O meu amigo Varela, cheio de apanhar com o lobo-mau em miúdito, arribado a veterano adulto, quiçá por quente vingança - que dizem se deve servir fria - dispensa-se de recontar a história do Capuchinho Vermelho e segue a peúgada do lobo-mau investido no cheiro dum detective à moda tripeira.
Poucos saberão que após o nosso herói ter aquela amarga experiência com a avózinha, ficou com os miolos lacrados e começou a fugir de tudo quanto fosse vermelho. Fechava os olhos às papoilas, repugnava morangos, fugia das touradas, punha óculos escuros para ver televisão a cores e não permitia que os seus congéneres lhe falassem de sarampo. Foi assim que no dia dos trabalhadores reparou num comício onde sobressaíam montões de bandeiras vermelhas. Furioso, desatou a correr em sentido contrário uivando estericamente.
Descuidado, zás, foi atropelado por um bus municipal de cor laranja e totalmente decorado com efeitos da Coca-Cola. Imediatamente transportado ao banco das urgências, não resistiu aos ferimentos e veio a falecer devidamente confortado com os habituais sacramentos. Um dia, desceu à terra em hora triste e chuvosa, tendo dado com a viúva vestida de Capuchinho Vermelho a assitir a uma missa dominical por sua alma. Desde aí, como repugnava deveras o vermelho, não saiu mais do céu aos Domingos!
Por evidência óbvia, admiro o meu amigo Varela: não se deixou influenciar pela ingénua visão dos paradigmas de infância e criou a sua própria história.
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