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Contos-->Alguma guerra -- 08/03/2002 - 01:21 (Marcelo Rodrigues de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Alguma guerra
Marcelo Rodrigues de Lima


As mulheres dos homens que foram para a guerra ainda estão na beira da estrada esperando por seus maridos.
Elas não foram embora desde de o dia que se foram. E talvez fiquem lá por muito mais tempo, mesmo sabendo que eles possivelmente não voltarão.
Não é preciso dizer qual guerra é essa. Todos nós sabemos. As guerras não têm identidade própria, mas sim os que vão para elas.
Mas elas montaram barracas e ainda estão lá. Olham para onde a estrada acaba, onde seus maridos sumiram.
Algumas receberam notícias. Isso nunca é suficiente. Outras apenas sentem o cheiro de sangue que o ar traz.
Aprenderam que isso não é vida. A vida lhes ensinou. Mas elas não têm outra. Ou é aquela, ou simplesmente nenhuma. E é preciso aproveitar aquilo que tem, mesmo sendo dor e saudade.
Tentam acreditar que as coisas vão melhorar e que tudo vai dar certo, mas o mesmo ar que respiram, tem o aroma do vazio e da perdição.
Nem mesmo seus filhos que seguram em suas saias, sabem o que significa tudo isso. Mas suas mães sabem que se tudo aquilo não acabar, vão ter que ver eles indo embora também. Não terão mais ninguém para cuidar. A não ser de si mesmas, o que chega ser tão vazio quanto à morte.
Não sabem como tudo aquilo começou. Só sabem que quando perceberam, já estavam envolvidas. Até o fundo daquilo que acreditavam.
Mesmo as mais religiosas se perguntavam se Deus existia. Se elas tinham sido sempre boas esposas, boas mães, boas cidadãs da comunidade, por que estavam sendo subjugadas daquela maneira? O que mais tinham que provar? Que deveriam ser fortes mesmo que lhe arrancassem a vida?
Deus? Se existe que acabe com tudo isso. Que me deixe voltar para casa. É o que pensavam.
Mas o que fazer? Deus não podia ver também, já que estava com as mãos nos olhos, com vergonha de tudo aquilo que estava acontecendo. Vergonha de não saber como parar ou explicar para aquelas mulheres o que era tudo aquilo e que ele não tinha nada haver com a guerra dos homens.
Talvez se explicasse ninguém entendesse. Se não entendemos a nos mesmos, como podemos querer entende-lo.
O diabo também estava abismado. Não por pena, mas sim por não ter imaginado tão cruel forma de fazer sofrer os humanos. Criar a guerra e fazer suas mulheres também estarem no fronte , mesmo a quilômetros e vidas de distância.
Após muitos meses, chegou a notícia que a guerra havia acabado. Não receberam a notícia com felicidade, pois ficaram olhando para a estrada , esperando que seus homens aparecessem nela. Só sorririam quando vissem alguém despontando lá. Por muitas semanas isso não aconteceu.
Algumas simplesmente entraram nas barracas e morreram. Não precisavam de outra notícia dizendo que nenhum homem havia sobrevivido. Outras ficavam imóveis durante todo o dia, hora olhando para o céu, hora para a estrada. Estavam sendo fortes.
Muito tempo se passou desde aquele último dia.
Aos poucos foram voltando para a vila de onde vieram. A vida parecia tentar seguir um rumo definitivo. Mas elas sabiam que isso nunca seria possível. A dor e a solidão sempre estariam ali. E às vezes tinham a impressão que mesmo que seus maridos voltassem, as coisas não seriam as mesmas. Não importa o que acontecesse, alguma coisa havia sido tirada delas. O que mais doía era não saber o que era isso.
Poucas também sabiam ler. Um dia uma delas confirmou a informação que todas sabiam: seus maridos estavam mortos. E em uma pequena nota de canto de página a informação de que aquelas mulheres já estavam começando a reconstruir suas vidas. Ela simplesmente amassou o jornal e jogando-o no lixo.
Ninguém havia ido àquela vila após a guerra, a não ser os fantasmas dos maridos, que velariam seus sonos por muito tempo.





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