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Artigos-->SOBRE O JALAPÃO(Zuenir Ventura) -- 28/02/2006 - 15:04 (Mário Ribeiro Martins) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
ONDE DEUS É BRASILEIRO

(Sobre o Jalapão)



ZUENIR VENTURA* é jornalista e escritor.

Escreve a coluna “no mínimo” para diferentes

jornais e revistas. Leia mais sobre ele em

www.mariomartins.com.br







28.02.2006
Agora entendi por que Cacá Diegues escolheu aquele lugar como cenário ideal para que Deus (Antonio Fagundes), cansado, encontrasse finalmente um substituto durante suas férias, um candidato a santo. Se não soubesse que cenas de “Deus é brasileiro” foram filmadas ali, no Jalapão, ia acreditar que minha mulher e eu éramos as primeiras pessoas a botar os pés naquelas dunas de areias vermelhas e virgens – os pés, os joelhos e as mãos.



Explico.



As dunas formam um grande platô retangular de uns 40 metros de altura, na parte mais elevada. Para chegar lá em cima, tem-se que escalar o paredão de areia que é íngreme, quase reto. Imaginem subir uma parede fofa. A impressão é essa. E o medo é de que, subindo em pé, vai-se cair para trás, claro, como acontece a quem desafia a lei da gravidade. Mas era tarde para desistir. Começamos então a subir, verificando logo que o problema não era o de cair, mas o de não chegar ao destino. Os pés afundam na areia mole e adquirem o peso de duas botas de chumbo. Aí, não dá mais. O negócio é ajoelhar e usar também as mãos, ou seja, ficar de quatro.



Pode não ser a posição mais solene, mas é a única que nos levará até o topo. Haja esforço e haja fé. Ufa! Chegamos. Os percalços da subida são logo esquecidos quando nos erguemos e começamos a caminhar sobre aquela plataforma deserta. Me dizem que há milhões de anos tudo aquilo era o fundo de um oceano. Será que isso explica o riachinho de um palmo de fundura que corre na base e em torno do bloco de areia? Mas aquela água é doce e cheira a ferro. Como ela, tão cristalina, foi parar ali? Mistério.



Mas não é hora de reflexão e sim de contemplação. O único sentido a funcionar é a visão, e ela está em êxtase. Algum ser humano já andou por aqui antes? A serra que circunda toda a região é feita de rochas estranhamente simétricas: há poucos picos, as plataformas são planas como tampos de mesa. Daqui a pouco, assistiremos ao pôr do sol. Em Palmas, me tinham recomendado como algo imperdível – mesmo para quem está acostumado a isso em Ipanema.



Me assalta agora a tentação de mentir, descrevendo-o sem ter visto. É que, de repente, relâmpagos e trovões passaram a anunciar um temporal bíblico. Era hora de partir. Havia o risco de ficarmos retidos na estrada onde, na vinda, um pneu se rompeu, deixando-nos sem estepe.



Se fossem só as dunas, já estava de bom tamanho. Mas o Jalapão é muito mais, é um gigantesco parque que oferece mil opções de passeio. Há um roteiro que leva quatro dias para ser feito. O nosso levou dois. Comandada por uma jornalista tocantinense cujo único defeito era a resistência de atleta, nossa expedição saiu às seis horas da manhã de Palmas para voltar dois dias depois à noite. São cerca de 200km da capital de Tocantins, dos quais mais da metade é o caminho de terra e areia usado pelo Rally dos Sertões. Não se viaja, sacoleja-se sobre os buracos. O corpo vai de um lado para o outro e a cabeça só não se desprende porque bate no teto. Juro que me sinto apto a fazer o Paris-Dakar.



No entanto, se você for jovem como minha mulher e eu, vale a pena. Há umas dez cachoeiras a serem visitadas. Paramos numas três e nos deslumbramos com a do Lajeado. A água corre sobre grandes prateleiras de uma pedra argilosa chamada toá, com que se fazem tijolos e telhas. É de um vermelho tão bonito que os índios a utilizavam para pintar o corpo. Destaque para a Prainha, onde mergulhamos nas águas claras e frias do Rio Novo. Um capítulo especial deveria ser reservado para o Fervedouro de Mateiros. É uma piscina natural no meio de árvores onde a novidade extraordinária é que você não consegue afundar. Por mais que se esforce, bolhas de ar saindo do fundo de areia mantêm-no de pé dentro da água. É um dos vários mistérios da região.



Disse que deveria reservar um capítulo ao fenômeno, mas não vou porque saí frustrado. Assim como perdera o pôr do sol, não consegui boiar. Tentei umas cinco vezes, ajudado pelos companheiros de expedição. Fui o único a fracassar. Minha mulher flutuando, tentando me ensinar como manter o corpo ereto, e eu insistindo em ir ao fundo como se tivesse uma irresistível vocação para ser pedra. Um vexame. Pretendia falar de muitas outras atrações, como o Povoado de Mumbuca, onde nasceu o artesanato de Capim Dourado, que é hoje vendido até para a Europa. Vai ficar para outra ocasião. Com apenas 17 anos, Tocantins comporta-se como gente grande. Tem muito a oferecer. Deus que o diga.





(*ZUENIR VENTURA esteve em Palmas, Tocantins, no dia 17.02.2006, para proferir conferência no ENCONTRO COM JORNALISTAS, no auditório do SEBRAE. No dia seguinte, teve a oportunidade de visitar o JALAPÃO.)
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