Há momentos na vida em que nos vem uma alegria tão grande, uma emoção, um vislumbre de uma felicidade imensa. E nessas horas temos uma tendência de fazer tudo que é brega, cafona, piegas.
Por exemplo, se você sair saltitando pela rua, falando com passarinhos, cumprimentando todo mundo, vão chamar a carrocinha e mandar direto ao hospício o meliante, isto é, você.
Ou então você coloca um disco na vitrola - disco mesmo, e vitrola mesmo, de 33 RPM, nada de CD. E sai dançando, na frente do espelho, alguma coisa do Sinatra, ou do Ray Coniff. Faz pose, careta, abraça a parede. Tudo parece dar certo, o mundo é perfeito. Se você se distrair, vai querer pular da janela do seu apartamento, no décimo andar, e sair volitando feito um pintassilgo.
Aí você liga a TV, no jornal, e sai rindo da guerra, chama todo mundo de maluco, e corre até a sala. Prepara um uísque "on the rocks", um Martini Dry, qualquer coisa. Toma um pilequinho, vai até o térreo, dá um abraço no zelador, e até paga o condomínio em espécie, antecipado.
Você está feliz. Mais que ser, felicidade é estar, verbo de ligação, que liga a gente a alguma coisa cósmica, itinerante, mambembe. Viramos palhaços do nosso picadeiro doméstico.
Se você sai de automóvel, vai chamar os lavadores de pára-brisa e pagar 10 reais, mais cinco de gorjeta, pelo vidro embaçado. E se alguém estiver vendendo flores por perto, você compra as rosas e manda o flanelinha levar de presente para a mãe.
A felicidade, a verdadeira, é generosa. Gasta-se dinheiro a mancheias. Você quer presentear a população da China, mesmo que raspe o tacho do cartão de crédito. O que importam os juros? Coisinha à toa. Afinal, o seu banco também é filho de Deus. Veja a que ponto você chegou!
Como vê, estar feliz tem muitas implicações. Faz bem ao fígado, alivia o estresse, e arrasa com a carteira. Felicidade é um estado de dar. O "ter" não alcança este enredo. Ninguém é feliz tendo, só dando. Claro, olha lá o que você vai dar por aí. Leve camisinha!
Embora você possa contar as pessoas felizes que conhece nos dedos da mão trinchada do Lula, um é café com leite, vale a pena estar perto de um felizardo.
Em geral, o felizardo tem mãe viva, de boa cepa, e benzedeira das melhores. Felicidade causa inveja inevitável, e ininterruptamente. E então é preciso tirar o quebrante. E isso só mãe sabe fazer. A não ser que você tenha o corpo fechado. Saravá, meu irmão!
Mas estar feliz tem começo, meio, e fim. Quando for passando aquela sensação maravilhosa, com gosto de pudim de leite condensado, aroma de "très brut", da Faberge, não o de Marchant, você volta à realidade enganosa, e vai tratar de arrumar casca em pelo de ovo.
Pois é, durou menos que férias com dez dias em dinheiro, que feriado prolongado.
Mas não desanime. Se prestar atenção, abrir bem os olhos, vai ver que a felicidade mora ao lado...
Veja lá se entende a metáfora, e não saia agarrando a vizinha, ou o vizinho. Assédio sexual é inafiançável, brother! Ou sister!
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