Meu cordel fio a fio
Torcendo e retorcendo
Com palavras vou tecendo
Como se fosse o pavio
Do círio que desafio
A dar mais luz à feição
De trabalhar o condão
Que exprime o sentimento
Com poesia e talento
Em vigorosa oração.
Todos nós sem excepção
Com mais jeito ou menos jeito
Podemos fiar do peito
Um cordel com paixão
Em desabafo ou função
De sana pedagogia
Mas a estranha mania
Da pertinaz concorrência
Soçobra na indecência
De palavras de má cria.
Quando alguém com ironia
E intenção positiva
Coloca a chama mais viva
Ao cordel que desfia
Logo outrém vem e afia
A linguagem da inveja
Só porque apenas deseja
Envaidecer-se e mostrar
Que também sabe rimar
Gagueja com salvo seja.
A farsa de quem moteja
Pretendendo a humilhação
Da seiva que vem do chão
Até à taça em bandeja
Só prova que se enseja
No que fácil lhe parece
E não sabe ou esquece
Que à lauta mesa dum rei
Um bobo obriga a lei
A rir-se do que padece.
Se algo há que m entristece
E me deixa desolado
É o gratuíto estado
De quem maneja o insulto
Presumindo que é culto
Não respeitando sequer
A condição de seu ser
Nem honrando a tradição
Da herança e da lição
Que nunca soube aprender.
Poesia?! Pois... É ter
A alma desinibida
Como pluma da vida
Ou bisturi de bem querer
Para afagar com prazer
As palavras que retratam
Os actos que nos maltratam
Ou elevam dia a dia
Condenando a hipocrisia
Aos que dela não se fartam.
Os raios todos me partam
As cordas da minha lira
Quando tocar a mentira
Face às verdades que matam...
Pois todos que não acatam
A imposição natural
Cedo ou tarde, bem ou mal
Acabam a soletrar
A palavra elementar:
Nada... E ponto final!