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Contos-->AS LÁGRIMAS DO SEM-TERRA -- 17/02/2002 - 11:00 (Airo Zamoner) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AS LÁGRIMAS DO SEM-TERRA
© Airo Zamoner

– Mas, doutor! Eu não estou acostumado a mentir...
– Você não está entendendo... Não é bem assim...
– Como não? Eu sei que este lugar não é meu! Posso ser muito pobre, mas minha família nunca roubou nada! E olhe que já passamos até fome!
– É aí que está o ponto, meu caro! Você é um problema social e pronto! Pare de coçar essa consciência.
– Sempre soube que existe a Lei acima de tudo...
– Certo, mas precisamos fazer pressão. Vocês têm um imenso poder que desconhecem. É isso que estou querendo mostrar...
– Roubando? Invadindo o que não é meu? É difícil entender isso, doutor!
– Se você quer, tudo bem. Senão, arranjo outro no seu lugar. Já ofereci a madeira de graça. Estou dando uma oportunidade de ouro pra você ter sua terrinha! Já disse que você é parte de um problema social... Vê se entende de uma vez!
– Desculpe interromper, doutor. Me dê um tempo pra pensar. Quero falar com a Custódia.
– Está bem! Fale lá com sua mulher. Você tem meia hora. Não há muito tempo... Dê só uma olhada pra você mesmo. Não vê que já é um velho imprestável? Você quase não tem força pra andar. Eu ofereço o paraíso e você ainda duvida? Vá! Vá logo falar com sua velha. Se não quiser, não tem importância. Tenho uma lista que o movimento me deu. Ande logo, senão chamo outro...
Bonifácio pediu licença. Abriu cuidadosamente a porta do luxuoso automóvel. Lembrou que só tinha chegado assim tão perto de um carro desses, quando trabalhava pro seu Gracindo, lá no norte. Ele cuidava da plantação de café. Era um tempo bom. A família bem cuidada. Tinha bastante trabalho. Suava, mas voltava da roça satisfeito. Se o verde do cafezal começava a ficar pintado de amarelo, depois vermelho, a filharada ficava ouriçada. Queriam se esparramar no meio da plantação, fazendo a colheita. O armazém ia ficando cheio e seu Gracindo dizia:

– E aí, Bonifácio! Tá satisfeito, né? Olha só a tulha como tá cheia! Conforme o combinado, vamos vender pelo melhor preço e a metade é toda sua! Vai ser um bom dinheiro. Só não faça loucuras, pois esse dinheiro é pro ano todo! E chega de filho, hein? Oito já passou da conta!
Parecia estar ouvindo o patrão do seu lado, rindo feliz pra todo mundo. Depois seu Gracindo ficou doente. Vendeu a fazenda. Os novos donos o dispensaram. Não iriam mais plantar café. Veio embora com a família e os oito filhos. Largou os pensamentos e ergueu a cabeça. Viu a Custódia sentada sobre as parcas coisas que sobraram. Duas trouxas. Alguns utensílios amassados e amarrados com barbante. Os filhos cresceram. Sumiram mundo afora. Caíram na vida. Sobrou ele e Custódia e agora o doutor e esse terreno que não é dele.
– O que você acha, mulher? O doutor quer uma resposta agora...
Custódia ficou de cabeça baixa. O olhar penetrava no chão e descia aos infernos. Enxergava os demônios e rezava aos anjos. Queria olhar para o céu, mas a cabeça pesava. Só olhava para o inferno. O inferno de suas vidas perdidas.
– Pare de ficar aí resmungando, mulher! Quero saber o que pensa. Que porcaria! Em que diabo de vida me meti!
Bonifácio olhou para a mulher e as lágrimas manchavam o chão arenoso. Abraçou-a com o carinho rude dos corações empedernidos de sofrimento. Ternuras escondidas se descamuflaram de algum canto secreto de sua alma e as lágrimas se misturaram, regando a terra maldita.

Airo Zamoner é escritor
airo@cepede.com.br

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