Metade da vida
na metade de um quarto,
cama suja, toalha sem corpo
armário sem arte.
Escravo sem encosto.
Despido no espelho
caro pensamento.
olho-me cem por cento, cenudo
frio, feio.
Quem dera ser poeta
e poetizar tua meta.
Em cada reta
haveria uma festa
prá cada canto de cama
haveria uma sesta.
Quem dera ser poeta
e poetizar essa calma,
dizer que ela espalma,
moléculas entre palmas,
de abraços, de risos
de casos, de ritos, de atos,
moléculas de desacatos.
Quem dera ser poeta,
ser profeta, brincando,
profetizando
mil ecos do pranto
do prato, do garfo, da fome
dos fatos.
Quem dera ser poeta
a comungar pela rua
a impureza nua que é de todos
porém mais tua.
Quem dera ser poeta,
catando pó das estrelas,
no chão dos becos sem saída,
contando pedras dos tropeços na vida
e, subindo montanhas, avistar deserta
tua humilde espera.
Quem dera ser poeta
sozinho ao vento
abanando meus olhares
indo, vindo, sendo também
espera.
Quem dera ser poeta
ser quem te lembra, alerta,
para os espinhos
abismos, cavernas, crateras.
Ser quem te desperta
prá sonhares mais desperta.
Quem dera ser poeta
prá fazer
mais simples esse mundo...
Quem dera.
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