

SONOTERAPIA.

CASULOTERAPIA.

Quando o relógio cuco despertou, avisando que as horas-sonos haviam terminado, as 40 aranhas deixaram novamente as vestes do velho, em direção ao casulo. E todas juntas foram desenrolando, desenrolando, desenrolando os fios de teia. Até restar apenas o Marvin, ainda em seu sono-animação-suspensa.

O velho então abriu uma pequena caixa de prata, escondida embaixo de uma almofada, e de lá saiu-voando um morcego dourado com dentes-agulha.

“PRÉ-PROGRAMADO” PARA MORDER PESCOÇOS.

E assim ele fez...

E assim Marvin despertou...

O morcego dourado também estava “programado-enfeitiçado” para morder-rasgar-cortar outras coisas.

E assim ele fez...

E assim Marvin caiu no chão de barbas brancas.

-- Espero que você não tenha se machucado! – disse o velho com suas vestes forradas das aranhas caranguejeiras.

-- Não... Não... Tudo... bem. – respondeu Marvin, ainda meio tonto, mas já novamente conhecedor de boa parte de seu passado.

O TEMPO PRESENTE, PORÉM, SE APRESENTAVA ESTRANHO, INESPERADO E...

-- Quem é o senhor?

-- Pode me chamar de você!

-- Então quem é você?

-- Nostradamus!

-- Nostradamus? Aquele dos livros e dos filmes?

-- Quais livros e quais filmes? Não tenho lido quase nada nos últimos duzentos anos. Filmes! Nunca gostei deles... Prefiro cultivar hortaliças e ervas medicinais.

AÍ FOI MARVIN QUE NÃO SOUBE RESPONDER. E ficou imaginando como aquele velho de tão longuíssimas barbas brancas conseguiria fazer o que dizia gostar. Talvez tivesse um auxiliar para levar as barbas em um carinho de mão. Talvez se desgrudasse delas, quando quisesse...

Talvez... Talvez... Talvez...

NOSSA VIDA É CHEIO DE TALVEZ. TALVEZ AQUI. TALVEZ ALI. TALVEZ EM TODOS OS LUGARES. CRIAMOS O TALVEZ PARA COISAS QUE NÃO SABEMOS NO PASSADO. CRIAMOS TALVEZ PARA O PRESENTE E PARA O FUTURO TAMBÉM. TODOS OS TEMPOS ESTÃO REPLETOS DE TALVEZ, OU TALVEZES. VOCÊ ESCOLHE.



PRIMEIRAS OBSERVAÇÕES EXTRAS SOBRE MERLIN NOSTRADAMUS:

Nas vezes em que Merlin Nostradamus precisava deixar a amada caverna, ele pedia ajuda ao seu assistente Ensebado (que no momento se encontrava bem distante no 3000º Congresso dos Ensebados). A bengala de gelo que não descongelava, Nostradamus levava sempre consigo em suas vagarosas caminhadas.

VAGAROSAS, MAS PODEROSAS:

Um passo de Nostradamus era igual a um quilômetro, no mínimo.

Dois passos e mais três bengaladas no chão abriam passagem para o mundo imaginado por Nostradamus.

.......................................................................................................................................



ENQUANTO ISSO NA CAVERNA DA MISTERIOSA CRIATURA DA CAIXA PRETA:

-- Nossa! Puxa vida! Puxa morte! O que aconteceu com você, Tchau???

-- Nem te conto! Nem te conto! Ou melhor, te conto sim... Como você está vendo, eu não consegui pegar nenhuma bola de carniça. Cheguei perto de uma e... Vou exigir pagamento extra por insalubridade.

-- Insalubridade??

-- É isso mesmo! Insalubridade!!

-- ???

-- Caixa, que vergonha!!! Você não sabe o que é insalubridade!?

-- Não sei, é daí? Não sou obrigado a saber tudo.

-- Compre um dicionário.

-- Vamos, pare de me enrolar, e me diga logo o que significa insalubridade.

-- Tudo bem, mas não se esqueça que tal informação vai te custar um taxa extra.

-- Nunca vi um sujeito tão dinheirista, ourista, diamantista feito você.

-- Questão de princípios, meu caro amigo! Você bem sabe que eu não posso fazer favores.

-- Não pode ou não quer?

-- As duas coisas juntas! Mas afinal, você quer saber o que é insalubridade ou não?

-- Tudo bem! Diga logo! Já estou mesmo devendo até as calças que não tenho.

-- Caixa, não seja tão dramático! Eu sei que você possuiu muitas riquezas escondidas. Só não roubo de você, porque isso vai contra o meu mais caro princípio. Afinal, sou um duende amarelo, trabalhador e honesto.

-- Tchau, chega de papo furado! Me diga logo o que significa essa tal insalu... insalu..., insalu... o que mesmo?

-- Insalubridade. E quer dizer simplesmente “inadequado à vida, nocivo à vida, prejudicial `a saúde”, segundos os bons dicionários.

-- E por que você quer que eu lhe pague uma taxa extra prejudicial à saúde??

-- Caixa, já não sei se você é burro mesmo ou está brincando comigo?!

-- Não precisa ficar nervosinho!

-- Eu não estou nervosinho! Eu sou nervosinho!

-- Tudo bem, eu pago essa taxa! Tá melhor assim?

-- Tá! Agora me passe um pano e aquela sua loção para eu tirar todos estes vermes nojentos da minha roupa. Acho que até engoli alguns. Ai que nojo! Ai que nojo!



OS VERMES QUE VIVEM NAS BOLAS-REMORSOS DE CARNIÇA PODEM FAZER MAL À “SAÚDE” DE QUALQUER CRIATURA EM ESTADO DE VIDA, PÓS VIDA OU ESTADO DE MORTE-ZUMBI.



SEGUNDAS OBSERVAÇÕES EXTRAS SOBRE MERLIN NOSTRADAMUS:

No mundo humano, em 14 de dezembro de 1503 da era cristã, nasceu na cidade de Saint-Rémy, na França, Michel de Nostradame. Ainda bem jovem, depois de aprender latim, grego, hebraico, matemática e astrologia com seu avô materno, Michel matriculou-se na Escola de Medicina da Universidade de Montpellier.

Em 1525, com 22 anos, começou sua carreira de médico. Em Bordeaux, combateu uma epidemia de peste. Fixou-se depois em Agen, onde se casou e teve dois filhos. Toda sua família foi morta pela peste. Passou então algum tempo viajando pela Itália... Em Salon-de-Craux, casou-se com uma viúva, Ana Gemella, e teve seis filhos. O primeiro deles chamou-se Cesar, ao qual mais tarde dedicaria as primeiras Centúrias. É nessa época que começou a escrever mensagens proféticas, mas receoso de incorrer em desagrado e perseguições, preferiu adiar sua publicação. Seu desejo de vê-las conhecidas, porém, foi mais forte. Mandou-as, então, para a imprensa e em pouco tempo suas profecias se tornaram famosas. Em 1556 foi convidado pelo rei Henrique II da frança para fazer parte de seu conselho. Com a morte de Henrique II em 1559 (prevista na centúria I- 35) continuou como conselheiro de Francisco II e depois de Carlos IX. Nesse período sua fama de médico e adivinho ultrapassou as fronteiras da França. De todos os cantos da Europa chegavam celebridades para conversar com ele. Em meados de 1566, sofreu um ataque de hidropisia (acúmulo de líquido nos tecidos). No dia 1º de julho chamou um criado e pediu-lhe para arrumar o quarto, “pois não estaria mais vivo ao alvorecer do dia seguinte”. E assim foi. Nostradamus morreu em 02 de julho de 1566, sendo sepultado de pé (para que ninguém pisasse em seus ossos) numa das paredes da igreja dos Cordeliers, em Salon. Alguns anos antes ele fizera uma profecia que tocava de forma particular a sua própria morte. Foi enterrado rigorosamente de acordo com os preparativos que ele próprio organizou. Junto a seu corpo pediu que fosse colocada secretamente uma placa de metal com um determinada data. Uma das lendas sobre Nostradamus dizia que todo aquele que bebesse utilizando o crânio de Nostradamus como se fosse um copo conquistaria a capacidade de também predizer o futuro. Porém essa mesma lenda dizia que tal conquista duraria poucos segundos, pois seu autor, em seguida, tombaria fulminado pela morte.

Em maio de 1791, durante a Revolução francesa, o túmulo de Nostradamus foi aberto por soldados bêbados que ficaram espantados diante de uma placa onde se lia “maio de 1791”. Um dos soldados desafiou a lenda e bebeu vinho no crânio de Nostradamus, morrendo em seguida, ao ser atingido por uma bala perdida.

Os restos mortais de Nostradamus foram então enterrados em outra igreja de Salon. E lá permaneceram até...

















CAPÍTULO 9

A ESPADA EXCALIBUR

“Muitas vezes os outros caminham por nós.”

(Duende Ernesto, o presbítero)



Agora, já em parte restabelecido de sua memória, Marvin começou a sentir uma aflição no peito. Além disso, seus cabelos verdes ouriçaram-se e a qualquer toque doíam... Não uma dor qualquer, mas uma dor elétrica, chata, incômoda.

“Cabelos quando doem na gente trazem coisa contente!”

“Cabelos quando doem na gente trazem coisa contente!”

“Cabelos quando doem na gente trazem coisa contente!”

Repetida assim três vezes, a frase funcionava como uma espécie de invocação. E era “luxo no buxo”, ou seja, sempre dava certo, trazendo sorte e até realizando desejos (só para quem tivesse cabelos espetados doendo).

INFELIZMENTE MARVIN NÃO SABIA DISSO.

Por outro lado, a aflição em seu peito acabou trazendo Torresmo de volta.

Mesmo contrariado, o livro de carne retornou...Uma força muito maior do que ele apontou-lhe “O GIGANTE DEDO DA INDIGNAÇÃO” e Torresmo veio voando-correndo até a mochila voadora.

Entrou nela sorrateiramente, sem Marvin perceber. Talvez quisesse tirar um cochilo ou apenas descansar um pouco.

NESSE MEIO TEMPO E TEMPO E MEIO, Nostradamus havia caído em seu sono habitual profundo de todas as semanas de quinze dias.

As aranhas também já dormiam com ele.

TERCEIRAS OBSERVAÇÕES EXTRAS SOBRE MERLIN NOSTRADAMUS:

DEPOIS DE SUA QUINTA MORTE, MERLIN NOSTRADAMUS PAROU DE FAZER PREVISÕES.

.......................................................................................................................................



-- Nostradamus!! Nostradamus!!! – Marvin chamou pelo seu nome e nada.

Até pensou em tentar despertá-lo com uma puxada de barba, mas aí refletiu melhor e resolveu não incomodar o mago. Afinal as aranhas poderiam despertar e aí...

Pelo ronco de Nostradamus, este não acordaria tão cedo. O melhor mesmo era seguir em frente... para cima... para os lados... para baixo... dependendo das circunstâncias mágicas...

E assim Marvin fez...

“Até já tinha me esquecido como é bom voar, voar, voar, voar...” -- Pensou ele

“TRIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIMMMMMMMMMMMMMPPPPP”

A paz do vôo foi interrompida pelo som desagradável de um relógio despertador... Pelo menos era o que parecia ser a princípio.

O “relógio” se chamava Torresmo, debatendo-se dentro da mochila com asas. Forçando um pouco mais ele acabou saindo e...

Bem na frente de Marvin, o livro de carne se abriu todo na página 2835364RRLPT.

E lá estava (morta e a cores) a doce menina loira, jazendo em seu caixão de vidro.

-- Lenora!! -- Suspirou Marvin.

Antes que Marvin pudesse olhar melhor a foto que já começava a se modificar, Torresmo abriu-se em outra página:

78546TPRS

-- Pare de mudar de página, Torresmo!

-- Mas, mas, não sou eu! Eu juro!

Marvin duvidou no olhar.

-- Não sou eu! Eu juro! Eu juro por tudo o que é mágico!

Marvin continuou duvidando.

-- Eu juro! Sinto que alguma força poderosa está fazendo isso comigo.

Na página 78546TPRS, uma lesma gigante, com imensos olhos de luz vermelha e mandíbulas sanguinolentas encavava Marvin. A imagem parecia tão real que até uma gota de baba respingou em sua camiseta branca.

Em seguida, um mosquitoranha pousou na gota e ficou mortalmente grudado. Sem perceber, Marvin “ganhara” um minúsculo broche.

Torresmo continuou jurando:

-- Eu juro! Eu juro! Eu juro!

-- Cale-se! – gritou Marvin.

Antes que Marvin pudesse estabelecer alguma relação entre as duas imagens, se é que havia, Torresmo, ou melhor a “força poderosa”, já havia virado de página:

67654434434433WWWER

Nenhuma imagem apareceu. Apenas palavras sem sentido para Marvin.

-- Leia essas palavras em voz alta! E rápido antes que elas resolvam desaparecer! –sentenciou Torresmo.

-- Por quê?

-- Vamos! Rápido! Não pense muito! São palavras super mágicas! Elas vão lhe mostrar o caminho! E antes que você diga que caminho, eu já vou explicando: Lenora! Lesma! Tudo tem relação.

Marvin não conseguia ver nenhuma. O que a doce Lenora teria a ver com uma lesma aterrorizante?

-- Vamos! Rápido!

MESMO QUERENDO SEMPRE AS COISAS BEM EXPLICADAS, MUITAS VEZES MARVIN ERA OBRIGADO A “ENTRAR NO ESCURO” NOS ACONTECIMENTOS MÁGICOS. TALVEZ PORQUE A MÁGICA DAS COISAS E DOS MUNDOS NÃO GOSTE LÁ MUITO DA LÓGICA HUMANA.

Marvin resolveu então soletrar baixinho aquelas estranhas palavras. Fez assim porque não se sentia seguro em pronunciá-las em alto e bom som.

Disse-as e nada aconteceu.

Foi aí que essa sua segunda mochila com asas falou pela primeira vez.

-- Pegue uma pílula dentro do meu bolso esquerdo!

-- Nossa! Pensei que você fosse muda! – observou Marvin.

-- Nem muda nem nada!

-- E por que você nunca falou antes comigo?

-- Fui orientada a falar somente em situações muito importantes e decisivas. Desculpe-me, mas agora tenho que ficar quieta ou...

E a mochila com asas se calou.

Marvin pegou então a pílula. Outra pílula do dragão Elvis Presley:

PÍLULA PARA SOLETRAR PALAVRAS INSOLETRÁVEIS.

Marvin “glubt” engoliu a pílula transparente cheia de letrinhas minúsculas... E assim aprendeu a dizer o indizível:

Aargarumzutp retornipjtcorium umptanumvtry rarramtraf mpra trondrunstrist estrohgfssiman trmistrov usquetreste assmin inumva nfhrujklpqw limbankjhtczturabfgtu uetrutgqzwauaraerrrm eoridjeitokwoudietugcxdstyb xwrdgfgdteurydhbvd ioaelebegfitrevxu stributiehlovesmerrante bcaraezcwuetddqfnduririatres eiosjcdtyeuw ovnaoazbdiemtglvoxcbvhgjtbv cveotufiemnbhqorl cieorntheofieuajak ahkaienglvporuei tueicnghtyzvcazxr fhryfuriedn ahsduecnfitubvuirh flgorncjdueo rjdceaoein birhtidutri vbnynmbvixoiseanjque anlri wabdelovetri tuytkfjhqieu reewufhqazcbvptpptadsrql cndfhorudi gurotigurunelatevroteut sfqreit.



Quando a última sílaba da última palavra foi dita, Marvin viu diante de si, flutuando na vertical, a famosa espada Excalibur que ele já conhecia à distância, lá do Rodeio de Dragões.

MARVIN FICOU COM MEDO.

Quase todo mundo em todos os mundos sabe um pouco sobre Excalibur. São tantas as histórias reais e inventadas que muitos se confundem, trocando umas pelas outras.

Entrando um pouco nas histórias e lendas que rodeiam a mais famosa de todas as espadas de todos os tempos e de todos os mundos, Excalibur teria sido criada nos reinos mais distantes e místicos de Arcádia, pela feiticeira conhecida no Mundo Humano como Viviane ou Dama do Lago.

O nome verdadeiro da espada Excalibur era Kaledfwich.

Excalibur pertencia a Uther Pendragon, rei dos Bretões que foi emboscado e mortalmente ferido em combate. Antes de morrer, ele cravou a espada em uma pedra para evitar que seus inimigos a tomassem (alguns dizem que Uther cravou a espada em uma bigorna).

O Mago Merlin Taliesin fez um feitiço sobre a espada que impedia que ela fosse retirada por qualquer um que não Arthur Pendragon, filho de Uther. Uma outra versão diz que a espada poderia ser retirada da pedra por alguém valoroso o suficiente para merecê-la. Muitos guerreiros tentaram, mas o único que conseguiu realizar tal façanha foi um rapaz franzino: era Arthur, ainda adolescente.

A espada mágica ajudou Arthur a vencer seus inimigos. Em uma dessas vezes, ao fazer uso dos grandes poderes de Excalibur para derrotar um poderoso guerreiro superior em técnica, o rei Arthur acabou quebrando-a. Amargurado por ter usado o poder da espada para derrotar um oponente mais forte, ele a jogou em um lago que possuía ligação com Arcádia.

A Dama do Lago consertou então a espada e a devolveu para Arthur.

O destino final de Excalibur também é incerto.

Dizem alguns, inclusive a página WEWRRDR645569797 do livro de carne, que pouco antes de morrer, Arthur entregou a espada à Dama do Lago...

MAS as informações sobre Excalibur não param por aí. Em alguns Mundos Mágicos, “caindo” das mãos calejadas de um duende para a pata de um dragão, passando dos tentáculos de um bruxo marítimo para as asas de um homem-falcão... a espada participou de muitas aventuras e matanças de segunda, terceira, quarta e até quinta mortes. Mas aí já seriam outras histórias, por isso retornemos a nossa:



MARVIN LEMBROU DO GIGANTE GURUMÃ. MAIS PRECISAMENTE DA TERRÍVEL CENA QUE PRESENCIARA LÁ NO RODEIO DE DRAGÕES: GURUMÃ, VALENTE GUERREIRO, TENDO SEU BRAÇO DIREITO E SUA CABEÇA DECEPADOS PELA ESPADA ASSASSINA, DIANTE DE MILHARES E MILHARES DE CRIATURAS.

A espada foi crescendo, crescendo, crescendo e Marvin foi se afastando, se afastando, se afastando... Torresmo o acompanhou.

-- E agora, e agora, o que é que eu faço? – perguntou Marvin baixinho para Torresmo.

-- Bem, deixe-me ver... A espada Excalibur, segundo as milhares de informações contidas em minhas páginas...

Quando Torresmo não sabia alguma coisa, ele começava a enrolar. Não gostava que pensassem que ele desconhecia algo... Afinal ele era um Livro Infinito. Um livro de “infinitas páginas” que viviam se alterando-alterando...

Nem todos os livros juntos têm todas as respostas. Torresmo sabia disso, mas algumas pitadas de orgulho colocadas nele não lhe permitiam total sinceridade.

Tanto no Mundo Humano quanto nos Mundos Mágicos existem muito mais perguntas do que respostas.

AS PERGUNTAS SÃO RÁPIDAS, LIGEIRAS, PULAM, SASSARICAM NAS CABEÇAS PENSANTES. AS RESPOSTAS SÃO LENTAS, TARTARUGAS. MUITAS VEZES SE ESCONDEM E DEMORAM ATÉ SÉCULOS PARA SE DEIXAR REVELAR...

Já atingindo uns três metros de altura, Excalibur passou a refletir com mais intensidade os raios cortantes do sol, em sua lâmina magicamente afiada.

Torresmo resolveu não ficar ali para ver o que acontecia... Rapidinho, “feito avestruz”, ele se escondeu dentro da mochila com asas...

Excalibur passou então a cortar o ar como se ele fosse sólido:

CRASSSSH... CRASSSH... CRASSSH... CRASSSSH... CRASSSH... CRASSSH...

UM GROSSO AR DE MAIS OU MENOS 50 CENTÍMETROS DE ESPESSURA.

Excalibur cortou o ar na forma de uma porta.

“BRUMPT”

O ar invisível caiu pesado no chão duro feito chumbo.

A abertura dava passagem para o azul.

MUNDO AZUL.

Excalibur foi então diminuindo até o seu tamanho original e atravessou a abertura.

Marvin já não tinha mais medo e foi seguindo a espada...

Com certeza Excalibur ainda estava enfeitiçada. Só que agora por alguém do Bem, querendo anonimamente ajudar Marvin.

No Mundo Azul, como o próprio nome já está dizendo, tudo era azul. Tudo, ou melhor dizendo, quase tudo.

SÃO TANTOS OS AZUIS. ALGUMAS CRIATURAS CONSEGUEM DISTINGUIR MAIS DE DUZENTAS TONALIDADES. BONS OLHOS ESSES.

Árvores azuis, grama azul, pedras azuis, montanhas azuis, sol azul...

Florestas azuis: Cheiro de lúpulo vindo das folhas úmidas fermentando no chão.

Céu azul se misturando com nuvens mais azuis ainda: cheiro do frescor de uma natureza aparentemente ainda intacta.

Todas as tardes caía uma chuva azul.

GOTAS AZUIS DE CHUVA.

E já estava bem na hora da chuva azul. Sempre pontualmente no mesmo horário. Deixando tudo mais azul ainda.

GOTAS DE ÁGUA AZUL.

Milhões de gotas.

Bilhões de gotas.

Trilhões de gotas...

Azul azulando ainda mais os animais azuis: elefantes azuis, coelhos azuis, cavalos azuis, pássaros azuis, tartarugas gigantes azuis, dromedários azuis, raposas azuis, gatos azuis, porcos azuis, borboletas-arraias azuis, lobisomens azuis de olhos vermelhos...

Azul azulando o rosto, os cabelos, os braços, os olhos, o tênis, a camiseta de Marvin...

MARVIN AZUL NO MUNDO AZUL.

Após cinco minutos de sessenta segundos cada, as nuvens azuis abriram passagem para o sol azul voltar a brilhar intensamente.



Sol e chuva – casamento de bruxa viúva.

Chuva e sol – noivado de duende espanhol.

Chuva e vento – divórcio de elmo-jumento.

Chuva e ventania – namoro da vampira Maria.

Após sete minutos de sessenta segundos cada, a chuva azul parou de chover.

Marvin continuou voando-seguindo a espada Excalibur.



ALGUMA COISA IMPORTANTE ESTAVA PARA SE REVELAR.





ENQUANTO ISSO NA CAVERNA DA MISTERIOSA CRIATURA DA CAIXA PRETA:

-- Tchau, você demorou bastante!

-- Ah! Por favor, não me chame mais de Tchau!

-- O quê?

-- É isso mesmo! Não me chame mais de Tchau! Já não gosto mais desse nome. Enjoei.

-- E que nome você escolheu agora?

-- Escolhi simplesmente o mais especial, o mais maravilhoso, o mais gostoso, o mais cheiroso, o mais mágico, o mais esplendoroso, o mais mais mais mais de todos os nomes...

-- É mesmo?

-- O mais...

-- Chega de tanto mais e diga logo!

-- Tipo assim!

-- Tipo assim, o quê?

-- Tipo assim.

-- Tipo assim?

-- É, meu nome agora é TIPO ASSIM – Tchau, ou melhor o ex-Tchau, gritou bem alto seu novo nome.

“Nunca ouvi uma palavra tão ridícula, mas acho melhor não contrariar o Tchau. Afinal ainda preciso muito dele” – pensou a Misteriosa Criatura da Caixa Preta.

-- Então já sabe, né? Nunca mais me chame de Tchau, senão nossa amizade corre um grande risco de ser extinta.

-- Tudo bem!

-- Tudo bem, não! Tipo Assim!

-- Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim! Tipo Assim!

-- CHEGA!!!

-- Não fique zangadinho! Agora já decorei o seu nome e nunca mais vou chamá-lo daquele outro. Como era mesmo o seu nome, Tipo Assim??

-- Estou gostando de ver. E acho que agora você é que vai gostar mais ainda.

-- Não me diga, mas me diga diga diga que você conseguiu...

-- Todas as cinco bolas de remorso?! Todas as cinco bolas de carniça?!

-- Sim! Sim! Sim!

--Não!

-- Não???? Mas você me deixou todo eufórico...

-- Não consegui as cinco, mas consegui quatro delas.

-- Quatro??? Bem é melhor do que uma, duas ou três.

-- Com quatro bolas de carniça, você já pode fazer alguns feitiços poderosos.

-- Poderosos sim, mas não aquele que eu realmente quero...

-- Se você soubesse como foi difícil conseguir as quatro bolas de remorso... E olha que nem vou lhe cobrar mais pelo meu esforço extra.

-- Esforço extra?

-- Eu tive que perseguir monstros do ar, do mar e das profundezas da terra. Quase caí dentro de um vulcão. Visitei mais de trinta Mundos. Perdi um dente cariado na luta contra um Minotauro. Quase fui parar nas Trevas Sólidas. E fiz tudo isso por você...

-- Por mim e pelos meus diamantes.

-- Isso são detalhes, detalhes.

A porcentagem de mentira na fala de Tchau, ou melhor, na fala de Tipo Assim, só poderia ser medida com uma pílula da verdade, inventada também pelo Médico Dragão Verde Elvis Presley.

-- Mas, mas, mas... Onde você escondeu todas as quatro bolas de carne. Não estou vendo nenhuma com você, Tipo Assim.

-- Calma! Calma! Elas estão bem aqui comigo.

-- Bem aqui, onde?

-- Eu as engoli!

-- Engoliu? Como?

-- Ah! Meu amigo! Apesar do meu tamanho, eu sempre tive um grande estômago.

-- Urgt! E haja estômago pra se engolir bolas de carniça.

-- Eu já-já vomito elas pra você.

-- Que coisa mais nojenta, Tipo Assim!

A Misteriosa Criatura da Caixa Preta fechou os olhos, enquanto Tipo Assim colocava um dedo da garganta para provocar o vômito necessário.

-- GLAMBTUM!

E saiu a primeira bola de carniça.

-- GLAMBTUM!

E saiu a segunda.

-- GLAMBTUM!

E saiu a terceira.

-- GLAMBTUM!

E saiu a quarta.

Todas já estavam bem maiores que uma bola de basquete. Afinal as bolas de remorso sempre crescem... Não param nunca...

Só não pergunte como Tipo Assim conseguiu engoli-las e depois vomitá-las como se fosse a coisa mais natural do mundo.

--RÃCT!!! Como elas fedem!!! – disse Caixa, possivelmente fazendo uma cara mais do que feia.

Ah! Ao contrário de muitos de seus amigos de mesma espécie, Tipo Assim odeia vermes e só conseguiu engolir as quatro bolas de carniça, porque misteriosamente tais “criaturinhas molenjentas ” não estavam mais lá...

Para quem não descobriu ainda, a palavra molenjentas é simplesmente uma mistura de molengas com nojentas. Apesar de nominar algo que ele odeia, Tipo Assim gosta muito dela. Gosta do som, do número de sílabas, gosta das letras que, uma ao lado da outra, parecem amigas inseparáveis, mais do que em qualquer outra palavra...

“Se algum dia eu tiver uma filha, adotada ou seqüestrada, com certeza ela se chamará Molenjentas. Assim mesmo. Molenjentas. No plural. Molenjentas, venha pra casa! Molenjentas, venha cortar as unhas dos meus dedões do pé! Molenjentas, me obedeça! Molenjentas, me faça uma torta de besouros verdes! Molenjentas...!”





CAPÍTULO 10

O CARACOL DO TEMPO

“Cada cor tem um sentido, uma mágica,

um mandamento, uma verdade e uma mentira.”

(Kuramanchu, o mago das mãos dos dedos de cobras)



Excalibur se deslocava a mais ou menos mil metros por minuto (ou melhor, sessenta quilômetros por hora). E lá ia Marvin voando em seu encalço... Abaixo dele a Floresta Azul, cheia de ervas mágicas, árvores falantes, cogumelos telepáticos, pedras fluorescentes, poderosos anões truculentos, gigantes escravos e criaturas inimagináveis até para as mentes mais criativas.

Vez por outra se via alguma clareira circular no meio da mata fechada. Nada a ver com discos voadores, como primeiramente alguém poderia pensar (principalmente depois de se ter assistido ao filme “Sinais” com o ator Mel Gibson).

Tudo culpa dos anões truculentos que, em quinze mil anos de existência e evolução para pior, devastaram mais de dez por cento da Floresta Azul (cinco vezes maior que a Floresta Amazônica).

O MUNDO AZUL JÁ NÃO É TÃO AZUL COMO OUTRORA.

Árvores falantes são vendidas como animais de estimação, digo, como árvores de estimação para muitos Mundos Mágicos. Ervas e cogumelos, nem se fala então... O Mundo Azul é um dos maiores fornecedores de substâncias mágicas.



Marvin já estava ficando com frio.

“Bem que o dragão Elvis Presley podia inventar também uma pílula-super-jaqueta-de-couro-ou-coisa-parecida!” – pensou ele.

O vento azul gelava e murchava a pele, mas ao mesmo tempo iria trazer o passado que já queria se misturar com o futuro:

E assim foi:

ZUMPT... Toda azul e cheia de luz, a jovem Lenora passou por Marvin.

ZUMPT... Nem dez segundos depois e Marvin ainda assustado viu Lenora passar por ele outra vez.

-- Lenora!!! Lenora!!!

Marvin gritou o nome da amiga loira.

Ela parecia tão real. Tirando o azul, é claro.

NO MUNDO AZUL ALGUNS PENSAMENTOS GANHAM FORMA, ALGUNS DESEJOS TAMBÉM.

“Feche os olhos, Marvin! No Mundo Azul, os pensamentos não gostam do escuro! Feche os olhos, Marvin! No Mundo Azul, só se sonha acordado e de olhos bem abertos! Feche os olhos! Pensar e sonhar demais pode fazer mal ao corpo e ao espírito!”

Marviu ouviu o conselho sussurrado bem lá dentro de seu cérebro e se deixou levar pela mochila com asas. O conselho sussurrador era na verdade um vento sussurrador. Não o vento azul que batia em seu rosto devido a velocidade, mas um vento que se formava dentro de sua própria cabeça. Um vento voando através de seus neurônios, um vento desbravador de segredos. Um vento “conta a gota”. Um vento sábio. Talvez mais sábio que o Livro de Carne.

Besteira! Que comparação mais besta! Quem disse que livros são sábios? Livros não são sábios coisa nenhuma. Eles podem conter informações, leis, dogmas, receitas, preceitos e preconceitos, histórias, experiências, bruxarias, verdades, mentiras, maldades... A sabedoria não está nos livros. A sabedoria está na vida. Ou na morte. Ou na pós morte, ou até na pós-pós-pós-pós morte.

A SABEDORIA ESTÁ NA ALQUIMIA DE SE PROVAR AS COISAS DO MUNDO E SABER ESCOLHER E SABER APRENDER.

A SABEDORIA NÃO É PETULANTE. A SABEDORIA NÃO É NARIZ EMPINADO. A SABEDORIA NÃO É PORCO ESPINHO. A SABEDORIA NÃO É “MOURA TORTA”. A SABEDORIA NÃO É DESONESTA. A SABEDORIA NÃO É INTRIGUEIRA. A SABEDORIA NÃO PODE SER MÁ.

A sabedoria é sempre sincera. A sabedoria é solidária e amiga. A sabedoria tem mãos de fada, tem tudo das fadas. A sabedoria tem as cores do arco-íris. A sabedoria tem sempre um pote de ouro no final...



Marvin não queria ficar com os olhos fechados tanto tempo.

Um minuto com os olhos fechados já é muito quando não se quer dormir. Marvin ficou três...

Quando abriu os olhos, não havia mais Floresta Azul. Agora abaixo dele, um imenso vulcão.

Um vulcão expelindo lava incandescente.

E a lava incandescente era também azul.

Nessas alturas Excalibur já havia parado de “voar”. Estava flutuando no ar como se pensasse em alguma coisa.

Espadas mágicas e enfeitiçadas pensam?????????????????????????????????????

Sabe-se lá, talvez alguém pense por elas. Esse mesmo alguém que as enfeitiça. E talvez esse mesmo alguém estivesse vendo toda a cena através de uma bola de cristal, ou de espelho de água sólida, ou com uma luneta mágica ou com um dos livros de carne.

UMA CURIOSIDADE: certos magos costumam ver outros mundos e seres e coisas através dos olhos de Gaudalidar. O difícil é conseguir pegar o peixe e imobilizá-lo. Sem um bom feitiço nada feito.

Gaudalidar não vive nos rios e muito menos no mar. Gaudalidar nada-voa nas brumas, nas nuvens... Às vezes, brinca no céu azul ou junto ao pôr-do-sol (seja ele de que cor for). De bagre em tubarão e até baleia, Gaudalidar muda de tamanho para enganar-assustar seus predadores. Sorte de Gaudalidar que só é possível ver o que se deseja através de seus olhos vivos, muito vivos.

Mas chega de falar de Gaudalidar, o que nos interessa agora é saber o que pretende Excalibur.



A mochila com asas permaneceu ruflando a uns dez metros da espada.

Excalibur passou a cortar o ar como se estivesse lutando contra um monstro invisível. E já que não era luta, só podia ser algum tipo de ritual.

Após alguns segundos, a espada mergulhou... rumo ao encontro da lava azul incandescente.

Marvin ficou apenas olhando... Até que o desespero tomasse conta de seu corpo e alma...

TODO DESESPERO VEM ACOMPANHADO DO PERIGO, DA INCERTEZA DAS COISAS, DA IMPOSSIBILIDADE DE MODIFICAR O FUTURO TERRÍVEL QUE SE APROXIMA...

-- Pare!!! Pare!!! Eu estou mandando! – Nenhuma das palavras de Marvin foi levada em consideração. A mochila com asas estava mesmo mergulhando, seguindo a espada... E pelo jeito nada iria detê-la...

-- Pare!!! Elvis??? Elvis??? Cadê você que inventou essa coisa louca???

Lá embaixo, Excalibur emitia descargas elétricas ao entrar em contato com a lava incandescente...

E já estava chegando a hora e a vez de Marvin.

E já estava chegando a hora e a vez de Marvin.

Excalibur afundou-desapareceu na lava.

E já estava chegando a hora e a vez de Marvin.

E já estava chegando a hora e a vez de Marvin.

PENSADO E FEITO: Marvin também mergulhou na lava incandescente azul, mas sem emitir descarga elétrica alguma.

TRISTE FIM PARA MARVIN. Morrer como morriam os Incas que iam para o sacrifício. Morrer consumido por um calor de mais de mil graus centígrados. Morrer no fogo sólido e movediço. Morrer até ser dissolvido completamente pela lava. Morrer sem deixar identidade alguma.

Nenhuma marca: nem dentes nem ossos nem nada.

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Contrariando a lógica inevitável da física, Marvin passou pela lava...

SÃO E SALVO.

Só que agora mais lambuzado de azul ainda.

Abaixo da lava havia uma caverna gigantesca.

A mochila teimosa resolveu então planar para reconhecimento do local. Ufa!!! E Marvin pôde respirar... respirar UM POUCO MENOS INTRANQÜILO.

Nas paredes da imensa caverna, centenas de cavernas menores escondiam pequenas luzes vermelhas, sempre à espreita.

Não há necessidade de se dizer que nessas alturas o instinto mágico de Marvin estava mais apurado do que nunca.

DESCONFIADO, MAS CHEIO DE ADRENALINA ESOTÉRICA.

“Isso tudo, pensando agora mais calmamente, só pode ser mesmo coisa do Elvis... Eu até gosto quando ele tenta me ajudar... Mas desse jeito, eu vou acabar tendo um ataque cardíaco. Afinal, que eu saiba, meu coração ainda é um coração humano... E pelo que eu estou sentido agora, já-já vem mais coisa por aí... Surpresas eu até gosto delas. Mas assim?!! Uma seguida da outra, sem espaço para um necessário descanso?... Até parece que eu estou participando de um filme de aventuras... Pior, até parece que eu estou participando de um filme de terror... E essas luzes vermelhas escondidas nesses buracos? Não sei não. Esses olhos vermelhos não têm cara de ser boa coisa...”

A mochila com asas pousou Marvin no chão também azul. À sua frente, o maior de todos os buracos: uma caverna de onde poderia sair, a qualquer momento, um imenso dragão lança-chamas ou lança-jato-de-gelo ou lança-ácido... Pelo menos foi isso que o ex-menino de cabelos verdes imaginou a princípio.

Ao tentar dar o primeiro passo, Marvin sentiu que seu tênis estava grudado no chão. Ele havia pisado em um caminho de “gosma superbonder” que continuava até a caverna escura. A mochila tentou tirá-lo daquela situação, ruflando suas asas com mais força e velocidade... Infelizmente Marvin permaneceu preso ao chão azul.

Nessas alturas, ou melhor dizendo, nessas baixuras, a espada Excalibur, que bem podia dar uma ajuda, já havia desaparecido...

“Talvez estivesse escondida dentro de alguma caverna. Será? Mas por que motivo? Talvez...” Para interromper um pensamento só mesmo a realidade:

“BRRRRRAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAASSSSSSSSSSSSSSSTTTT!!!”

Um bafo-aviso-quente-fedorento veio então lá de dentro da caverna e atingiu todo o Marvin.

“BRRRRRAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAASSSSSSSSSSSSSSSTTTT!!!”

Um novo bafo-aviso-quente-fedorento mais intenso ainda fez Marvin entender muito bem que ele não era bem vindo ali.

Antes que um terceiro bafo-aviso-quente-fedorento acontecesse, Marvin se abaixou, desamarrou o tênis e tentou pular para além do caminho de “gosma superbonder”.

ERRO DE ESTRATÉGIA: o caminho de “gosma superbonder” tinha mais de quinze metros de largura imperceptível e Marvin estava bem no meio. Sorte que a mochila com asas foi rápida o suficiente para levá-lo às alturas.

ACERTO DE ESTRATÉGIA???????????????????????????????????????????????? O certo mesmo era voar para dentro da caverna da criatura da “gosma superbonder”. Epa! Mas e o bafo-aviso-quente-fedorento? Marvin já não tinha certeza se poderia suportá-lo novamente.

Não sem uma máscara contra bafo-aviso-quente-fedorento.

E agora, o que fazer???

Talvez o Livro de Carne tivesse alguma resposta.

-- Torresmo! Torresmo! Você vai ficar a vida toda aí dentro da mochila? – perguntou Marvin.

Torresmo devia ter caído em um daqueles sonhos profundos que chegavam a durar até semanas. Só havia uma maneira de acordá-lo: fazendo longas cócegas em suas orelhas de livro. Pena que Marvin não sabia disso.

É INCRÍVEL COMO SE DORME NOS MUNDOS MÁGICOS!!!

-- Torresmo! Acorde! Acorde, seu livro preguiçoso!

Em pleno vôo, após algum esforço contorcionista, Marvin conseguiu pegar-puxar Torresmo para fora.

O livro de carne continuava em seu sono animação suspensa.

Marvin abriu Torresmo e folheou algumas páginas. Para sua surpresa, todas estavam sem palavras, sem desenhos, sem símbolos, sem fotos, sem imagens animadas... Folheou outras e outras e outras... E a mesma decepção vazia.

QUANDO UM LIVRO DE CARNE DORME, ELE SE APAGA TOTALMENTE.

ÚLTIMA TENTATIVA: Marvin colocou sua boca bem próximo do Torresmo aberto e gritou:

-- TTTOOOORRRRESMOOOOO!!! ACOOOOORRRRRDDDDEE!!!

Torresmo permaneceu “desanimado”.

Desta vez a fala-grito de Marvin ecoou toda pela imensa caverna. Os olhos vermelhos das centenas de cavernas menores pareceram maiores e mais ameaçadores.

Por um instante, Marvin raivoso pensou até em jogar Torresmo fora. Mas foi só um instante. Afinal aquele livro não era qualquer um. Torresmo, apesar dos pesares, era um livro mágico um tanto raro e, portanto, cobiçado por muitos, principalmente por aqueles que sabiam usá-lo bem.

Marvin se contorceu novamente para guardar o “imprestável” Torresmo na mochila. Restava agora somente a ele encontrar a espada Excalibur. Afinal fora ela que o trouxera ali.

“Mas como???? Ali só havia cavernas olhudas. Possivelmente nada amigáveis...”

Marvin não estava disposto a entrar em nenhuma delas. Só no último do último dos casos... Pressentia algo ruim. Muito ruim.

“E se Excalibur já tivesse fugido para outra dimensão qualquer?”

NOS MUNDOS MÁGICOS, CERTAS COISAS E CRIATURAS SOMEM COM A MAIOR FACILIDADE.

Nessas horas de apuro, Marvin sempre se lembrava do amigo dragão verde Elvis Presley. Outro que vinha a sua mente era o também amigo Etecétera.

“Puxa! Faz tanto tempo que não vejo o Etecétera. Onde será que ele se encontra agora? Por que não vem até mim? Afinal eu continuo sendo o seu dono. Com Etecétera aqui seria tudo mais fácil... Será? Bem que ele poderia se transformar em...”

ENQUANTO MARVIN PENSAVA, A MOCHILA QUE TAMBÉM PENSAVA, MAS NO MOMENTO NÃO PENSAVA NADA, PERMANECIA VOANDO- PLANANDO, VOANDO-PLANANDO PELA IMENSA CAVERNA AZUL.

“... um imenso dragão que lança fogo... Primeiro nós dois entraríamos na caverna da criatura gosmenta e se ela resolvesse se fazer de engraçadinha... Fogo! Fogo! Mas espera aí! Essa criatura tem alguma coisa a ver com a possibilidade de se salvar minha amiga Lenora. Não sei ainda o quê, mas tem, pelo menos foi isso que Torresmo havia me dito. E acho que é por isso que estou aqui. Certamente! Claro! Com certeza! Só pode ser isso mesmo. Espero que tudo dê certo. Pobre Lenora!... E se não podemos destruir a criatura, temos que conquistá-la de algum modo... Se ao menos nós soubéssemos o que temos que fazer... Puxa, que coisa mais boba! Eu aqui falando como se fosse nós. Eu aqui falando no plural e me sentindo mais sozinho e singular do que nunca...”

O pensamento de Marvin iria continuar... Talvez até se transformasse em estratégia. Talvez até acordasse o seu inconsciente mágico... Talvez... Se não fosse interrompido por:

-- Olá, Marvin! Até que enfim consegui chegar até você!

NOS MUNDOS MÁGICOS, CERTAS COISAS E CRIATURAS APARECEM COM A MAIOR FACILIDADE.

-- Elvis?! É você?

-- Claro! Não vê que sou eu? Seu sempre amigo.

-- Assim tão pequeno? Assim tão anão? Pelo jeito você gostou mesmo da Confraria dos Dragões Anões e resolveu voltar lá sozinho, não?

PASSANDO PELO MUNDO AZUL, ELVIS ACABOU FICANDO TODO AZUL TAMBÉM.

-- Não é nada disso, Marvin. Se você soubesse todo o meu sofrimento... Estive muito doente, aliás ainda estou...

-- E o que tem a ver sua doença com o seu tamanho anão?

-- Tudo! Essa maldita doença do remorso diminui as criaturas, até elas desaparecerem por completo. É terrível. E depois ainda ter de agüentar cem anos nas Trevas Sólidas. Acho que ainda não estou preparado para isso.

-- Você está falando sério mesmo?

MARVIN NÃO QUERIA ACREDITAR NAQUILO TUDO.

-- Pode acreditar. Nos Mundos Mágicos, algumas doenças são bem diferentes daquelas do seu mundo. Principalmente nos sintomas.

-- Mas para que tanto receio. É só você inventar uma pílula contra essa doença do remorso. Afinal, nisso você é muito bom.

-- Infelizmente as coisas não são bem assim. Até agora ninguém conseguiu inventar um remédio ou um feitiço que funcionasse para curar essa maldita.



ALGUMAS DOENÇAS COMUNS NOS MUNDOS MÁGICOS:

GRIPE VAMPIRISCA

DIARRÉIA DE SAPINHOS

AMNÉSIA GALOPANTE

ARTERIOSCLEROSE RISONHA

CAXUMBA PELUDA

ECLÂMPSIA NOTURNA

ELEFANTÍASE FANTASMAGÓRICA

EPILEPSIA DANÇARINA

FEBRE DA INVISIBILIDADE

FLATULÊNCIA SUPERSÔNICA

FURÚNCULOS PNEUMÁTICOS

HIPERTENSÃO ALADA

LARINGITE RONCADORA

MENINGITE EXOTÉRICA

PNEUMONIA VOADORA

REUMATISMO CRACK-CRECK-CRICK

VERRUGAS FALANTES

SARAMPO ESCORREGADIO

CORAÇÃO MURCHO

CORAÇÃO BALÃO

DOENÇA DO REMORSO.



MUITAS DESSAS DOENÇAS PODEM LEVAR ATÉ O MAIS PODEROSO DOS MAGOS À DIMENSÃO DAS TREVAS SÓLIDAS.



-- Mas deve haver alguma saída. Em algum Mundo Mágico...

-- Que há, há! Só não sei se vou ter tempo suficiente e forças para....

-- Eu posso te ajudar...

-- Não! Agora você é que precisa se ajudar, ajudando Lenora... Eu já tomei alguns chás, algumas pílulas, alguns banhos especiais e me sinto um pouco melhor. Mais do que isso é impossível para alguém na minha situação.

-- Mas Elvis, não há nada que eu possa fazer?

-- Não!

-- Em nome de nossa amizade!?

-- Em nome de nossa amizade, Marvin, siga o seu destino! Eu não caibo nele por enquanto... Eu preciso me salvar sozinho.

MARVIN FICOU EM SILÊNCIO. JÁ NÃO SABIA O QUE DIZER.

-- Não precisa dizer nada... O que você precisa agora é compreender.. ou melhor... aceitar... A espada Excalibur vai lhe ajudar... Consegui tirar dela toda a essência do mal que assassinou o Gigante Gurumã. Agora ela é só do bem, uma espada abre caminhos. Excalibur ajudará você a salvar Lenora das terríveis Trevas Sólidas...

-- Então foi você???

-- Jamais poderia deixar um amigo sem a minha proteção. Principalmente porque a mochila com asas ainda não é completamente confiável. Mas não se preocupe, ela está ainda na garantia.

“E só agora ele me diz isso.” – pensou Marvin.

-- Espero que ela não tenha feito nada de grave contra você. Mas pelo seu ótimo estado, acho que não... Estou tentando aprimorar a pílula, mas ultimamente minha doença não tem permitido...

OS AMIGOS FORAM FEITOS PARA SE AJUDAREM. UM AMIGO VERDADEIRO NÃO SE ACHA TODOS OS DIAS. UM AMIGO DE VERDADE FAZ O SOL BRILHAR NA TROVOADA. EXAGEROS À PARTE, ELVIS ACREDITAVA PIAMENTE QUE UMA AMIZADE SINCERA PODIA MUDAR TUDO PARA MELHOR.

-- Elvis, pelo menos uma coisa boa aconteceu com essa sua doença!

-- Marvin, nem me lembre dela, por favor!

-- Mas, mas... veja pelo lado bom!

-- E esse lado bom existe?

-- Claro! Agora nós podemos falar praticamente olho no olho. E antes, você quase sempre com aquele tamanhão todo, era meio difícil... Ah! E agora também temos mais uma coisa em comum. Ambos estamos lambuzados do azul do mundo azul.

ELVIS RIU UM RISO PEQUENO E “COMENTOU” PENSATIVO:

-- É verdade, Marvin! É verdade!

UM SILÊNCIO QUE DUROU O TEMPO DE UMA BALEIA BRANCA ATRAVESSAR O CÉU AZUL INTERROMPEU O DIÁLOGO ENTRE OS DOIS.

“Baleia branca!? No céu azul?!” – admirou-se Marvin. E como ele nunca havia ouvido falar em Gaudalidar, ficou achando que era simplesmente uma baleia branca voando no céu azul.

GAUDALIDAR GOSTA DE VIAJAR PELOS MUNDOS MÁGICOS E FELIZMENTE NÃO PRECISA DE “PASSAPORTES” OU DE PORTAIS PARA ISSO. GAUDALIDAR É TAMBÉM IMUNE AO AZUL DO MUNDO AZUL.

Em seguida o diálogo retornou, com as dúvidas de Marvin:

-- Elvis, onde está Excalibur agora? Você disse que ela irá me ajudar...

-- Tudo no seu momento certo. Tudo no seu momento certo...

Marvin sentia que muitas vezes a fala de Elvis significava só enrolação, assim como Etecétera costumava fazer. No caso da doença, Marvin não sentiu isso. Sentiu verdade e dor naquilo tudo.

NINGUÉM PODE FINGIR UMA GRANDE DOR.

-- Ufa! Essa doença tem deixado até as minhas asas mais fracas. Perco o fôlego com freqüência... Preciso descansar minhas asas! Vamos descer em chão firme!

-- NÃO!!! – gritou Marvin... E o seu “não” ecoou novamente pela imensa caverna.

NÃO! NÃO! NÃO! NÃO! NÃO! NÃO!... Um “não” feito bolinha de ping-pong. Batendo em uma parede e em outra e no chão e em outra e no chão e em outra parede... Um “não” se transformando em centenas de pequenos “nãos” que entraram nas centenas de “cavernas dos olhos vermelhos”.

-- Não! Por quê?

-- O chão está cheio de gosma gosmenta que não desgruda mais. Até parece cola superbonder!

-- Gosma gosmenta que não se desgruda mais... Obrigado pelo lembrete... Já havia até me esquecido dela, mas vim preparado para isso...

Elvis tirou então duas pílulas de sua nova “pochete” feita de couro de lobisomem azul.

“POCHETE” DE COURO DE LOBISOMEM AZUL, ÚLTIMO LANÇAMENTO DA GRIFE DO FAMOSO BRUXO ESTILISTA HUDGAR BRANTROVISCK. INFELIZMENTE ELVIS ESCOLHERA UM PÉSSIMO LOCAL PARA EXIBIR SUA MAIS NOVA AQUISIÇÃO DE MODA ESPECÍFICA PARA DRAGÕES.

UMA CURIOSIDADE: AS “POCHETES” DE COURO DE LOBISOMEM AZUL ACOMPANHAM O TAMANHO DE SEU USUÁRIO...

As duas pílulas flutuaram em frente aos dois e então ganharam forma de catarro.

-- Tome uma! Essa desce mais fácil do que as outras ainda!

Marvin sentiu nojo e Elvis provou primeiro.

Marvin continuou com nojo.

-- Vamos Marvin! Esta pílula é super saborosa, coloquei um gostinho de “tingue-lingue” nela!

Falando assim parecia mais fácil e Marvin, já menos enojado, engoliu a dita cuja.

E não é que era gostosa mesmo! Sabor de “tingue-lingue” sem aquela sensação de borracha que a fruta tinha.

E assim, engolidas as pílulas, Elvis e Marvin puderam descer até o chão azul...

-- Elvis, tudo bem que você não quer antecipar as coisas, mas eu preciso saber de algumas delas. Preciso de informações para salvar Lenora. Até agora não sei a relação entre minha amiga e aquela lesma monstruosa que vi ligeiramente no livro de carne.

-- A lesma monstruosa está naquela caverna! – Elvis apontou para a grandona de onde vinha o caminho de gosma. – Só você e Excalibur serão capazes de derrotar a lesma. E só você será capaz de salvar Lenora. Afinal a amiga é sua.

NA MAIORIA DOS MUNDOS MÁGICOS SOMENTE UM GRANDE AMIGO PODE SALVAR OUTRO AMIGO. QUEM NÃO TEM AMIGOS ESTÁ PERDIDO. É MUITO TRISTE, ATÉ FATAL, NÃO PODER SER SALVO POR NINGUÉM.

-- Mas onde está Excalibur, afinal?

-- Excalibur está com você!

-- Comigo? Onde? Na mochila eu acho que ela não cabe. A não ser que tenha encolhido muito.

-- Marvin, Excalibur está agora bem pequenininha ao lado do seu coração... Assim que você a desejar realmente, ela aparecerá para ajudá-lo...

-- Mas eu já estou desejando...

-- Não o suficiente! Não o suficiente!

-- E quando esse tal suficiente vai acontecer? – perguntou Marvin já meio impaciente.

-- No momento certo!

-- No momento certo!? Você e essa mania de “momento certo”!

-- O momento certo virá daqui a pouco... A lesma monstruosa conhecida por nós como SASKANHANEM, ou simplesmente Caracol do Tempo, já acordou e já sentiu a nossa presença.

SASKANHANEM PERCEBE VISITAS PELO SEU PAR DE GORDAS ANTENAS DE LESMA E TAMBÉM PELO CONTATO DE SUAS “VISÍTIMAS” COM A GOSMA SUPERBONDER.

-- Caracol do tempo???

-- Calma, Marvin! Primeiro precisamos...

A fala de Elvis foi então interrompida pelos uivos das criaturas donas dos olhos vermelhos.

-- Marvin, antes que Saskanhanem apareça, você terá de derrotar esses uivos! Vamos, tome está pílula minimini-tornado! E Marvin engoliu, ou melhor, foi a própria pílula que veio voando até sua boca para ser engolida...

PÍLULA MINIMINI-TORNADO. MARVIN ENGOLIU SEM SABER O SEU EFEITO. MAS VINDO DE ELVIS SÓ PODIA SER ALGO BOM.

-- Elvis!! Você... Elvis???

Nisso Elvis já havia desaparecido mais do que ligeiro, sem dar maiores ou menores explicações.

Os uivos continuavam...

De repente um par de olhos vermelhos saltou de uma das cavernas. Saltou bem em frente de Marvin.

Em seguida, outros pares de olhos vermelhos fizeram o mesmo.

Marvin se viu cercado por dezenas, centenas deles.

AH! CADA PAR DE OLHOS VERMELHOS VINHA ACOMPANHADO DE UM CORPO PELUDO NO FORMATO DE LOBISOMEM AZUL. CADA QUAL TINHA MAIS OU MENOS O TAMANHO DE MARVIN.

Os uivos cessaram...

Marvin desejou a espada Excalibur. Desejou, desejou sua presença ali em suas mãos. Desejou intensamente. Tão intensamente que desejar mais seria impossível... E assim o seu desejo se transformou em uma pequena queimação no peito... Poucos segundos... A queimação foi então crescendo, crescendo, crescendo... até atingir uma dor fumegante insuportável. Marvin caiu no chão. Já não tinha mais o controle de seu corpo. A dor o controlava...

Marvin gemeu, gritou, urrrou....

Seus olhos lacrimejantes pediram piedade... E nenhuma piedade apareceu.

MAS COMO TAMBÉM NOS MUNDOS MÁGICOS, HÁ MALES QUE VÊM PARA O BEM...

Os lobisomens azuis ficaram apenas observando tudo aquilo. Queriam atacar, mas algo neles dizia que não podiam... AINDA.

Assim que Marvin desmaiou, um feixe de luz atravessou o seu peito de carne humana como se fosse feito de manteiga: era Excalibur.

A ex camiseta branca virou um trapo queimado, enquanto a marca da espada ficaria “tatuada” em sua pele-carne: uma cicatriz saliente que o menino verde levaria para sempre junto de si.

CICATRIZES SÃO REGISTROS CARNAIS DE VIDA E DE MORTE. AS CICATRIZES CONTAM HISTÓRIAS. AS CICATRIZES VÃO CONOSCO ATÉ O TÚMULO. E ÀS VEZES ALÉM DELE.

Para Excalibur aquela cicatriz significava um pacto. Um pacto de ajuda. Por enquanto unilateral. Pena que Excalibur já tivesse feito outros pactos também. E isso mesmo era difícil, quase impossível, ajudar a todos aqueles com os quais ela havia simpatizado. Pelo menos não o tempo todo. Mas nos momentos mais importantes e decisivos e perigosos, certamente ela estaria lá... Mesmo que, às vezes, um pouco atrasada.

Flutuando acima de Marvin, a espada já foi aumentando até atingir o seu tamanho original.

Nada disso, porém, afugentou os lobisomens azuis, já que eles nunca tinham visto ou ouvido falar de uma espada poderosa chamada Excalibur. Se os pobres coitados soubessem, certamente sairiam correndo como cachorros amedrontados.

Assim que Marvin abriu os olhos, um dos lobisomens mais afoitos resolveu dar o bote. E aí Excalibur começou o seu trabalho sanguinolento, cortando o bicho em duas partes. Uma delas caiu bem ao lado de Marvin que desmaiou novamente.

ALGO AINDA INEXPLICÁVEL ESTAVA ACONTECENDO COM O NOSSO PERSONAGEM PRINCIPAL, OUTRORA JÁ ACOSTUMADO A TANTAS COISAS E SITUAÇÕES ESTRANHAS E MACABRAS.

Outro lobisomem e outro e outro e outro e outro vieram em seguida... Excalibur acabou com todos eles, cortando-os literalmente em pedaços.

O chão ficou lambuzado de sangue vermelho de lobisomens azuis.

Uma chuva deles tentou então cair sobre Marvin, mas nenhum conseguiu sequer arranhar o menino.

Excalibur não parecia ser apenas uma espada. Dava a impressão de várias. Sua velocidade fazia com que estivesse aqui, ali, lá, acolá... Em muitos lugares ao mesmo tempo... QUASE.

Em poucos minutos, o chão da caverna ficou forrado de pedaços de lobisomens azuis.

Os últimos deles fugiram para suas tocas...

Marvin acordou todo lambuzado de sangue vermelho de lobisomem azul.

O caminho para a Caverna da Lesma Gigante estava livre.

AH! TODA LESMA GIGANTE TEM O SEU CARACOL GIGANTE CORRESPONDENTE.

Mesmo receando aquele bafo quente da criatura, Marvin criou novamente coragem e foi na frente... e Excalibur, já em seguida.

Lá dentro tudo era escuridão. Excalibur cutucou várias vezes a mochila com asas para acordar Torresmo que “à noite” ganha luz própria: LUZ-TELA-DE-TELEVISÃO.

Meio contrariado, o livro de carne saiu de seu aconchego, obrigando-se a se abrir para Marvin.

Na página RGRTFRDEYU46454587:

INFORMAÇÕES ADICIONAIS SOBRE SASKAHANEM:

Os Caracóis Gigantes são moluscos pertencentes a Classe Gastropoda e subclasse Pulmonata. Já foram milhões por todos os Mundos Mágicos. Caçados indiscriminadamente, hoje não passam de cem mil. Antigamente os Caracóis Gigantes eram ternos e amigos. A poção mágica de um Mago os tornou violentos e assassinos. Foi só assim para eles conseguirem se salvar. A violência é o que lhes deixa vivos.

NÃO SE PODE SER BOM COM AQUELES QUE NÃO NOS QUEREM BEM.

SASKAHANEM é o líder dos Caracóis Gigantes. Apesar de poderem se comunicar por telepatia, de vez em quanto, eles se reúnem para trocar experiências vividas.

Os ovos dos Caracóis Gigantes chegam a pesar uma tonelada. Cada caracol bota apenas um ovo a cada cem anos. São as únicas criaturas que podem viver mais de dez mil anos. Mas apenas Saskahanem, o líder e mais velho de todos os caracóis, pode viajar no tempo através de todos os mundos.

Mesmo poderoso e muito mal, Saskahanem, o caracol do tempo, conta com seus guardas, os lobisomens azuis. Eles estão ali para protegê-los de quem tentar importuná-lo.

Assim como algumas outras criaturas, os Caracóis Gigantes quando morrem não vão para as Trevas Sólidas. Eles apenas se desmancham para nunca mais. Nunca mais mesmo.

“Então é isso! Então é assim que eu vou conseguir salvar minha amiga Lenora.”- pensou Marvin, ansioso com sua “descoberta”.

Marvin continuou lendo o texto que subia na página, como sobe nos computadores. Precisava de mais informações.

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“Epa!? Mas o que é isso????”, perguntou Marvin para si mesmo, já imaginando que havia dado piripaque em Torresmo.

PIRIPAQUE, segundo o Dicionário dos Magos Especialistas em Dicionários, é uma poção mágica que quando bebida quente, deixa as criaturas “doidinhas da silva”, “doidinhas de pedra”.

Sem saber o que fazer, mas já fazendo, Marvin deu uma sacudida em Torresmo e assim o livro de carne voltou ao normal. O “piripaque” era apenas um falha técnica que acontecia sempre depois de um sono não sonhado o suficiente... e parava de um momento para outro:

Os Caracóis Gigantes ou Lesmas Gigantes ou Lesmas Carnívoras Gigantes, diferentemente de seus minúsculos parentes de jardim, são muito rápidos. Podem andar a mais de cem quilômetros por hora, quando querem. Geralmente não fazem isso, por terem muita preguiça.

A comida preferida dos Caracóis Gigantes é uma vaca, um elefante, um rinoceronte, ou até mesmo um dragão assado. Para acompanhar: farofa de enxofre e laranjas gigantes. Para beber, vinho de abutre. Sim, isso mesmo: VINHO DE ABUTRE. Segundo todos aqueles que experimentaram, é uma delícia indescritível..

-- Torresmo! Quanta informação inútil você está me passando agora!!!

-- Calma! Calma!

-- Mas eu estou calmo! Ou melhor dizendo, não estou calmo coisa nenhuma. Portanto, caro livro, faça o seu trabalho!

Torresmo continuou sua tarefa, enquanto Excalibur ficava ali de guardiã, cuidando de Marvin.

Cuidado com a gosma dos Caracóis Gigantes. Você pode ficar preso nela para sempre. Já aconteceram casos em que amantes, prometendo juras eternas, usaram a gosma para nunca mais se separarem. O pior veio algum tempo depois: um arrependimento atroz, principalmente para aqueles que tinham se grudado à sogra também.

-- Torresmo! Chega! Não quero mais ficar lendo tanta besteira!

-- Mas, mas, a culpa não é minha. Não sou eu que escrevo os textos. Eles vêm a mim, assim, sem eu pedir, sem eu querer... Estou carregado de ciência, política, magia, piadas, poções, labirintos, segredos, mapas, desenhos, fotos, imagens em movimento... Estou carregado de verdades e de mentiras também. Cabe aos meus leitores separá-las, escolhê-las, modificá-las, usá-las ou não... E afinal de contas, os outros livros não são assim também???

Diante da pergunta que, na verdade, não era lá uma pergunta (pois havia sido feita para não ser respondida), Marvin se calou.

Atento ao livro de carne, ele quase se esquecera do caracol que devia estar em algum lugar ali dentro daquela imensidão cavernosa, cheia de silêncio e escuridão.

SASKANHANEM tem trezentos filhos, quatrocentos netos, mil bisnetos e novecentos tataranetos. Aí já dá para se ter uma idéia da sua idade. Ligeiramente...

-- Chega! Torresmo! Chega!

-- Mas, mas, mas...

-- Não diga mais nada, apenas deixe essa sua luz de televisão ligada.

E assim Torresmo passou a iluminar silenciosamente o caminho pensativo de Marvin que ia ao encontro da criatura gosmenta, mesmo sem saber o que fazer quando chegasse junto dela. O seu medo era aquele bafo quente...

A espada Excalibur foi seguindo os dois, já imaginando que teria muito trabalho pela frente...





ENQUANTO ISSO NA CAVERNA DA MISTERIOSA CRIATURA DA CAIXA PRETA:

-- Caixa! Cheguei! E desta vez eu trouxe uma coisa muito especial. Acho que você vai gostar. Ou melhor dizendo, você vai adorar, você vai enlouquecer, você vai...

-- ...

-- Caixa!? Caixa!?

--...

Apenas o silêncio respondeu e Tipo Assim ficou “charuto”, ou seja, ficou todo sem graça... Decepcionado talvez seja a melhor palavra para a feição que sua cara amarela adquiriu ao descobrir que Caixa não estava mais ali...

Para completar sua decepção, já em seguida, todos os móveis e utensílios da Misteriosa Criatura da Caixa Preta “Brimpt!!!” desapareceram também ... Bem diante do nariz chato de Tipo Assim.

Não restava mais dúvida. Caixa havia se mudado sem dar satisfações, sem deixar ao menos um bilhete de despedida. Tipo Assim sentiu-se então traído. “Enganado e mal pago”. Justamente ele que enganava os outros. Justamente ele que era “expert” na arte de passar as criaturas para trás.

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