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Artigos-->Falo assim mesmo, e daí? -- 02/05/2005 - 13:56 (Edmilson José de Sá) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Falo assim mesmo, e daí?



Para muitos brasileiros, parece não ser bastante conhecer inúmeros casos de violência, desemprego, fome, salários defasados e muitos problemas que afetam a sociedade quase que por completo. Não é suficiente passar horas e horas diante da televisão sendo testemunhas telespectadoras de inumeráveis casos de doenças, muitas delas existentes diretamente em sua vida.

O ser humano, mesmo diante de tais situações, ainda acha tempo ou condições morais de criticar a fala do outro, talvez ignorando suas próprias origens.

Isso mesmo! Por que ignorar alguém que fala “oxente” ou simplesmente corrigi-lo de modo zombador se a própria palavra “xente” etimologicamente vinda do galego significa justamente aquilo que já tornou uma constante nas correções? Oh, gente!

Essa fala às vezes arrastada, contrastando com as formas de estados do sul e especificamente com a forma lusitana áspera e enérgica ou de vocabulário curioso tem uma razão de ser. Fazemos parte de uma grande massa de pessoas que indubitavelmente saem de suas terras de origens em busca de uma vida melhor, na esperança de ficarem distantes dos problemas supracitados e, para tanto, são expostas às modificações climáticas e ao contato com outros grupos étnicos ou glóticos diferentes. Portugal, Holanda e França, que fazem parte da história pernambucana, certamente trouxeram sua contribuição para o falar que se tem hoje, rechaçado de formas distintas para cada canto do estado e para outras partes do país.

Acha-se engraçado alguém dizer ‘sordado’ao invés de ‘soldado’. Mais engraçado ainda é verificar que o poeta Camões, incontestável português nato, usava a forma ‘craro’ e que na língua tupi, o índio – que já habitava o Brasil à época do descobrimento – não pronunciava l e sim r.

Ideologicamente, a linguagem é ao mesmo tempo individual e social, física, fisiológica e psíquica. Ela sofre determinações sociais e goza de autonomia em relação às formações sociais. Uma forma ideológica da língua é a visão de mundo de uma determinada classe social, representando idéias que revelam a compreensão que uma classe tem do mundo.

As visões de mundo não se desvinculam da linguagem, porque a ideologia é indissociável da linguagem. Por isso, a partir de mudanças sociais e culturais, o vocabulário de cada indivíduo tem seu uso alterado. Alguns preferem desusar certas unidades lexicais. Outros preferem criar novos vocábulos ou significações que enriquecem seu dicionário pessoal.

Entretanto, a forma como se repudia ou se nega o falar brasileiro especificamente nordestino se contrapõe a formas faladas na intimidade sem preocupações inclusive por pessoas cultas que fogem de qualquer expressão menos erudita pela exigência que a sociedade requer no âmbito profissional, o que não corresponde à verdadeira língua falada no Brasil.

Em parte a mídia contribui para o preconceito. Quantos programas de televisão não incorporam de maneira caricaturesca a fala do nordestino! Normalmente é acrescentado um tom escrachado à fala, não condizente com a realidade. A língua não é um fenômeno que tenha um caráter de classe e nem de superestruturas. É um fenômeno de comunicação independente a forma usada para que ela seja estabelecida.

José Luiz Fiorin já escreveu que o homem não é um servo de sua fala, mas seus temas, figuras, valores e juízos provêm de visões do mundo existentes na formação social.

Que bom que muitos estudiosos, pesquisadores e escritores já têm deixado o tabu lingüístico de lado e já têm tratado mais desse assunto, citando os modismos – nunca arcaísmos ou barbarismos – que são peculiares à nossa fala! Talvez seja um grande passo para acabar com o preconceito existente.

A língua é um fenômeno social, já dizia um lingüista famoso e, por isso, tem de ser respeitada da forma como ela é, sem deixar obviamente ser levada ao ridículo, mas igualmente refletida e analisada. A professora Nelly Carvalho cita em seu mais recente livro que ninguém aprende com os outros (por isso, não pode criticá-los); deve, contudo, esforçar-se para entender e construir o significado do seu próprio saber.

Assim sendo, por que então criticar o modo de falar de tantas ‘Marias do Carmo’ e ‘Pinks’ que existem por aí? Elas também fazem parte do nosso meio social, são brasileiras, nordestinas e, certamente com orgulho, pernambucanas....

Desta forma, é mais pertinente que nos preocupemos com a situação do país ou com a nossa própria identidade social do que com a forma como alguém fala ou não?





Edmilson José de Sá

é aluno do Mestrado em Lingüística da UFPE





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